Um trabalhador haitiano conseguiu na Justiça o direito a uma rescisão indireta, além de indenização por danos morais, de uma empresa de São Paulo em que um dos sócios o tratava reiteradamente com “apelidos pejorativos e preconceituosos”. O valor estipulado para indenizar o crime de assédio foi de quatro vezes o último salário da vítima.A decisão foi proferida esta semana pela 8ª Vara do Trabalho do Fórum da Zona Sul-SP e atendeu ao pedido do imigrante haitiano. A rescisão indireta ocorre quando um contrato de trabalho é encerrado por solicitação do funcionário, diante de faltas graves cometidas pelo empregador.De acordo com os autos, o sócio da empresa costumava chamar o reclamante de vários apelidos que faziam menção à sua cor de pele — negra —, além de uma expressão que, na língua haitiana, idioma materno da vítima, significa “homossexual”. O tratamento, segundo os documentos, “era reiterado e ocorria perante os colegas”.“Ambiente insuportável”Na ação, o empregado alegou que os insultos se perpetuaram no tempo e tornaram o ambiente de trabalho “insuportável”, causando-lhe até transtornos de ordem psiquiátrica. A empresa negou os fatos e argumentou que não houve denúncia pelo trabalhador às autoridades policiais, ao setor de recursos humanos do estabelecimento ou aos superiores.Segundo o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2), uma testemunha ouvida em audiência confirmou que o sócio em questão tinha problemas com todos os trabalhadores por causa de apelidos, piadas e ofensas. Confirmou ainda as denominações dadas ao colega e disse ter presenciado “brincadeiras” várias vezes ao longo do dia. Leia também São Paulo Caso Edward: juiz apresentou novo documento e voltou a receber salário São Paulo Sintonia dos Gravatas: como advogado do PCC virou alvo de ação da PF São Paulo “Punhalada em SP”, diz Kassab sobre PL que enfraquece Lei Cidade Limpa São Paulo Quase 1/3 da população de SP não tem esgoto tratado, mostra estudo A juíza Tarcila de Sá Sepúlveda Araújo considerou que a prova testemunhal deixou claro o “tratamento jocoso, preconceituoso e desrespeitoso” do sócio para com os trabalhadores, inclusive o reclamante.Tarcila destacou que o caso deve ser analisado sob a lente da interseccionalidade, principalmente por “ser o reclamante preto e imigrante”. Analisou ainda que se trata de “evidente hipótese de racismo recreativo”, cabendo julgamento com base na Resolução 598/2024 do Conselho Superior de Justiça do Trabalho, além de princípios constitucionais e da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho.