A última linha do balanço da Ambev no quarto trimestre fez o mercado brindar. A ação salivate mais de 5% entre as maiores altas nesta quarta-feira, 26, numa reação animada diante do lucro líquido de R$ 4,9 bilhões, que superou as estimativas do mercado — e se somou ao anúncio do pagamento de R$ 2 bilhões em dividendos.Apesar de um cenário complexo, o ano de 2024 terminou com tom positivo para a Ambev, com crescimento na rentabilidade e resultados acima das expectativas do mercado. A companhia reportou um EBITDA ajustado de R$ 9,6 bilhões, com alta de 9,7% na base orgânica. A receita líquida cresceu 4,2% organicamente, para R$ 27 bilhões.No entanto, desafios como a depreciação do real e a alta nos custos de commodities, especialmente o alumínio, impõem obstáculos para 2025 e chamam atenção de analistas e investidores quanto à sustentabilidade do crescimento das margens ao longo deste ano.Grande parte do EBITDA veio da América Latina Sul, beneficiada por um efeito contábil devido à hiperinflação na Argentina. No Brasil, a margem foi impulsionada por incentivos fiscais e uma composição geográfica favorável, observaram analistas do Itaú BBA e do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME).E, ainda que o volume das marcas premium e super premium como Corona e Spaten tenha crescido acima de 10%, ajudando a manter a rentabilidade, as pressões inflacionárias e cambiais devem continuar pesando em 2025.Em seu último balanço como CFO da Ambev, Lucas Lira, reforça que o desafio para o ano será equilibrar a pressão de custos com o crescimento da receita.A estratégia da companhia passa pela continuidade dos investimentos no portfólio e no digital, que “já se mostraram fundamentais para a resiliência do negócio nos últimos anos”, diz ele em entrevista ao INSIGHT. Lira deixará ao cargo a partir de abril, sendo substituído por Guilherme Fleury, da AB InBev. A prioridade da Ambev, diz Lira, segue sendo o reinvestimento no crescimento orgânico, tanto no Brasil quanto em outros mercados onde atua.A empresa também mantém um olhar atento para oportunidades de fusões e aquisições, e quando há caixa excedente, devolve valor aos acionistas por meio de JCP, dividendos e recompra de ações.Nesta entrevista, Lira comenta os resultados financeiros recentes da companhia, os desafios do mercado brasileiro, a estratégia de crescimento e alocação de capital, e o cenário competitivo que promete não dar trégua em 2025.Leia a entrevista na íntegraINSIGHT: A Ambev teve números expressivos de rentabilidade, com lucro e Ebitda vindo acima do consenso do mercado. Ao que vocêLira: Mais do que o resultado, vale olhar o filme, né? Nos últimos 5 anos, acho que a gente conseguiu ter uma evolução bastante consistente, contínua, ano após ano. Apesar de todos os altos e baixos, como pandemia, Ômicron (surto da variante do coronavírus no começo de 2022) e crise na Argentina. Mas uma coisa bacana do time tem sido a capacidade mesmo de se adaptar e continuar entregando uma geração de valor para os acionistas da companhia. Mesmo com toda essa volatilidade e incerteza, conseguimos evoluir em vários indicadores, porque o portfólio está mais saudável e fizemos uma grande aposta grande no digital. A combinação dessas duas coisas contribuiu e hoje é um bom exemplo disso.INSIGHT: Apesar do bom desempenho, analistas apontaram que parte da melhora de margem foi impulsionada por incentivos fiscais e efeitos contábeis. Como vocês avaliam a sustentabilidade do crescimento em 2025?Lira: Sofremos muito entre 2020 e 2022 com a pressão de custos. Mas o ano de 2023 foi o primeiro passo na retomada da margem, e 2024 consolidou esse movimento. Tivemos expansão tanto na margem bruta quanto na margem EBITDA em todas as unidades de negócio. É consistente. No Brasil, de fato, houve um impacto positivo dos incentivos fiscais e da composição geográfica favorável, mas a evolução da rentabilidade também foi sustentada pelo crescimento das marcas premium e pela diversificação do mix de produtos.INSIGHT: No principal mercado de vocês, o de cerveja Brasil, o volume de vendas recuou 3,9% no último trimestre. O que explica esse movimento e qual a perspectiva para 2025?Lira: Apesar da queda de volume, tivemos um crescimento considerável no segmento premium e super premium, como Spaten e Corona, e no segmento mainstream, com Brahma e Antarctica. Em 2025, o cenário será diferente, principalmente por conta da depreciação do real e do aumento no custo das commodities, como o alumínio. Nosso hedge para 2025 ficou em R$ 5,49, cerca de 10% acima do ano anterior. Além disso, estimamos um crescimento do custo de produto vendido por hectolitro entre 5,5% e 8,5% para cerveja no Brasil. O desafio será equilibrar essa pressão de custos com o crescimento da receita. INSIGHT: Aumento de custos costuma exigir repasse de preços, mas o ambiente competitivo está ainda mais acirrado e parece haver pouco espaço para reajustes, não?Lira: Vamos manter o foco no crescimento equilibrado da receita, combinando volume e preço. Também seguimos com uma gestão eficiente das despesas, sem comprometer os investimentos nas nossas marcas. O mercado brasileiro sempre foi competitivo, e isso não deve mudar em 2025. A boa notícia é que a categoria de cerveja continua resiliente e em crescimento. Nosso foco segue em fortalecer nosso portfólio, trazendo inovação e ampliando nosso alcance em diferentes ocasiões de consumo.Nos últimos anos, investimos fortemente na renovação do portfólio, com novos líquidos, novas marcas e conceitos inovadores. Trouxemos produtos como Corona Cero, Stella Pure Gold sem glúten e Brahma Duplo Malte. Esse portfólio diversificado tem impulsionado o crescimento das nossas marcas premium em ritmo de dois dígitos, e esse posicionamento continuará sendo um diferencial competitivo.INSIGHT: O modelo de distribuição de proventos da Ambev sempre esteve muito associado ao JCP. Com as mudanças tributárias, como a companhia está endereçando esse ponto?Lira: Nossa prioridade número um é reinvestir no crescimento orgânico. Ainda vemos oportunidades significativas no Brasil e em outros mercados. Também estamos sempre analisando oportunidades de fusões e aquisições. Quando há caixa excedente, devolvemos esse valor aos acionistas por meio de JCP, dividendos e recompra de ações. Em 2024, por exemplo, declaramos R$ 12,5 bilhões em caixa residual e mais R$ 2 bilhões em dividendos no último trimestre. Seguiremos essa estratégia