A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) condenou o Brasil por falhas na investigação de um caso de discriminação racial e de gênero ocorrido em 1998. A decisão, divulgada na última quinta-feira (20/2), responsabiliza o país por não garantir uma apuração eficaz e por reforçar padrões estruturais de desigualdade no processo judicial.O caso envolve Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes, duas mulheres negras que foram preteridas em uma vaga de pesquisadora em São Paulo. Elas se candidataram ao cargo, mas foram informadas de que todas as posições estavam preenchidas.No mesmo dia, uma candidata branca, com o mesmo nível de experiência e escolaridade, foi contratada imediatamente. No dia seguinte, uma das vítimas conseguiu preencher o formulário de candidatura, mas nunca foi contatada.Diante da suspeita de discriminação, Neusa e Gisele denunciaram o caso, levando à abertura de uma investigação criminal. O processo se arrastou por mais de dez anos e terminou em 2009, com a absolvição dos acusados por falta de provas.Em 2023, o Brasil reconheceu formalmente, perante a Corte IDH, que houve violações ao direito das vítimas a um julgamento em prazo razoável. Leia também Esportes Vice-prefeito é afastado após racismo contra segurança do Palmeiras Esportes Segurança do Palmeiras é vítima de racismo após jogo contra Mirassol Brasil Lula e premiê de Portugal debatem xenofobia e racismo: “Não há espaço” Fábia Oliveira Giovanna desabafa sobre racismo contra Camilla e Thamiris: “É crime” DecisãoNa sentença, a Corte concluiu que o Estado brasileiro não adotou medidas adequadas para investigar o crime com a devida diligência exigida em casos de discriminação racial. O tribunal também apontou que houve reprodução do racismo estrutural e institucional ao longo do processo, o que revitimizou Neusa e Gisele.Outro ponto destacado foi a transferência da responsabilidade da prova para as vítimas, sem considerar o contexto racial da denúncia. Além disso, a demora na tramitação do caso levou à prescrição da pena, impedindo uma resposta efetiva da Justiça.A Corte IDH condenou o Brasil por violação de diversos direitos garantidos pela Convenção Americana, incluindo dignidade, integridade pessoal, igualdade perante a lei e acesso à justiça. Como parte da decisão, o país deverá adotar uma série de medidas para evitar novas ocorrências de discriminação racial em processos judiciais e contratações.Entre as determinações estão a publicação da sentença e de seu resumo, a realização de um ato público de reconhecimento de responsabilidade e pedido de desculpas às vítimas, além do pagamento de indenizações.O Brasil também precisará implementar protocolos específicos para investigação e julgamento de crimes de racismo, incluir conteúdos sobre discriminação racial na formação de magistrados e membros do Ministério Público e criar um sistema de coleta de dados sobre acesso à justiça com recorte racial e de gênero.