São Paulo — O calor infernal das últimas semanas pode ter despertado o interesse de muitos moradores de São Paulo em comprar um ar-condicionado para tornar o apartamento, ou pelo menos o quarto, mais fresco. O problema é que muitos acabam descobrindo da pior forma que o prédio onde moram não está preparado para receber esse tipo de equipamento.Os problemas vão desde fiação e equipamentos elétricos insuficientes para prover o ar condicionado até a inadequação à norma técnica definida em 2014 pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), específica sobre sistemas de refrigeração. Sem a comprovação de que tudo está em ordem, a companhia elétrica não cederá ao apelo do síndico para aumentar a carga de energia para o edifício.11 imagensFechar modal.1 de 11Pedestre se protege do sol com jornal em trecho da Avenida Paulista, em São PauloWilliam Cardoso/Metrópoles2 de 11Homem corre em ciclovia da Avenida Paulista em setembro de 2023William Cardoso/Metrópoles3 de 11Idoso se protege do sol com jornal em trecho da Avenida PaulistaWilliam Cardoso/Metrópoles4 de 11Homem caminha sob sol com paletó na mão em trecho da Avenida Paulista; SP vive onda de calor William Cardoso/Metrópoles5 de 11Paulistanos enfrentam semana de calor extremo; na foto, termômetro marca 34 graus na Avenida PaulistaWilliam Cardoso/Metrópoles6 de 11Mulher caminha de chapéu sob sol em trecho da Avenida PaulistaWilliam Cardoso/Metrópoles7 de 11Mulheres caminham sob sol em trecho da Avenida Paulista; SP vive onda de calor atípicoWilliam Cardoso/Metrópoles8 de 11Paulistanos tomam sorvete na Avenida Paulista em dia de forte calorWilliam Cardoso/Metrópoles9 de 11Homem-placa de estacionamento se protege do sol na Avenida Paulista com guarda-solWilliam Cardoso/Metrópoles10 de 11Saiba até quando calor deve durar na cidade de São PauloWilliam Cardoso/Metrópoles11 de 11Paulistanos enfrentam semana de calor extremoWilliam Cardoso/MetrópolesSíndica de um condomínio de 18 andares e 72 apartamentos no bairro da Saúde, na zona sul paulistana, Livia Magnani tem enfrentado uma batalha para atender ao desejo dos condôminos, que querem um refresco diante de tanto calor. “Se todo mundo sente calor, eu também sinto”, diz, também moradora no prédio.A síndica conta que o prédio tem 10 anos e que a construtora deixou claro desde o início que a parte elétrica não suportaria ar condicionado, da mesma maneira que não aguentaria chuveiro elétrico — o prédio tem gás encanado e vem daí a água quente. “Acredito que a construtora faz por redução de custos, mas estava bem transparente”, diz.Passado um tempo, os moradores decidiram em assembleia que a fiação até os apartamentos seria refeita para suportar ar condicionado. Tudo ficaria em torno de R$ 80 mil, dinheiro que viria do caixa do próprio condomínio. Mas daí veio uma surpresa. Leia também São Paulo Carnaval: Nunes descarta alterar horário de blocos por conta do calor São Paulo Contra o calor, PSol pede mudança no horário dos blocos de rua em SP São Paulo Calor extremo: termômetros ultrapassam os 40°C em São Paulo São Paulo SP pode bater recorde de calor no início da semana, diz CGE A síndica deu entrada na Enel pedindo um aumento de carga para o prédio. A solicitação foi negada pela companhia, que disse que as estruturas elétricas não seguiam a norma da ABNT de 2014. O projeto da construtora tinha sido feito em 2011, mas a obra foi entregue justamente em 2014, daí a necessidade de adequação.“Além de trocar toda a fiação, vou ter que investir para me adequar à norma da ABNT, como troca de quadro de força, entre outros”, diz Livia. As estimativas dão conta de que, além dos R$ 80 mil, serão necessários agora pelo menos mais R$ 100 mil para resolver o problema. Caso a situação seja resolvida, cada unidade poderá ter até dois aparelhos de ar condicionado.Os custos não param por aí, porque será necessário atualizar também a estrutura elétrica dentro de cada apartamento, algo que deverá ser feito por conta do próprio condômino interessado no aparelho. O custo para isso gira em torno de R$ 4.000 a R$ 5.000, segundo a síndica.Lívia afirma que já advertiu ao menos cinco moradores que resolveram por conta própria instalar ar condicionado portátil para resolver a situação individualmente, sem levar em consideração o risco de sobrecarga. Ela explica que se todo mundo fizesse isso poderia colocar em risco a segurança do prédio.A síndica diz que muitas pessoas não se atentam a esse tipo de detalhe quando compra um apartamento novo. Cita inclusive o fato de que o prédio onde mora tem paredes estruturais, que não podem ser removidas para ampliar ambientes, por que isso afetaria a edificação como um todo. “É um tipo de construção mais barata.”AtençãoNo passado, já houve relatos de que determinados prédios decidiram sortear quais unidades teriam direito a instalar o equipamento. Essa loteria do ar fresco, porém, é desaconselhada e pode fazer com que o síndico entre numa fria.Advogado especialista em direito imobiliário e questões condominiais, Rodrigo Karpat afirma que um sorteio de quem pode instalar ar condicionado é diferente de um sorteio de vaga de garagem. “Entendo que esse tipo de situação infringe o direito de propriedade, que não é sorteável, para um em detrimento de outro. Uma situação como essa seria ilegal e arbitrária”, afirma.Karpat também alerta para os cuidados que vão além da parte elétrica hora de instalar o ar condicionado. É preciso atentar também para a capacidade do imóvel de suportar a carga, caso não esteja prevista ou não tenha dimensionamento para isso. “Se todas as unidades colocassem, por exemplo, o prédio poderia colapsar pelo excesso de peso”, diz.Síndico profissional, Sidney Spano afirma que se deve contratar um engenheiro elétrico e refazer toda a instalação para evitar qualquer tipo de risco, quando essa quantidade de energia não está prevista no projeto.Spano afirma também que, atualmente, há muitas soluções no mercado. “Os aparelhos estão mais modernos e consumindo menos energia. Existem aparelhos multi splits em que uma única condensadora comporta várias evaporadoras. Existem sistemas cassetes e os VRFs. Mas todos necessitam de projeto e dimensionamento elétrico adequados”, afirma.Síndico profissional há 14 anos, Roger Próspero afirma que é necessário avaliar onde ficará a unidade condensadora do ar condicionado, aquela espécie de caixa com parede telada e hélice que ficava pendurada para fora dos prédios antigamente, algo que não ocorre em edificações novas.“Isso pode caracterizar alteração de fachada, dependendo do local. Se há uma previsão inicial da própria construtora sobre onde essa máquina será instalada, basta segui-la. Vai colocar em uma área técnica, varanda ou área de serviço”, diz.Próspero também afirma que a normativa técnica que vem no manual do proprietário traz todas as informações sobre, por exemplo, quantos aparelhos o morador pode instalar, com quais capacidades.O que fazerA Enel afirma que cabe às administradoras de condomínios ou construtoras apontar a demanda por carga do empreendimento, incluindo a estrutura das unidades, à distribuidora.“No caso de um condomínio mais antigo [prédios ou casas] que passa a ter uma demanda maior de energia, o representante deve contratar empresas especializadas para a realização de um estudo sobre a demanda de energia do condomínio e protocolar um pedido de aumento de carga nas lojas da Enel, pela Loja Virtual do site enel.com.br ou pelo ou telefone 0800 72 72 120”, afirma.No caso de prédios novos, o processo envolve as seguintes etapas: solicitação de ligação, análise da distribuidora, orçamento e aprovação, e execução da ligação. “No caso de ligações já existentes, trata-se de um processo de redimensionamento de carga, que segue as mesmas etapas”, diz a companhia.