No âmago da nossa existência, reside uma verdade incontornável: somos o somatório de todas as experiências e tendências que nos moldaram, desde o primeiro suspiro até ao presente momento. Este constante movimento interior esculpe o nosso futuro, numa dança perpétua entre o que fomos, o que somos e o que poderemos ser.A palavra, essa ferramenta sublime, sempre esteve no centro deste processo. Se, metaforicamente, um homem que ‘conhecia mil palavras’ via o mundo com menos nuance do que aquele que ‘conhecia mil e uma’, então, cada novo termo aprendido foi uma janela aberta para uma nova dimensão da realidade. A cada vocábulo acrescentado ao nosso léxico, aumentava-se a nossa sensibilidade ao mundo exterior e, talvez ainda mais importante, ao mundo interior.Somos seres racionais, emocionais, relacionais e ‘comunicacionais’ precisamente porque nos tornámos no ‘bicho da palavra’ — o único animal que desenvolveu formas tão complexas e eficazes de cooperação, entendimento e partilha. À medida que metabolizávamos cada frustração e celebrávamos cada concretização, criávamos novos verbos, adjetivos, advérbios e tempos verbais. Forjámos, assim, as principais ferramentas civilizacionais que conhecemos: as palavras.Foi este poder de nomear o Mundo que nos permitiu viajar mentalmente entre o Passado, o Presente e o Futuro, imaginar o que poderia ter sido e o que ainda poderá ser. Foi esta capacidade que nos ajudou a atenuar a ansiedade e a solidão, trazendo-nos conforto na compreensão mútua.Há algo de profundamente fascinante no facto de sermos o único animal terrestre que se estuda a si mesmo. Desenvolvemos, ao longo do tempo, as ferramentas necessárias para nos compreendermos — um processo que envolve introspeção, autocrítica e um incessante desejo de ultrapassar as barreiras do Desconhecido.A palavra é, por isso, uma força colossal. Ela molda a perceção humana da realidade, oferecendo-nos uma âncora num mundo de incertezas. É uma conquista evolutiva que nos libertou da indiferença da natureza, permitindo-nos encontrar significado, criar histórias e construir civilizações.A palavra não é apenas um instrumento de comunicação; é a nossa maior aliada na busca pela verdade. As palavras não existem apenas para serem lidas ou ouvidas. Elas precisam de ser pensadas, filtradas, metabolizadas e, finalmente, exteriorizadas. Precisam de ser desafiadas, reinterpretadas, reinventadas — numa contínua construção do saber Humano.Se o homem que ‘conhecia mil palavras’ via menos do que o que ‘conhecia mil e uma’, o convite hoje é claro: ‘conheçamos mil e duas’! Expandamos o nosso vocabulário e, com ele, a nossa sensibilidade ao mundo. Há esperança.A relação com a realidade estabelece-se pelos sentidos, mas é na elaboração mental do que vivemos que o mundo ganha cor e profundidade. A forma como rotulamos semanticamente o que nos acontece e as pessoas com quem interagimos define, em grande medida, a nossa resposta emocional e prática. Um mesmo acontecimento pode ser um problema ou uma oportunidade — tudo depende da perspetiva do observador.Por isso, para o Dia Mundial do Pensamento, deixo-lhe esta mensagem: Pode recuperar-se do mais profundo dos abismos, da circunstância mais adversa. Há esperança.A nossa maior arma contra a adversidade é, sem dúvida, a perspetiva com que encaramos o mundo. E essa perspetiva nasce, cresce e floresce… na palavra.O conteúdo O Aparelho Mental: a palavra como fundamento da realidade aparece primeiro em Revista Líder.