Celular está deixando seu cérebro mais lento? Entenda o 'brain rot'

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Eleita palavra do ano de 2024 pela Oxford, o termo 'brain rot', ou 'podridão cerebral', está relacionado ao impacto destrutivo causado pelo excesso de conteúdo online "Brain rot", ou deterioração cerebral, é o nome popular dado a um fenômeno que preocupa especialistas: o uso excessivo de telas e o consumo constante de conteúdos online de baixa qualidade – especialmente em plataformas como TikTok, YouTube e Instagram – podem estar comprometendo a saúde intelectual e mental das pessoas. E isso não é só achismo: diversos estudos já associam esse comportamento a um declínio cognitivo real e progressivo.A condição, analisada sob a ótica do comportamento e das relações sociais, ainda não é considerada um diagnóstico médico oficial. Trata-se, na verdade, de uma consequência cada vez mais presente na vida contemporânea – sobretudo entre os jovens –, provocada pelo excesso de exposição ao ambiente digital. Rolagens intermináveis em redes sociais, como nos vídeos curtos do TikTok, Instagram e YouTube, podem parecer inofensivas, mas afetam diretamente funções cognitivas como foco e concentração. A seguir, entenda o que é o fenômeno chamado "brain rot", como ele surgiu e quais os possíveis impactos para o cérebro.🔎 Celular no bolso afeta espermatozoides e fertilidade masculina? Descubra➡️ Canal do TechTudo no WhatsApp: acompanhe as principais notícias, tutoriais e reviews'Brain rot', ou podridão cerebral: mito ou risco real? EntendaReprodução/Freepik📝 Luz vermelha piscando, mas celular não carrega. O que fazer? Opine no Fórum do TechTudoO que significa brain rot? Veja o guia completoO TechTudo reuniu quatro coisas que você precisa saber sobre brain rot no guia abaixo. A seguir, confira os tópicos que serão abordados neste texto.O que é brain rot e como surgiu o termo?O que dizem os estudos científicos?O que dizem os especialistas?Quais hábitos ajudam a proteger o cérebro?1. O que é brain rot e como surgiu o termo?Embora as estruturas cerebrais mudem ao longo da vida – o que torna difícil afirmar com precisão se o uso excessivo de telas causa prejuízos cognitivos permanentes –, estudos de instituições, como as universidades de Oxford e Stanford, além da opinião de especialistas em comportamento digital, apontam sinais de alerta. O fenômeno conhecido como brain rot precisa ser debatido com seriedade, já que seus possíveis impactos na atenção, memória e saúde mental são cada vez mais evidentes.A primeira menção ao termo “podridão cerebral” – também referida como apodrecimento ou deterioração cerebral – surgiu em 1854, na obra Warren, do escritor, pesquisador e historiador norte-americano Henry David Thoreau. Na ocasião, ele usou a expressão para criticar a tendência da sociedade em valorizar ideias simplistas em vez de conteúdos profundos e instigantes, o que, segundo ele, levaria à redução das capacidades mental e intelectual.Com um tom mais dramático, a expressão voltou à tona com o avanço da vida digital – especialmente nas redes sociais – e ganhou força entre as gerações Z, nascida a partir da metade dos anos 1990, e Alpha, a partir de 2010. Diferentemente das anteriores, que cresceram em um mundo analógico e precisaram se adaptar à era digital, esses jovens vivenciam a tecnologia de forma quase instintiva, imersos em uma realidade conectada desde os primeiros anos de vida.Mas afinal, quem seriam os verdadeiros vilões do cérebro? Memes, vídeos virais e outros conteúdos pouco enriquecedores, que crianças e jovens consomem por horas todos os dias nas telas dos celulares. Plataformas como TikTok, YouTube (com os shorts) e Instagram (com os reels) oferecem diariamente uma enxurrada de vídeos curtos, o que tem levantado um debate crescente nos últimos anos: até que ponto esse consumo excessivo afeta o cérebro? Entre os possíveis impactos estão a perda de concentração e outras alterações cognitivas relevantes.Na opinião do psiquiatra do Ambulatório de Transtornos do Impulso (AMITI) do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (IPq-USP), Dr. Emílio Giroldo Tazinaffo, o uso excessivo de telas é capaz de promover alterações funcionais e até mesmo estruturais no funcionamento cerebral. "Especialmente quando utilizamos as telas para outros fins que não laborais, como comumente utilizados atualmente", completa. Quando utilizamos o celular de modo recreativo, estamos estimulando nosso cérebro a receber gratificações estimuladas, principalmente pela dopamina em áreas específicas de nosso cérebro – 'centro de recompensa'. Tal gratificação nos leva ao maior engajamento e desejo, que, em último ponto, irá gerar tolerabilidade e descontrole. [...] Com isso, nosso cérebro vai dedicando cada vez mais atenção e adaptação em seu funcionamento para sermos gratificados, mas tudo isso em detrimento de outras atividades como atenção, memória, humor etc.", explica o psiquiatra do IPq-USP. A discussão rodou o mundo, e, em 2024, “brain rot” foi escolhida como a palavra do ano pela Universidade de Oxford, no Reino Unido. A respeito do processo de escolha da palavra, o presidente da Oxford Languages, Casper Grathwohl, afirma que o termo “remete a um dos perigos percebidos da vida virtual [...], parece um próximo capítulo legítimo na conversa cultural sobre humanidade e tecnologia”. No Brasil, especialistas também apontam os riscos atrelados ao excesso de estímulo provocado pelas telas. De acordo com o médico neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein, fundador e diretor do Centro de Cefaleia São Paulo, Dr. Mario Peres, “o uso excessivo do celular está associado a alterações no funcionamento cerebral, especialmente em áreas relacionadas à atenção, regulação emocional e tomada de decisões”.A exposição constante a estímulos rápidos e recompensas imediatas gera um automatismo, um comportamento de respostas sem nenhuma reflexão, mais impulsivo. O cérebro passa a funcionar sempre buscando novidades, porém na superficialidade, o que pode reduzir a capacidade de concentração profunda", acrescenta o neurologista do Hospital Albert Einstein. Adolescentes e jovens adultos podem estar sendo afetados pelo excesso de tempo de telaReprodução/Freepik2. O que dizem os estudos científicos?Desde que alguns comportamentos deletérios passaram a ser identificados nos indivíduos – em especial, crianças e jovens –, que consomem conteúdos online pouco estimulantes, estudos começaram a ser realizados, a fim de precisar os danos por trás desses hábitos. Uma publicação do Newport Institute, um centro de saúde mental dos Estados Unidos, apresentou as formas mais comuns de exposição: Videogame, comportamento vicioso de alguns jogadores, que gera inúmeros transtornos; Rolagem zumbi, quando o indivíduo permanece aparentemente desconectado da realidade enquanto rola os vídeos em seu smartphone; Doomscrolling, termo ligado à busca por conteúdos perturbadores; Vício em mídias sociais, a necessidade constante de verificar as redes sociais.Um artigo publicado pela Stanford Lifestyle Medicine, da Universidade Stanford, afirma que pesquisas apontam que os cérebros de crianças e adultos são afetados negativamente pelo excesso de tempo diante das telas. Isso pode acarretar, além de visão cansada, problemas como isolamento social e danos cerebrais. Um outro estudo divulgado pelo International Journal of Mental Health and Addiction aponta que existem evidências de que a estimulação resultante do excesso de exposição às telas dos smartphones tende a elevar o risco de problemas cognitivos, emocionais e de comportamento em adolescentes e jovens, o que acende o alerta para o risco de demência precoce no fim da idade adulta.O diretor do Centro de Cefaleia São Paulo, Dr. Mario Peres, confirma que existem estudos que evidenciam que o intenso uso do celular pode comprometer a atenção e a memória de trabalho. “Esses efeitos não são permanentes, mas são significativos: enquanto estamos constantemente distraídos, o cérebro tem menos oportunidade de consolidar informações e formar memórias duradouras”, acrescentou o neurologista. Embora o termo 'brain rot' seja mais popular do que científico, ele expressa uma percepção válida: o de um cérebro sobrecarregado, cansado, com dificuldade de manter o foco e processar informações. Na ciência, isso se aproxima do conceito de fadiga cognitiva, que ocorre quando há estímulo excessivo e pouca recuperação. Não se trata de uma degeneração cerebral literal, mas sim de uma disfunção temporária causada por sobrecarga mental",A retórica de que o "brain rot" não seja objeto de estudos no campo científico parece não ter sentido. Para o psiquiatra Dr. Emílio Giroldo Tazinaffo, apesar de o termo não ser comumente usado no meio científico, todas as ideias envolvidas no processo de apodrecimento no sentido do cansaço mental são pertinentes e tecnicamente explicadas por meio da ciência."Nosso cérebro tem uma incrível capacidade de adaptação. No entanto, isso tem um preço, ou seja, a adaptação que surge do bombardeamento de informações compromete outras áreas e/ou funções cognitivas", reforça o médico psiquiatra. 'Brain rot': alguns transtornos cognitivos e emocionais podem surgir por estímulos provenientes de consumo de conteúdo pouco estimulanteReprodução/Freepik3. O que dizem os especialistas?Apesar do intenso debate em torno do tema, especialistas ainda divergem sobre os reais impactos da tecnologia no cérebro. Em uma matéria recente do jornal britânico The Guardian, o professor Andrew Przybylski, especialista em comportamento humano e tecnologia da Universidade de Oxford, afirma que o alarde em torno das redes sociais está mais ligado ao preconceito contra a tecnologia do que a evidências concretas. Segundo ele, a ideia de que o aumento do uso de dispositivos digitais causou danos generalizados à saúde mental “não é científica”.Na mesma reportagem, Gary Small, chefe de psiquiatria do Centro Médico da Universidade Hackensack, em Nova Jersey, concorda que “não há evidências convincentes de que o uso de tecnologia digital cause danos cerebrais permanentes”. No entanto, ele pondera que certos conteúdos presentes nas plataformas – como pornografia e jogos de azar – podem sim ter alto potencial viciante.Porém, na contramão do ceticismo a respeito das consequências do excesso de exposição às mídias sociais, outros estudiosos reforçam que não se deve minimizar os riscos para a saúde mental quando se fala em ambiente digital e redes sociais. Para o Dr. Mario Peres, apesar de o cérebro se adaptar a diferentes tipos de estímulos, o exagero no consumo de algumas informações pode trazer prejuízos como ansiedade, insônia e distração crônica. “Em vez de desenvolver maior capacidade de lidar com múltiplas informações, o cérebro passa a operar em um estado de alerta contínuo, que desgasta os sistemas de atenção e memória”, afirma o neurologista, responsável pelo Centro de Cefaleia São Paulo. Os efeitos nocivos da exposição descontrolada às telas e a alguns tipos de conteúdo das plataformas da internet tendem a ser maiores do que se imagina. O psiquiatra do Ambulatório de Transtornos do Impulso do IPq-USP afirma que, ao receber esse excesso de estímulos e informações, o indivíduo tende a ficar ávido pela sensação de satisfação. "À medida que buscamos mais, sentimos menos, e precisamos de mais", explica Dr. Emílio. Com isso, pagamos o preço de uma constante sensação de esgotamento mental, sem conseguirmos nos desligar e, ainda assim, cada vez menos atentos e presentes. Isso gera uma incapacidade na tomada de decisões, além da procrastinação", complementa o psiquiatra. 4. Quais hábitos ajudam a proteger o cérebro?Apesar da complexidade do tema, é possível estabelecer uma rotina para preservar a saúde mental. No blog Vida Saudável, do Hospital Albert Einstein, são listados alguns hábitos para diminuir o tempo no smartphone. Dicas como estabelecer limites para acessar as redes, desativar as notificações e colocar o aparelho longe da cama na hora de dormir podem ajudar a manter a saúde do cérebro. Veja também: Detox digital funciona? Saiba os benefícios de ficar longe do celular.Um texto disponível na página do Hospital São Lucas da PUCRS também apresenta orientações para driblar a tentação de passar o tempo consumindo conteúdos de pouca qualidade no celular. A publicação enfatiza a necessidade de se dedicar a novos hobbies e atividades, assim como buscar conteúdos relevantes e enriquecedores para estimular o raciocínio. Ainda, no início deste ano, o Ministério da Educação lançou um texto explicando o fenômeno “brain rot” e destacando a necessidade de mobilização para acolher as questões relacionadas à saúde mental por meio da campanha Janeiro Branco. Insônia, ansiedade e distração são alguns dos possíveis prejuízos causados pelo consumo excessivo de conteúdo nas mídias sociaisReprodução/FreepikAlgumas medidas preventivas apontadas pelo psiquiatra Dr. Emílio Tazinaffo incluem a busca por conteúdo leves, educativos e construtivos, além de técnicas como o Mindfulness digital, que abrange exercícios de relaxamento e respiração, que podem melhorar a atenção, despertando a consciência e o poder de escolha do que consumir diante das telas. "Falando principalmente da faixa etária de maior risco – crianças e adolescentes – pois estes podem sofrer consequências e alterações permanentes, visto que seus cérebros ainda estão em desenvolvimento, a melhor forma é atuarmos na prevenção, ou seja, estabelecer limites práticos de tempo de tela de acordo com a idade", reforça o membro do AMITI. De acordo com o médico neurologista Mario Peres, reverter o quadro de “lentidão mental” provocado por esses estímulos envolve a prática de atividades restauradoras. “Pausas regulares de telas, períodos diários sem celular, meditação, leitura prolongada e sono adequado ajudam a restaurar as funções cognitivas", afirma o médico. "Atividades ao ar livre, exercícios físicos e interações sociais presenciais também são fundamentais para 'desautomatizar' o cérebro e combater essa sensação de lentidão mental", conclui o neurologista. Com informações de Universidade de Oxford, Universidade de Stanford, Hospital Albert Einstein, Hospital São Lucas da PUCRS, The Guardian, Newport Institute e International Journal of Mental Health and Addiction. Mais do TechTudoVeja também: Como rastrear um celular Android roubado? Veja o guia completoComo rastrear um celular Android roubado? Veja o guia completo