Em 4 de fevereiro, uma operação sem precedentes aconteceu nas dependências do Presídio Especial da Polícia Civil, na zona norte da capital paulista.Membros da Corregedoria da instituição, apoiados pelo Canil da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) realizaram uma varredura no local e se surpreenderam com o que encontraram.Nas celas e, até enterrados no pátio do presídio, foram localizados 20 celulares, usados pelos delegados e investigadores encarcerados para manter contato com comparsas e parceiros em liberdade, o que é ilegal.7 imagensFechar modal.1 de 7Reprodução/TJSP2 de 7Celulares e outros itens eletrônicos foram enterrados em pátio de presídioReprodução/TJSP3 de 7Interior de cela do presidio da polícia em SPReprodução/TJSP4 de 7Arte/Alfredo Henrique/Metrópoles5 de 7Arte/Metrópoles6 de 7Arte/SP7 de 7Fachada do Presídio da Polícia Civil, no Carandiru, zona norte de SPReprodução/Google Street ViewNas celas, que são compartilhadas por três policiais cada, em média, os membros da ação conjunta também localizaram e apreenderam R$ 26.739,56, sete facas, dois notebooks e, para surpresa de todos, onza caixas de cerveja, além de 14 garrafas de bebidas alcoólicas destiladas, maconha e cocaína. Até um cartão bancário estava em meio aos itens pessoais de um policial preso.Em seu relatório, obtido pelo Metrópoles, o corregedor-geral da Polícia Civil, João Batista Palma Beolchi, afirmou que uma medida invasiva dessa natureza “nunca antes havia sido processada na gestão do Presídio da Polícia Civil de São Paulo”.O chefe do órgão fiscalizador enfatizou que o encontro dos itens, drogas e bebidas, revelaram a “orquestração criminosa” corporificada pelos agentes presos “na busca por tentáculos de dentro para fora dessa estrutura prisional”.“Hordas criminosas”Enfatizando o poder econômico de alguns policiais detidos na unidade — oriundo de supostas relações com o crime organizado — o corregedor-geral ainda destacou o fato de parte dos celulares apreendidos terem sido encontrados enterrados, no pátio do presídio.Isso decorreu, segundo ele, “claramente do domínio de informação dessas hordas criminosas”, presas na unidade, as quais antevendo o pente-fino, “criaram contingência de ocultação desses celulares — equipamentos de comunicação valiosos imprescindíveis para esses criminosos”.Mais apreensõesCerca de um mês e meio se passou e, em 13 de março, 70 policiais civis voltaram ao presídio da instituição, no qual realizaram mais uma varredura.Além de fazer vistorias nas celas, presos também foram submetidos a revistas, resultando no encontro de maconha e cocaína com um deles.Ao todo, foram apreendidos na ocasião dez celulares, R$ 5.966,35, dois chips de celular, três pendrives, dois carregadores de celular e até anabolizantes. Um inquérito policial foi instaurado para identificar e responsabilizar os responsáveis pelos itens ilegais encontrados. Leia também São Paulo Corregedoria: policiais presos reproduzem estrutura do PCC na cadeia São Paulo Justiça nega RDD para policiais presos suspeitos de ligação com o PCC São Paulo Três núcleos comandam crime organizado em presídio da Polícia Civil São Paulo Ataque hacker que drenou R$ 541 milhões via Pix durou 5h na madrugada Policiais suspeitos de elo com PCCComo revelado pelo Metrópoles, temendo resgates ou fugas, a Corregedoria da Polícia Civil solicitou para que dez policiais, presos no presídio da instituição, fossem transferidos para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). A solicitação, porém, foi negada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, de acordo com decisão obtida pela reportagem.Em sua argumentação, enviada em março deste ano — e não aceita pelo juiz Hélio Narvaez –, o corregedor João Batista Palma Beolchi afirmou que os dez policiais, para os quais solicitava a transferência, foram indiciados por organização criminosa.Eles, acrescentou Beolchi, poderiam financiar eventuais resgates e fugas. A reportagem apurou que, para evitar isso, grupos especiais da polícia foram escalados para ficar no entorno do presídio, dia e noite.“Pontue-se que nessa apuração, surgiram ainda elementos de convicção sobre envolvimento direto desses policiais com membros de facção criminosa, conhecida como Primeiro Comando da Capital“, afirmou o corregedor-geral.Como revelado pelo Metrópoles, o órgão fiscalizador chegou a comparar a conduta dos dez policiais à praticada pela maior facção o Brasil dentro dos presídios convencionais, que seria manter suas atividades criminosos, nas ruas, de dentro da cadeia.O RDD, modelo prisional para o qual a Corregedoria gostaria de ter enviado os policiais civis, presos na unidade carcerária da capital paulista, é um velho conhecido da cúpula do PCC.Neste modelo, o preso é submetido a um regime de cumprimento de pena mais rigoroso que o regime fechado — aplicado a detentos de alta periculosidade que, por isso, são mantidos em maior isolamento.Argumentos da JustiçaEm seu parecer, no qual negou a transferência dos policiais, o juiz Hélio Narvaez afirmou não ter encontrado “respaldo normativo” na argumentação da Corregedoria. O magistrado disse caber ao órgão fiscalizador “acolher policiais civis” presos e encaminhados ao presídio da instituição.O juiz acrescentou não existirem meios de transferir os policiais presos para unidades da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) “em virtude de legislação”.“Apesar das informações de que os internos oferecem alto risco para a segurança do estabelecimento prisional em destaque, bem como à coletividade, ao analisar o conjunto todo do conteúdo do presente expediente, não há, por ora, indicativo para justificar a medida de remoção dos representados, para o Regime Disciplinar Diferenciado, como instrumento eficaz de restabelecimento da ordem pública”, argumentou.Mencionando a apreensão dos celulares, drogas e dinheiro, o magistrado disse ainda que os itens não poderiam ser relacionados aos policiais alvo do pedido de transferência. Ele ainda argumentou que “não houve comprovação” do envolvimento dos policiais com organização criminosa, ocupando “posto de coordenação de tarefas antissociais”.O juiz, então, determinou que permanecessem na unidade, “por falta de amparo fático e legal”, os policiais civis: Cléber Rodrigues Gimenes, Thiago Gonçalves de Oliveira, Eduardo Lopes Monteiro, Fábio Baena Martin, Rogério de Almeida Felício, Marcelo Marques de Souza, Marcelo Roberto Ruggieri, Valdenir Paulo de Almeida, Valmir Pinheiro, Cyllas Salerno Elia Júnior e Fabrício Parise Branco.A defesa dos policiais não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestações.