O movimento fitness cresce a cada dia, marcando uma verdadeira Era. Um dos públicos mais atingidos são os adolescentes, ou seja, as gerações Z e Alfa. Ao crescerem em um mundo digital, tem seus comportamentos influenciados fortemente pelas redes sociais: exercícios físicos, alimentação e saúde mental. Crescendo na mesma Era do Fitness, parece que esse fenômeno tem gerado bons e maus resultados para esse público, vamos conhecê-los a partir de diferentes áreas.O uso excessivo do celular é apontado como uma, das principais causas de transtornos mentais entre os adolescentes. (Fonte: Getty Images)Redes sociais e saúde mentalA grande obra que descreve a saúde mental das gerações novas é o livro “Geração Ansiosa” do psicólogo Jonathan Haidt. Para ele, é notável que o celular é a principal causa da epidemia de transtornos mentais entre adolescentes.O mergulho profundo no mundo virtual, através da combinação de smartphones, redes sociais, jogos online e internet sem fio de alta velocidade, trouxe consequências à saúde mental dos adolescentes. Dentre os principais prejuízos, segundo o autor, estão: privação social e de sono, atenção fragmentada e vício. Todos eles geram consequências sobre a saúde.Saiba também: Cuidado com os influencers fitnessNo âmbito da saúde mental, segundo a psicóloga, Ana Carolina Ribeiro, a adolescência pode ser uma fase extremamente desafiadora: ao mesmo tempo, em que há uma busca individual pela identidade, há também a pressão dos grupos de que o adolescente faz parte, ou ainda das demandas sociais por determinados comportamentos.Um cérebro ainda imaturo, em pleno desenvolvimento, pode encontrar dificuldades em lidar com tantas exigências, e isso acaba prejudicando a relação consigo mesmo e com os outros. É preciso que pais e profissionais que atuam diretamente com esse público estejam atentos, dispostos a ouvir suas necessidades e a tentar compreender seu ponto de vista de uma identidade em construção.Consumo de álcoolA “socialização sóbria” parece crescente na Gen Z, motivada em parte por questões de saúde, mas também devido ao aspecto financeiro: beber não é barato. Esses jovens têm sido líderes no movimento “Sober Curious”, se questionando sobre sua relação com álcool e bebendo menos, inclusive os brasileiros.Parece que o "bar" da Geração Z é a academia. Mas esse não é um comportamento totalmente sublime.Exercícios físicosÉ frequentar uma academia no período da tarde e perceber o público predominante – o da geração Z. Foi isso que observei frequentando mais de 50 academias nos últimos anos. Se antigamente praticavam esportes na rua, os adolescentes de hoje vão à academia levantar pesos. Os adolescentes parecem estar mais no fitness do que nos esportes. “Percebo que quem nasceu por volta dos anos 2000, sabe que o exercício físico deve ser parte de sua rotina”, afirma Victor, de 21 anos, que pratica corrida de rua e academia.A geração Z estão mais conscientes do benefício da prática da atividade física, do que a gerações anteriores. (Fonte: Getty Images)Embora os dados sejam inconsistentes, talvez a Geração Z esteja se exercitando mais e buscam nas academias seu espaço de socialização, pois não é incomum encontrar grupos de 4 ou 5 adolescentes praticando musculação juntos. Outros fatores explicam o aumento como maior conscientização dos benefícios de se movimentar, especialmente a busca pelos efeitos sobre a saúde mental. Seriam somente essas as razões deles?O “fitinspiration” que pode ocorrer a partir do que jovens visualizam os influenciadores fazendo não é inofensivo e pode mudar seus comportamentos, gerando exageros na quantidade de exercícios, além do consumo desnecessário de suplementos.Essa geração vem de fábrica com um conceito de wellness que supera o bem-estar, indo para o lado do desempenho. É o que observa a nutricionista Alice Erwig – Doutora pela USP, alertando que “vivemos uma era em que o corpo ideal não nasce da saúde, mas do filtro. Entre likes, algoritmos e padrões inalcançáveis, adolescentes se veem cada vez mais pressionados a caber em moldes que nem deveriam existir".Influenciados pelas redes sociais os adolescentes muitas vezes, buscam metas corporais irreais, colocando a sua saúde física e mental em risco. (Fonte: Getty Images)Ainda segundo, a Drª. Erwig, "o que antes deveria ser uma fase de crescimento, descoberta e fortalecimento, hoje se torna palco de comparação, restrição e exagero. O culto à magreza extrema voltou, e voltou mais perigoso”.Alimentação e suplementosSe o consumo de álcool reduziu, não podemos dizer o mesmo de suplementos e da melhora na qualidade da alimentação. Os produtos, em sua maioria sem comprovação científica de seus efeitos, parecem pré-requisito para tentar compensar uma alimentação inadequada.A nutricionista observa um cenário preocupante em sua prática clínica: “adolescentes substituindo refeições por barras e shakes (ainda!) e consumindo pré-treinos e termogênicos como se fossem balas (além das gummys "milagrosas" para cabelo, unha, pele). Há casos ainda mais extremos, com uso de hormônios e jejum adotados sem qualquer critério. Tudo isso, frequentemente influenciado por “influencers” sem formação na área da saúde, mas com milhares de seguidores e promessas”, relata a pesquisadora.Muitos adolescentes estão substituindo alimentos de ‘verdade’ por suplementos que não tem eficácia comprovada. (Fonte: Getty Images)Em estudo realizado em São Luís, no Maranhão, 65% dos adolescentes de 12 a 19 anos relatou utilizar suplementos, especialmente os homens que o fizeram sem orientação profissional. Já no Canadá, em estudo com mais de 900 jovens, quase metade (43%) relatou que sua principal influência para uso de suplementos foi de influenciadores de redes sociais. Quase 70% deles buscam informações em sites e apenas 9,8% dos participantes consideraram o seu uso problemático.Alice nota o retorno crescente de adolescentes ao consultório com metas corporais baseadas em padrões irreais disseminados nas redes sociais. “Muitos já apresentam sinais evidentes de transtornos alimentares e mantêm uma relação extremamente prejudicial com a alimentação, acompanhada de uma percepção distorcida do próprio corpo e da realidade”, afirma a nutricionista.Leia mais: Existe relação entre a alimentação saudável e a saúde mental?Para Alice, além dos transtornos, temos um agravante: “a nova geração se informa majoritariamente pelas redes sociais e já consome, por conta própria, uma variedade de suplementos sem qualquer evidência científica”, alerta. “Isso transforma uma fase crítica do desenvolvimento em um terreno fértil para condutas de risco, com consequências sérias a médio e longo prazo para a saúde física e mental. A alimentação cotidiana, que deveria ser a base de tudo, é ignorada. Arroz, feijão, frutas e vegetais perdem espaço para cápsulas, fórmulas industrializadas e modismos vazios”, destaca a Drª. Erwig.As novas gerações parecem esbarrar em um paradoxo fitness: parecem buscar saúde e bem-estar, mas seguem obcecados por questões estéticas, caracterizando o fenômeno “wellness washing”, em que o foco estético é mascarado com discurso sobre bem-estar.Mas claramente não se trata apenas de uma questão estética. É um problema de saúde pública. A adolescência é uma janela crítica de desenvolvimento físico, hormonal e cognitivo. Interferir nela com condutas extremas pode deixar marcas profundas e duradouras. E pior: tudo isso ocorre sob a falsa sensação de controle e pertencimento digital, enquanto o corpo real paga a conta.*** Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência - Fatos e Mitos.