Fintechs terão ano de ajuste e consolidação após novas regras pelo BC

Wait 5 sec.

O ano de 2026 será de adaptação para a empresas de tecnologia voltadas ao mercado financeiro, as fintechs, às novas normas do Banco Central, que devem provocar uma consolidação do setor. Empresas sem capital ou estrutura suficientes podem se unir para ganhar escala e conseguir atender a exigências que devem também limitar a entrada de novos participantes, avaliam representantes do setor. Ao mesmo tempo, as normas, que devem ser cumpridas até 31 de dezembro do ano que vem, vão aumentar a segurança tanto para as empresas que usam os serviços dessas fintechs como para os clientes finais.São cerca de 1.500 empresas que hoje prestam diversos serviços ligados ao setor financeiro, muitas das quais de atividade bancária, ou “Banking as a Service” (BaaS), e que oferecem abertura de contas, pagamentos, transferências e crédito para clientes de outras empresas, como varejistas. “As BaaS são importantes especialmente para negócios fora do sistema financeiro que querem prestar serviços aos clientes e não têm autorização ou experiência ou para as quais não faz sentido incorporar as obrigatoriedades e regulações do setor e que podem contar com uma empresa especializada e autorizada pelo BC”, afirma Carlos Augusto de Oliveira, diretor executivo da ABFintechs, associação que reúne 700 empresas do setor.Leia também: ‘Preço’ do dinheiro: Entrada de fintechs reduz spread e torna o crédito mais baratoClareza nos riscosA regulação do BC vem sendo discutida desde o fim de 2024 com o mercado, diante do crescimento do setor e da necessidade de “subir a régua”, ou seja, padronizar e aumentar os níveis de exigência para as empresas de BaaS, especialmente em três perspectivas: clareza quanto aos riscos, transparência e necessidade de capital, explica Oliveira. Com relação à clareza sobre os riscos, ele dá o exemplo de um lojista que hoje contrata uma BaaS para conceder crédito ou simplificar pagamentos de clientes. Como não havia regulação clara, ficava a critério do prestador de serviços colocar no contrato suas responsabilidades. Agora, o BC definiu que o prestador do serviço financeiro é obrigado a colocar suas obrigações no contrato. “Quando tinha algum problema no serviço, o cliente final reclamava para empresa com quem se relacionava ou ia ao Banco Central, que não podia fazer nada”, diz Oliveira. “Agora as responsabilidades ficarão claras.”Maior transparênciaOutro aprimoramento é com relação à transparência, pois será preciso identificar para o consumidor e para o BC nos contratos de prestação de serviços e nos canais de comunicação com os clientes quem é o responsável por determinada atividade. Dessa forma, o cliente saberá que, se for prejudicado, pode acionar o prestador ou o BC.Mais capital O BC também aumentou a exigência de patrimônio mínimo para a prestação dos serviços de BaaS, de cerca de R$ 1 milhão para R$ 7 milhões, chegando em alguns casos a R$ 10 milhões, dependendo do tipo de atividade. Para Oliveira, essa medida vai fortalecer e dar mais robustez para o setor, mas criará dificuldade para novos participantes. “Estamos discutindo com o BC esse ponto, de encontrar alguma maneira de flexibilizar essa exigência, para não termos uma limitação na inovação e no surgimento de novos players”, diz.Maioria já seguia regrasA maioria das fintechs que trabalham como BaaS já segue muitas das normas aprovadas pelo BC, diz Doug Storf, CEO da SWAP, empresa prestadora de serviços de infraestrutura financeira que atua no mercado desde 2018. “Sempre adotamos boa parte dos preceitos que estão na norma, como segurança, robustez, transparência, separação dos saldos e da titularidade das contas”, afirma. Para ele, o impacto será mais do ponto de vista comercial, com ajustes de contratos e fluxo de informações do dia a dia do que na estrutura de serviços.Mas ele observa que há ainda tomadores e prestadores que vão ter de fazer ajustes mais profundos. Ele cita modelos de negócio nos quais o tomador transita todos os valores em conta própria antes de redistribuir entre os usuários finais. Esse modelo não vai ser mais possível e vai exigir toda uma mudança de tecnologia e de estrutura de contas.Contato com o usuário finalEntre os pontos mais delicados dos ajustes, Storf cita toda questão de transparência e comunicação com o usuário final do serviço. “Hoje é normal que o usuário tenha contato somente com o tomador de serviço do BaaS e ele vai passar a ter também com o prestador, e isso vai exigir adequação de canais de comunicação para ele saber que está tendo uma relação também com prestador”, diz.Responsabilidade com novos clientesHaverá também um aumento na responsabilidade sobre as análises de novos clientes e sobre todas as políticas de prevenção de lavagem de dinheiro, que uma parte do mercado acabava compartilhando com o tomador do serviço. “O BaaS pode até usar o tomador como fonte de informação, mas a responsabilidade será do prestador”, diz. Com isso, todos os manuais e procedimentos e políticas de governança dos tomadores precisarão se ajustar às políticas do prestador de serviços de BaaS. “Esses ajustes levam tempo pois mudam a forma de trabalho, procedimentos internos, coleta de dados, pesquisa e tudo mais”, diz Storf.Só um prestador por serviçoOutra mudança importante será que cada tomador de serviço de BaaS só poderá ter um prestador por tipo de serviço. Segundo Storf, hoje é comum ter um prestador para abertura de conta, outro para pagamentos, outro para crédito. Fazer esse ajuste pode ser complexo porque o comerciante vai precisar migrar serviços de um prestador para outro, diz Storf, lembrando que isso exigirá adaptações também nos BaaS, que terão de ser menos fragmentados.Mais contingências para problemasAs novas normas do BC vão demandar maior investimento em infraestrutura e maiores custos e adaptações, lembra Oliveira, da ABFintechs. “A assunção de responsabilidades exige que você se prepare para contingências para eventualmente ter de honrar custos de falhas junto ao contratante e ao cliente final, mas faz parte do jogo”, diz. E, como o BaaS em geral não tem contato direto com o cliente final do serviço, o que dificulta a solução de alguns problemas, a preparação terá de ser maior.Mais fusões e menos entrantesDe maneira geral, Oliveira acredita que as mudanças devem estimular alguns tipos de fusões entre empresas que percebam que precisam adquirir musculatura mais rapidamente para ter remuneração adequada frente a essa nova estrutura de capital exigida e, de certa forma, dificultará um pouco novos entrantes. O processo, diz, deve levar a uma acomodação gradativa do mercado, em que operações que não estavam tão rentáveis ou com dificuldades de crescer procurem se consolidar de alguma forma. “Não é um movimento abrupto, o ajuste tem um bom prazo, até o fim do ano que vem, mas é movimento que tende a acontecer, cada um deve analisar sua operação, se faz sentido continuar sozinho, falar com sócios, investidores, se vai precisar aportes como isso pode ser viabilizado e devem surgir algumas consolidações”.Ajuste benéficoStorf, da Swap, vê como um movimento natural a consolidação do setor e, potencialmente, até benéfico. “O regulador vem dando cada vez mais responsabilidade para quem é entidade supervisionada e empresas que decidem ser reguladas estão cada vez mais sob escrutínio do BC, exigindo mais governança, capital e seriedade, e isso aumenta o nível segurança e robustez da indústria, mas nem todos vão conseguir acompanhar”, diz. “Isso não quer dizer que sejam más empresas, mas que não necessariamente atingiram a escala que permita prestar o serviço no nível de qualidade e segurança que o regulador exige”, afirma.Mais segurança, menos flexibilidadeSobre se as medidas vão limitar o desenvolvimento do setor, Storf acredita que se trata de um rebalanceamento. “Em 2013, quando o BC criou figura da instituição de pagamentos, ele queria promover competitividade, inovação e foi muito bem-sucedido, tivemos uma revolução, muitas empresas novas entrando com modelos de negócios distintos, mas isso também trouxe um certo grau de risco” lembra. Agora o regulador está tentando equilibrar essa equação, abrindo mão de um pouco de flexibilidade para aumentar segurança e robustez. “É natural que a gente veja uma redução de novos entrantes, algum impacto em inovação, mas boas ideias ainda vão continuar encontrando recursos financeiros para que possam existir e crescer.”Em geral, Oliveria diz que as novas normas fortalecem o mercado, mas que a associação trabalha para que elas não eliminem novos modelos de negócio. “Até porque as empresas de BaaS têm um escopo bem amplo de serviços e alguns não foram incluídos na regulação, como o Efex, serviço de pagamentos transfronteiriços, no exterior, o ITP, iniciador de transações de pagamento, a sub adquirência, e que o BC entendeu que precisava se aprofundar mais sobre as características de cada um”, diz. Por isso, ele espera que novas regulações e novos serviços surjam nos próximos anos.The post Fintechs terão ano de ajuste e consolidação após novas regras pelo BC appeared first on InfoMoney.