Retrospectiva 2025: o que os números contam sobre a eletrificação no Brasil

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Se alguém me dissesse, alguns anos atrás, que o Brasil fecharia 2025 com mais de meio milhão de veículos eletrificados rodando, eu provavelmente acharia otimista demais. Mas os dados não mentem. Entre janeiro de 2019 e novembro de 2025, o país acumulou 577.130 veículos leves eletrificados, alcançando 3,73% de participação da frota. Ainda é pouco? Sim. Mas definitivamente já é grande demais para ser ignorado.E talvez o ponto mais interessante dessa história não seja o tamanho do mercado, mas o caminho que o brasileiro escolheu para chegar até aqui.2025 foi um ano de virada silenciosa. Mesmo sem ter fechado o ano, ele já superou 2024 em volume de vendas. Foram 190.007 unidades até novembro, contra 177.358 no ano inteiro anterior. Isso aconteceu em um cenário nada trivial: juros altos, debates acalorados sobre eletrificação, dúvidas sobre infraestrutura e uma narrativa polarizada.O mercado, no entanto, fez o que sempre faz: seguiu o consumidor.Eletrificação à brasileira: gradual, híbrida e no nosso ritmoOlhando os dados divulgados pela ABVE, fica claro que a eletrificação no Brasil não acontece de forma abrupta ou ideológica. Ela avança de maneira gradual, respeitando as particularidades do país, da infraestrutura disponível e, principalmente, do perfil do consumidor brasileiro.Quando olhamos para o recorte por tecnologia, o retrato fica ainda mais evidente.Entre os eletrificados, entram os seguintes tipos de veículos:BEV (Battery Electric Vehicle): veículo 100% elétrico, movido apenas por bateria, sem motor a combustão;PHEV (Plug-in Hybrid Electric Vehicle): híbrido que pode ser carregado na tomada e rodar trechos apenas no modo elétrico;HEV (Hybrid Electric Vehicle): híbrido convencional, que combina motor elétrico e a combustão, sem recarga externa;HEV Flex: híbrido que mantém a característica flex, podendo rodar com etanol ou gasolina.Esse detalhe ajuda a entender melhor o cenário: quem lidera o mercado não são exclusivamente os 100% elétricos, mas sim os PHEVs, seguidos pelos BEVs e pelos híbridos flex.Ou seja, o brasileiro não rejeitou a eletrificação.Ele apenas recusou os extremos.O híbrido, especialmente o plug-in e o flex, virou a solução lógica para um país continental, com matriz energética diversa, cultura flex consolidada e realidades muito diferentes entre capitais e interior.O papel invisível dos MHEVsQuando entram na conta os MHEVs (12V e 48V), o mercado ganha ainda mais corpo. Eles não costumam aparecer nas discussões mais apaixonadas, mas cumprem um papel fundamental: reduzir consumo, emissões e custo de transição, sem exigir mudanças radicais de comportamento.Somados, os MHEVs representam dezenas de milhares de unidades e mostram que a eletrificação no Brasil acontece também no detalhe, não só no discurso.Novembro de 2025 registrou uma leve queda frente a outubro, na casa de -0,75%. O dado, isolado, pode chamar atenção, mas não aponta para uma freada estrutural do mercado.O movimento está muito mais associado a fatores como sazonalidade, ajuste de mix de produtos e expectativa por novos ciclos comerciais, especialmente no fechamento de ano. Quando observada a série histórica, a tendência segue positiva, com volumes bem acima dos registrados em anos anteriores.Em outras palavras, o gráfico continua apontando para cima.2025 também foi o ano da profissionalização do setorSe os números mostram que a eletrificação avançou em volume, 2025 também marcou um passo importante na estruturação técnica e institucional desse mercado. Em dezembro, a ABNT lançou a PR 1025, uma prática recomendada que estabelece competências técnicas e requisitos de segurança para profissionais que atuam na manutenção de veículos elétricos e híbridos.O lançamento ocorreu em Brasília, durante o Seminário de Mobilidade Elétrica da ANEEL, e simboliza algo maior do que uma nova norma: o reconhecimento de que a eletrificação deixou de ser tendência para se tornar realidade operacional.Durante o evento, o presidente da ABNT, Mario William Esper, destacou que o Brasil vive uma etapa decisiva de reorganização da sua matriz energética, justamente por reunir características únicas. Um país tropical, continental, com realidades regionais distintas e uma base produtiva diversa, onde etanol, biodiesel, biogás e outras soluções convivem com o avanço da eletrificação. “Essa diversidade é, na verdade, a nossa força”, resumiu.O balanço de 2025 deixa algumas lições bem clarasA eletrificação não acontece em linha reta, e está tudo bem. Não existe uma solução única capaz de atender todos os mercados, realidades e perfis de consumidor. No Brasil, ficou evidente que a preferência é por flexibilidade, não por imposições.Nesse cenário, os híbridos deixam de ser vistos como atraso e passam a cumprir seu verdadeiro papel: o de ponte. Uma transição possível, gradual e alinhada com a realidade do país.O futuro elétrico, aliás, já chegou. Mas chegou do jeito brasileiro, respeitando contexto, infraestrutura e escolhas.Talvez a maior virada de 2025 não esteja apenas nos números, mas no tom da conversa. Menos promessa messiânica, mais pé no chão. Menos “ou isso ou nada”, mais caminhos possíveis.E se 2025 ensinou alguma coisa, é que transições consistentes não precisam fazer barulho. Às vezes, elas acontecem em silêncio… enquanto os números seguem crescendo.