Como ocorre desde a redemocratização, Lula será candidato a presidente. Em 2026, ele disputará pela sétima vez o cargo, para o qual só não concorreu, por livre e espontânea vontade, em 2014, quando permitiu à sua pupila Dilma Rousseff tentar a reeleição. Em outras duas eleições, o petista foi impedido de participar, uma por proibição constitucional (2010), outra por estar preso em razão da Operação Lava-Jato. A nova postulação, anunciada por ele durante uma viagem à Indonésia, não pegou ninguém de surpresa, já que a partir da recuperação gradativa de sua popularidade Lula abraçou de vez o discurso de concorrente, a postura de palanque e o seu tradicional receituário populista em busca de voto.MANTRA - Haddad: colocar o povo no Orçamento e os ricos no imposto (Ricardo Stuckert/PR)Tudo devidamente acompanhado por demonstrações públicas de vigor físico, encenadas numa tentativa de refutar a suspeita espalhada pela oposição de que o presidente, agora octogenário, talvez não tenha mais a saúde necessária para cumprir tão importante missão. Revigorado politicamente com a ajuda involuntária dos próprios adversários, Lula minimizou o peso da idade e declarou no giro asiático ter a mesma energia de quando tinha 30 anos. “Eu vou disputar um quarto mandato no Brasil. Então, estou lhe dizendo que ainda vamos nos encontrar muitas vezes”, declarou ele, que nunca permitiu a ascensão de um sucessor natural no PT e na esquerda.Poucos dias depois da declaração, o presidente colheu uma imagem poderosa para esta fase de pré-campanha despudorada, que pela legislação eleitoral não poderia estar ocorrendo agora: a foto dele com Donald Trump, que até o anúncio do tarifaço imposto pelos Estados Unidos ao Brasil, em julho, era considerado pelos oposicionistas o principal aliado de Jair Bolsonaro para desestabilizar o governo petista e pressionar o Judiciário brasileiro a absolver o ex-presidente da acusação de tentativa de golpe. O senador Flávio Bolsonaro, por exemplo, Trump poderia não reconhecer o resultado da próxima eleição se seu pai não concorresse ao Palácio do Planalto. Um desatino completo.MISSÃO - Alckmin: estreitando as relações entre o governo e a indústria (Cadu Gomes/VPR/.)A foto de Lula e Trump não só confirma a “química” inicial entre eles como formaliza a abertura de um diálogo entre os dois países. É difícil saber o quanto isso trará de resultados práticos. Na seara da imagem, no entanto, o petista já tem o que comemorar. Um monitoramento realizado pela Quaest mostrou que o registro do aperto de mãos dos presidentes bateu recorde nas redes sociais de Lula, com 72 milhões de visualizações, 22 milhões de curtidas e 7,5 milhões de compartilhamentos. Até então, a liderança cabia a uma foto de Lula e Janja tirada em agosto de 2021. O impacto do caso da sobretaxa às exportações brasileiras foi ainda maior fora do ambiente digital. Depois de ver a sua popularidade derreter nos primeiros meses do ano, o presidente começou a se recuperar graças à queda do preço dos alimentos e à defesa da cobrança de mais impostos dos mais ricos em troca da redução da carga sobre os mais pobres. Essa recuperação ganhou impulso com a reação ao tarifaço, que deu um mínimo de rumo a uma gestão até então conhecida pela falta de bandeiras e por brigas internas entre seus principais quadros.Lula, então, saiu das cordas, lançou-se na arena eleitoral e começou a escalar sua tropa para a campanha de 2026. Um dos destaques é o vice-presidente Geraldo Alckmin, que pode concorrer ao mesmo cargo ou disputar o governo de São Paulo, hoje comandado por Tarcísio de Freitas, o nome mais forte da oposição para disputar a Presidência. Ex-tucano convertido ao PSB, Alckmin assumiu a linha de frente das negociações do tarifaço antes de pintar um clima entre Lula e Trump. O vice tem aproveitado a missão para estreitar laços entre o governo e a indústria e se contrapor a Tarcísio, que num primeiro momento elogiou as sobretaxas americanas.DISCURSO - Boulos: a tática do “nós contra eles” (Vinícius Rodrigues/MST/.)A relevância de Alckmin é resultado das circunstâncias. O posto de vice andava cobiçado por integrantes de outros partidos, mas o fogo amigo agora perdeu fôlego. Já a escalação de outra estrela para o escrete petista é fruto de uma guinada na estratégia de Lula. Em 2022, o presidente venceu Jair Bolsonaro prometendo formar uma frente ampla para governar e unir o Brasil, que, segundo ele, enfrentava uma ameaça de ruptura democrática. No poder, Lula até distribuiu uma dezena de ministérios a partidos de centro, mas deixou as principais pastas com o PT. Diante da polarização, alguns de seus auxiliares defendiam que o ideal era adotar um discurso moderado, supostamente capaz de atrair o eleitorado médio. Essa ideia foi abandonada. Por ordem do presidente, o governo deixará cada vez mais claro que tem lado no embate político e radicalizará suas posições. A pregação do “nós contra eles” ou “dos pobres contra as elites” ilustra bem a tática, reforçada com a posse de Guilherme Boulos na Secretaria-Geral da Presidência.ALIANÇAS - Gleisi: encarregada da montagem dos palanques regionais (Gil Ferreira/SRI-PR/.)Campeão de votos na última eleição para deputado federal em São Paulo, Boulos, que terá como prioridade aproximar o palácio dos movimentos sociais, é um crítico da tese de que a esquerda tem de caminhar de forma suave rumo ao centro. Para ele, um movimento desse tipo seria a morte política dos esquerdistas. Lula, de olho no quarto mandato, concorda. Por isso, o presidente passou a apostar cada vez mais em mantras populistas, devidamente explorados pela equipe do marqueteiro Sidônio Palmeira. Entre eles, a máxima de que é necessário colocar o povo no Orçamento e os ricos no imposto de renda. Cabe ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defender e viabilizar essa linha na economia. Apesar da situação das contas públicas brasileiras, uma bomba de efeito retardado que pode explodir já em 2027, inviabilizando programas sociais e o funcionamento da máquina, o governo anunciou recentemente a ampliação da distribuição do gás de cozinha e a isenção da conta de luz para pessoas carentes, ambas medidas de custo bilionário. Por ordem de Lula, a equipe ministerial também estuda a possibilidade de instituir a tarifa zero no transporte público e aumentar o valor do Bolsa Família. Ações voltadas para a classe média, especialmente para facilitar a compra da casa própria, também já foram anunciadas.O modo campanha está a pleno vapor e tem dado resultado. Pesquisa Genial/Quaest divulgada no início do mês revelou que desaprovação e aprovação ao governo estavam empatadas: 49% a 48%. Em maio, antes do tarifaço, a desaprovação superava a aprovação em 17 pontos percentuais. Outro levantamento, do instituto Paraná Pesquisas, realizado entre 21 e 24 de outubro, mostrou que Lula cresceu em intenções de voto e aparece empatado tecnicamente, mas numericamente à frente, de Tarcísio e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro em simulações de segundo turno.MARKETING - Sidônio Palmeira: exploração de programas populistas (Ton Molina/Fotoarena/.)Chefe da Casa Civil no governo Bolsonaro, o senador Ciro Nogueira, presidente do PP, não se diz preocupado com a fotografia do momento eleitoral. “Lula voa, mas é um bimotor. Basta surgir um jato da oposição para olhá-lo de cima”, escreveu numa rede social. Enquanto esse bólido não aparece, a ministra Gleisi Hoffmann, da articulação política, trabalha para montar desde já os palanques regionais, principalmente em São Paulo, Rio e Minas. Já Lula joga praticamente sozinho e ainda conta com as trapalhadas de seus rivais. A esta altura do campeonato, a bola está dominada pelo candidato à reeleição, mas ele nem sempre atuará em casa ou com torcida a favor. A crise na segurança pública do Rio deixa claro que, longe das quatro linhas dos palanques, o Brasil enfrenta problemas graves que podem custar, inclusive, a renovação de mandatos nas urnas.VejaO post Lula começa a escalar time de campanha e assume riscos de operar em modo eleitoral apareceu primeiro em Vitrine do Cariri.