Os próprios brasileiros ironizam os presidentes que não sabem se expressar em outro idioma. De vez em quando, Dilma arrisca fazer pronunciamentos em inglês ou francês, mas é um Deus nos acuda. Os mais críticos não poupam: dizem que é “vergonha alheia”. E, realmente, nessas oportunidades não havia necessidade nenhuma dessa desastrada aventura.Bolsonaro também é outro que, para falar em inglês, parece um canhoto tentando escrever com a destra. Mesmo assim, não deixou de arriscar algumas palavras. Na manifestação do dia 6 de abril, na Avenida Paulista, soltou: “Popcorn and ice cream sellers sentenced for coup d’État in Brazil” (vendedores de sorvete e pipoca condenados por tentativa de golpe de Estado).Lula não arriscaMesmo tropeçando na pronúncia e virando motivo de gozação dos adversários e de parte da imprensa, o ex-presidente atingiu o objetivo de divulgar ao mundo o que julgava ser desmandos da Justiça brasileira. E conseguiu: a frase repercutiu em jornais de vários países.Lula tem consciência da própria “incompetência” nessa seara e, por isso, não se arrisca. De certa maneira, aprendeu a circular com desenvoltura pelos mais diversos cantos do mundo, como palácios, edifícios presidenciais e instituições internacionais, “gastando” seu precário português.Quem pode falar no próprio idiomaBem diferente de Fernando Henrique Cardoso, que, por ter formação sólida e longa experiência em universidades francesas e americanas, fala com perfeição quase nativa esses idiomas. Sempre foi, por isso, motivo de orgulho para os brasileiros e de admiração pelos estrangeiros.Por outro lado, como todos sabiam que ele dominava essas línguas, se em certas circunstâncias optasse por se expressar em português, teria reforçado o peso simbólico da soberania nacional. Como fazem, por exemplo, Emmanuel Macron, que fala em francês nos mais variados ambientes, e os líderes da Alemanha, da China e da Rússia, que, em várias ocasiões, se expressam em suas línguas nativas.Afirmação da pátriaHá nesses casos uma questão delicada e sutil: ao se comunicar em seu próprio idioma, o líder demonstra ao mundo poder e afirmação nacional. Todos sabem que ele é culturalmente bem-preparado. Essas nações possuem relevância política e econômica, e ninguém se incomoda de ouvir seus representantes com auxílio de intérpretes.Já os líderes de países que não atingiram as prateleiras de cima, os que ainda estão em desenvolvimento, quando não falam inglês por falta de formação, e não por decisão pessoal, como os três brasileiros citados, a leitura pode ser outra. Talvez não sejam vistos como quem age por “afirmação da pátria”, mas como quem demonstra “incapacidade de dialogar diretamente com o mundo”. Tentou nivelar por baixoPior ainda foi a decisão de Lula ao tentar nivelar por baixo até a nossa diplomacia, sempre uma das mais admiradas do planeta. Em 2005, o inglês deixou de ser eliminatório para o ingresso no Instituto Rio Branco. A reação dos diplomatas experientes foi tão acentuada que, em 2006, o critério voltou a valer. E com razão.Essas são algumas ponderações à pergunta: Lula, Dilma e Bolsonaro não sabem inglês, e daí? Daí que, no relacionamento com líderes de outros países, principalmente nos contatos rápidos e informais, como conversas de corredor, pé de escada ou encontros fortuitos, os diálogos precisam ser prontos e eficientes. Dominar uma língua de uso comum é essencial.Lacuna recente nos líderes brasileirosEmbora as reuniões oficiais sejam preparadas com antecedência, essas “trombadas”, nem sempre por acaso, são os momentos em que agendas se ajustam e problemas são levantados. Muitas questões relevantes para o país podem nascer desses diálogos passageiros, casos em que o domínio de uma língua comum é essencial.E o fato de expor uma falta de formação intelectual pode pesar. Essa carência, nem sempre ostensiva, mas implícita nas tratativas sociais, talvez venha a ser um ponto negativo na imagem do país e de seus líderes. É uma lacuna que recentemente se evidenciou de forma mais acentuada. Siga o canal da Jovem Pan News e receba as principais notícias no seu WhatsApp! WhatsApp Os mais antigos tinham melhor formação intelectualAté a década de 1970, alguns presidentes brasileiros chegavam ao poder pelo voto popular, mas sustentados em preparo educacional sólido. Nilo Peçanha, por exemplo, era fluente em francês, língua dominante na época pelo conteúdo cultural. Mais tarde, o inglês, pelo domínio econômico e político dos Estados Unidos, passou a ser a língua mais utilizada.Precisamos de presidentes que consigam desenvolver o país, diminuir o desemprego, reduzir a carga tributária, controlar a inflação e a taxa de juros. Se atingirem esses objetivos, missão cumprida. Mas, nesse emaranhado de relações com outras nações, tendo como expoente máximo os Estados Unidos, saber falar inglês ajudaria muito. Siga pelo Instagram: @polito. Leia também Será que Trump negociará com Lula e passará uma borracha no passado?