Não é o algoritmo. É a pessoa

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A pandemia acelerou o digital como nunca se viu. Não é uma frase feita: em 2024, o comércio eletrónico passou, pela primeira vez, a valer cerca de um quinto das vendas de retalho a nível mundial, segundo a eMarketer (2024, ~20,1%). Na Europa, a trajetória mantém-se ascendente para os próximos anos, com o mercado a poder aproximar-se dos 901 mil milhões de dólares em 2028, de acordo com a EcommerceDB/ECDB. Em Portugal, quase metade da população (48,9%) entre os 16 e os 74 anos comprou online nos três meses anteriores ao inquérito oficial de 2024, segundo ANACOM/INE. Estes três factos explicam o que todos sentimos: conveniência sem fricção deixou de ser nice to have para passar a ser must have.Mas os números contam apenas metade da história. Mudou também a forma como decidimos. Passamos mais tempo ligados e, ainda assim, a confiança continua nas pessoas e não nos algoritmos. A Nielsen, em ‘Trust in Advertising’ (2021), confirmou que continuamos a confiar sobretudo em familiares e amigos quando chega a hora de escolher. A McKinsey (2025) reforçou, num inquérito global, que a conveniência, a rapidez e o autocuidado ganharam peso, enquanto a influência ‘digital’ pura sem mediação humana perdeu eficácia relativa. É precisamente aqui que a venda direta joga em terreno favorável: proximidade, aconselhamento e serviço existem no ADN do canal.Se tivesse de escolher uma tendência que mexe a sério com o mercado, escolhia a normalização do «traz-me até mim». Não falo de conforto, falo de tempo. O consumidor quer decidir como é contactado, quer pagar no momento, quer ter a entrega na janela que lhe convém e quer resolver devoluções sem labirintos. A venda direta encaixa bem neste guião quando a experiência digital não atrapalha a relação humana. Quando o link pessoal do agente funciona, quando o checkout é direto, quando a promessa de entrega se cumpre, a proposta do canal é robusta: pessoa certa, produto certo, fricção baixa. Quando por vezes falha, a relação sofre e, ao contrário de um marketplace, aqui o rosto tem nome e é-nos próximo.Outra tendência óbvia é esta: as lojas já não servem só para vender, também comunicam. Os grandes retalhistas usam o tráfego que têm para fazer comunicações segmentadas, a quem interessa, no momento certo e testam se funcionou. Isto importa para a venda direta porque cada agente também tem o seu’“mini-canal’ – clientes, WhatsApp, Instagram – e pode fazer o mesmo. A regra é simples: nada de ruído, mas sim conteúdo útil que conta. Quando o agente mostra como se usa um produto e tira dúvidas concretas, ganha atenção e as pessoas voltam.Nem tudo são rosas e isso não diminui o canal; torna-o mais credível. A confiança que a venda direta reclama precisa de prova pública. O consumidor já percebeu que os algoritmos influenciam, mas não quer substituí-los por promessas vagas. Quer sinais de seriedade: linguagem clara sobre direitos e devoluções, proteção de dados levada a sério, separação nítida entre testemunho e publicidade. Aqui está uma oportunidade rara: transformar proximidade em garantia de ética visível. Se a recomendação vem de alguém que usa o produto e vive na nossa comunidade, a fasquia sobe, não desce. Este é território da venda direta por excelência.Mas, também é preciso alguma humildade estratégica. Nem toda a interação pede demonstração ou aconselhamento. Nem todo o momento de compra pede conversa. Há momentos em que o ‘clicar e seguir’ vence. Quem decide? O comprador. Obrigar a interação onde ela não acrescenta valor é desperdiçar a vantagem da proximidade. Por vezes um clique, um email ou WhatsApp chega, e protege a confiança a longo prazo e dá espaço para a criação de uma relação.Em termos de oportunidades, vemos um caminho silencioso e consistente. Primeiro, uma experiência verdadeiramente omnicanal e omniserviço, sem saltos de plataforma, sem pop-ups inúteis, sem recolhas excessivas de dados, aquilo que a McKinsey (2025) descreve como «conveniência sem fricção» e «pagarei um premium pelo que me poupa tempo». Depois, prova em contexto: o agente que mostra como se usa, quanto dura, os benefícios e, no fim, facilita a compra. Por fim, pós-venda que não desaparece: o cliente quer saber quem lhe atende o telefone ou responde ao email ou WhatsApp quando precisa. Se o mercado global caminha para 20% ou mais de comércio online (eMarketer, 2024) e a Europa continua a crescer (ECDB, 2028), a venda direta tem espaço para crescer por dentro, não por gritar mais alto, mas por se diferenciar, pela proximidade e pelo serviço.Do lado dos desafios, três frentes merecem disciplina: tecnologia certa com os agentes a saber usá-la e a maximizá-la; pressão para produzir conteúdo relevante e próximo; e uma fasquia logística cada vez mais alta, com janelas de entrega curtas como novo normal.O balanço é este. As tendências jogam a favor da venda direta quando a proximidade encontra um digital que funciona, onde a confiança reside nas pessoas, não nos feeds ou algoritmo.O desafio está lançado, e nós, na venda direta, aceitamo-lo.O conteúdo Não é o algoritmo. É a pessoa aparece primeiro em Revista Líder.