Governança do Espaço: desafios atuais e caminhos para o futuro 

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Imagine olhar para o céu e saber que, para além das estrelas, milhares de satélites cruzam silenciosamente o nosso horizonte, interligando pessoas, empresas e governos em tempo real. O Espaço, que durante décadas esteve reservado às superpotências, é hoje um palco vibrante de investigação, inovação e negócios.  Apesar do entusiasmo, a nova corrida ao espaço enfrenta desafios significativos, tanto no que se refere à governança global, como para as empresas que operam neste setor. Embora ofereça inúmeras oportunidades de desenvolvimento económico e científico, esta expansão traz pressões sem precedentes sobre as regulamentações existentes, muitas das quais foram concebidas durante a era da Guerra Fria e se encontram desajustadas ao cenário espacial contemporâneo.   O Novo Ecossistema Espacial Global Tradicionalmente, o setor espacial era dominado por agências governamentais de grandes potências – EUA, Rússia, China, Europa –, mas nos últimos anos assistimos à democratização e ao crescimento exponencial da atividade privada (“NewSpace”). Graças aos lançadores reutilizáveis e à miniaturização dos satélites, o custo de colocar tecnologia em órbita caiu significativamente na última década. Empresas como a SpaceX, a OneWeb e a Kuiper já colocaram milhares de satélites em órbita, promovendo serviços comerciais de telecomunicações, Internet, observação terrestre e navegação, tornando inevitável uma revisão das regras do jogo.   Este dinamismo traz vantagens científicas e económicas, mas levanta questões críticas: o congestionamento orbital, a gestão dos detritos espaciais – fundamental para a sustentabilidade das atividades espaciais–, potenciais conflitos de interesses e desafios à segurança internacional. Simultaneamente, cresce o interesse pela mineração de recursos lunares e de outros corpos celestes, pelo turismo espacial e pela exploração do espaço profundo, o que coloca uma pressão adicional sobre o quadro legal em vigor. Por outro lado, as empresas que atuam na indústria espacial enfrentam obstáculos significativos na aplicação das leis que regulam as suas atividades comerciais, sobretudo devido à constante evolução tecnológica e à fragmentação dos regimes jurídicos existentes em diferentes países e regiões. Este cenário gera incerteza quanto às obrigações legais e aos procedimentos de licenciamento, prejudicando o desenvolvimento de negócios inovadores e a atração de investimentos. No domínio da observação da Terra, por exemplo, empresas lidam não apenas com normas nacionais, mas também com padrões internacionais e exigências de proteção de dados, o que dificulta a exploração comercial dos dados de satélite e cria barreiras ao acesso e à interoperabilidade de informações estratégicas. Estes desafios evidenciam a importância de fortalecer a governança do espaço, promover uma maior harmonização normativa e criar mecanismos regulatórios adaptáveis ao ritmo da inovação tecnológica e às necessidades emergentes do setor.  A Nova Abordagem à Governança No plano global, a governança espacial permanece assente em tratados históricos, negociados durante o período da Guerra Fria, entre 1950 e 1980, como o Tratado do Espaço Exterior de 1967, que consagra o princípio da utilização pacífica, da proibição de armas nucleares e da responsabilidade internacional pelas atividades espaciais. No entanto, o ritmo de inovação do NewSpace supera largamente os mecanismos tradicionais, exigindo a adaptação e a renovação das normas jurídicas. No cenário global, estão a ser discutidas novas formas de cooperação entre países, empresas e a sociedade civil. Modelos de governança inclusivos, dinâmicos e transparentes serão determinantes para dar resposta à multiplicidade de riscos e oportunidades: conflitos jurídicos, sustentabilidade ambiental, partilha de dados, envolvimento do Sul Global e promoção de acessos iguais às novas infraestruturas espaciais.  Os Acordos Artemis1, lançados pelos EUA em 2020, constituem um marco na governança espacial, ao estabelecerem princípios para a exploração pacífica e sustentável do espaço, com foco no retorno à Lua e na futura exploração de Marte entre os signatários2. Estes acordos promovem valores como o uso pacífico, a transparência, a mitigação de detritos e a exploração responsável de recursos espaciais, No entanto, estão e causa acordos bilaterais que não envolvem um consenso global. Paralelamente, organizações como a ONU, a ESA e outras promovem fóruns de debate, projetos de cooperação e iniciativas para responder aos desafios de Goverança, focando temas como a gestão do tráfego espacial (ou STM (Space Traffic Management), a mitigação do lixo orbital e a sustentabilidade ambiental, a segurança e a proteção das operações espaciais, a defesa no espaço, entre outros.   Portugal e a Europa Portugal tem vindo percorrer um caminho inovador, consolidando uma estratégia nacional (Portugal Espaço 2030, atualmente em revisão), que aposta no setor privado, na modernização do licenciamento, tendo aprovado um quadro legal de acesso ao espaço inovador e atribuiu recentemente a primeira licença para atribuição da primeira licença de operação de um centro de lançamento espacial em território nacional. A União Europeia avança com a “Proposta de Regulamento Espacial da “3 que, uma vez aprovada, será de cunho obrigatório para os Estados-membros. O objetivo deste futuro Regulamento é promover a harmonização regulatória entre os Estados-membros, podendo influenciar simultaneamente os padrões globais de sustentabilidade orbital e a responsabilidade estatal.  Desafios e Perspetivas Futuras  A governança do espaço tornou-se hoje um imperativo simultaneamente legal e estratégico, integrando a ciência, o direito, a política, a ciência e a economia. Somente através de quadros regulatórios flexíveis, globais e visionários será possível assegurar a captação de todos os benefícios do Espaço. Dado o longo caminho ainda a percorrer neste domínio, é essencial que as empresas abordem a regulação de forma estratégica e criativa, transformando os desafios em oportunidades para acelerar o desenvolvimento do setor.  Este artigo foi publicado na edição nº 31 da revista Líder, cujo tema é ‘Decidir’. Subscreva a Revista Líder aqui.O conteúdo Governança do Espaço: desafios atuais e caminhos para o futuro  aparece primeiro em Revista Líder.