‘Nosso foco é o negócio, não o criminoso’, diz Secretário do RJ sobre nova estratégia contra facções

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Em entrevista à Jovem Pan, o Secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Victor dos Santos, afirmou que o modelo de apenas ocupar territórios dominados pelo crime com forças policiais “historicamente não dá certo”. Ele defende uma nova abordagem, chamada de “retomada”, que envolve um plano integrado entre os governos municipal, estadual e federal para sufocar as fontes de receita das facções e restabelecer a presença completa do Estado nas comunidades.A discussão ocorre em um momento de intenso debate sobre a segurança pública no Rio, especialmente após uma megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha e no contexto da ADPF das Favelas, uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) que visa reduzir a letalidade policial.“Retomada” em vez de “ocupação”Segundo o secretário, a simples ocupação policial é uma estratégia falha. A “retomada”, por outro lado, é um plano mais amplo que reconhece a complexidade social e econômica desses territórios. “A gente tem que entender que 8.1% da população no Brasil mora em favela. No Rio de Janeiro, esse percentual é de 22%, quase um quarto da população”, destacou Santos, ilustrando a dimensão do desafio.O novo plano, que está sendo elaborado em resposta a uma determinação do STF, se baseia em cinco eixos principais: Segurança Pública e Justiça; Desenvolvimento Econômico; Desenvolvimento Social e Infraestrutura e Urbanismo e Governança e Sustentabilidade. “Para haver retomada, tem que haver essa integração entre os três entes da federação. Município, estado e União têm corresponsabilidade”, explicou o secretário, ressaltando que a participação da comunidade é fundamental para o sucesso da iniciativa.Foco no “negócio”, não no indivíduoQuestionado sobre as críticas de que a recente operação, apesar de seu alto número de mortos, não resultou na prisão de grandes lideranças do crime, Victor dos Santos explicou que a estratégia mudou. O foco não é mais o criminoso individual, que é facilmente substituído, mas sim o “negócio” do crime.“A segurança pública do Rio de Janeiro olha para a criminalidade no foco do negócio. Esse negócio não tem que ser atrativo”, afirmou. A meta é atacar as fontes de receita das facções para enfraquecê-las estruturalmente. Ele revelou que o crime evoluiu da simples venda de drogas para um portfólio diversificado de atividades ilegais, como a exploração de serviços básicos (gás, água, internet, transporte alternativo) e a construção civil.Como exemplo, o secretário citou que apenas com a exploração de sinal de internet pirata nos complexos do Alemão e da Penha, o faturamento do crime organizado chega a R$ 14 milhões por mês.Letalidade e a complexidade do confrontoSobre a alta letalidade das operações, o secretário afirmou que a violência é uma consequência da reação dos criminosos e que as ações são planejadas para minimizar riscos. “A gente entende que, havendo superioridade operacional, isso seria um fator inibidor”, disse ele, classificando a letalidade como um resultado “previsível, mas não desejado”. Ele também destacou que a operação no Alemão e na Penha resultou em 13 policiais feridos e um delegado que perdeu a perna.Normalização do crime e legislaçãoO secretário reconheceu que o Rio de Janeiro vive uma “crise moral” de longa data, marcada por uma hipocrisia na qual o crime e suas figuras, como os “bicheiros”, foram normalizados e até integrados a eventos culturais.Quando perguntado se as facções deveriam ser classificadas como grupos terroristas, Santos explicou que a legislação atual, de 2016, exige motivações específicas (ideológica, política, religiosa) que não se aplicam a esses grupos. “Hoje, a legislação no Brasil não ampara isso”, disse ele, pontuando que qualquer mudança nessa classificação é uma discussão que cabe ao Congresso Nacional.