O Distrito Federal, sede dos poderes da República e uma das regiões mais vigiadas do país, transformou-se em um ambiente profundamente hostil ao Comando Vermelho (CV).A facção, que se expande com facilidade em outras partes do Brasil, encontra na capital federal uma barreira quase intransponível, pressionada por uma estrutura policial altamente especializada e pela violência sistemática de seu principal rival, o Primeiro Comando da Capital (PCC). Leia também Mirelle Pinheiro “Senhor do senhor das armas”, que armou o CV, volta a ser alvo da PF Mirelle Pinheiro BMW, treinador do CV, recebeu foto de bandido segurando cérebro humano Mirelle Pinheiro Operação Torniquete: oficina do crime ligada ao CV é destruída no RJ Mirelle Pinheiro PF: líderes do CV usam advogados para comandar crimes no Amazonas A dificuldade do CV em se estabelecer no DF é resultado direto da estratégia de contenção adotada pelas forças de segurança locais. A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), em parceria com a Polícia Penal, mantém uma vigilância permanente sobre os integrantes das facções e aplica uma “política de mistura explosiva” nas prisões, um modelo que impede a criação de alas dominadas por grupos específicos.Segundo o delegado Jorge Teixeira, da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado, do Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Draco/Decor), a desorganização do CV é tamanha que a facção “não consegue sequer ser alvo de grandes operações”, por falta de estrutura e liderança. “Eles se mantêm na deles, com medo”, resume o delegado.Dados do sistema prisional reforçam o quadro de fragilidade: o CV tem apenas 73 membros presos, contra 216 do PCC e 183 do Comboio do Cão (CDC), uma facção genuinamente brasiliense. Essa desproporção torna os integrantes do CV em liberdade alvos vulneráveis, tanto para a polícia quanto para os rivais.O PCC e a execução do “lixo”A disputa entre PCC e CV no DF é marcada por uma dinâmica brutal. Dentro da facção paulista, executar um integrante do Comando Vermelho é considerado um ato de mérito, um “bilhete de acesso” para ascender na hierarquia criminosa.O PCC, com sua rígida disciplina interna, não autoriza homicídios sem aval da cúpula. Para conseguir essa permissão, os autores costumam rotular as vítimas como pertencentes ao CV, grupo que o PCC chama pejorativamente de “lixo”.De acordo com o delegado Jorge Teixeira, a violência do PCC no DF é direcionada principalmente aos rivais do Comando Vermelho. Cada execução, explica, eleva o status do autor dentro da facção.CasosA guerra entre as duas facções deixou rastros de sangue em várias cidades do DF. Os inquéritos da PCDF mostram que a rivalidade é o motor de homicídios com características de execução, tortura e crueldade.Em Samambaia e Recanto das Emas, por exemplo, integrantes do PCC foram presos após uma tentativa de homicídio contra um faccionado do CV.A investigação revelou que a ação fazia parte de um modus operandi organizado, com autorização superior, logística planejada e divisão de funções. A mesma arma usada no crime havia sido empregada em pelo menos outros sete assassinatos, todos com indícios de ligação com a guerra entre as facções.Em Planaltina, um criminoso conhecido como Paulo Matador, ligado ao PCC, foi condenado a 18 anos de prisão por matar um rival do CV. O assassinato foi motivado por vingança, após o integrante do Comando Vermelho ter tentado executá-lo anteriormente.O caso foi um dos primeiros na região a envolver diretamente as duas maiores organizações criminosas do país, segundo o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).Outro episódio de extrema violência ocorreu no Vale do Amanhecer, onde Lucas Caxias da Silva, o “Gordão do PCC”, e comparsas torturaram e mataram uma vítima com uma facada no coração, enterrando o corpo em uma cova rasa. A PCDF concluiu que a motivação era disputa entre facções e controle do tráfico local.A derrota do CV na capital do paísO cenário desenhado pelas investigações é o de uma facção enfraquecida, sem estrutura e cercada por todos os lados.A mistura forçada de presos nas unidades prisionais, o monitoramento constante da polícia e a política de assassinatos seletivos do PCC criaram um ambiente onde o Comando Vermelho não consegue prosperar.Os remanescentes da facção no DF vivem sob ameaça permanente, da polícia, dos rivais e até de antigos aliados. Em vez de um território de domínio, Brasília se tornou um campo de batalha, um espaço onde o PCC tem mais influência, o CDC resiste e o Comando Vermelho luta apenas para sobreviver.