Risco alto? As críticas ao fundo florestal do Brasil que teriam afugentado a Alemanha

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A decisão da Alemanha de deixar o Brasil sem anunciar um valor para investir no Fundo Florestas para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), durante a Cúpula dos Líderes que antecedeu a abertura da COP30 em Belém, reacendeu dúvidas sobre a viabilidade financeira do fundo. Segundo diplomatas alemães ouvidos pelo UOL, o principal motivo do recuo foi o risco elevado da proposta brasileira, que prevê aplicar recursos públicos e privados em títulos de dívida de países emergentes.Concebido pelo governo brasileiro em parceria com o Banco Mundial, o TFFF pretende mobilizar US$ 125 bilhões, sendo US$ 25 bilhões de governos e US$ 100 bilhões de investidores privados, para financiar a conservação das florestas tropicais. O modelo prevê aplicar o capital em fundos de renda fixa de economias emergentes, dividir parte dos rendimentos com investidores e destinar o restante para remunerar países que preservam suas florestas.O desenho teria preocupado os alemães, que já se comprometeram publicamente com o TFFF, mas teriam optado por apresentar valores apenas quando os riscos financeiros forem esclarecidos. O Reino Unido também teria recuado pelo mesmo motivo, de acordo com o UOL. Ainda não se sabe se essa seria a mesma razão por trás da rejeição da China, que, segundo a Bloomberg, também já decidiu não aportar para o fundo.Mas o que realmente pode ter sido motivo de alarde?As dúvidas sobre o modelo: receio de perdasO desconforto de alguns países com o TFFF se ancora em críticas de especialistas como o economista alemão Max Alexander Matthey, cofundador da Climate Impact Auctions, e o professor Aidan Hollis, chefe do Departamento de Economia da Universidade de Calgary, no Canadá. Ambos têm sido vozes centrais na comunidade acadêmica ao questionar a lógica financeira do fundo.Em artigo publicado ainda em agosto, Matthey e Hollis descrevem o TFFF como um “arranjo de alto risco com garantia pública disfarçado de modelo inovador de financiamento climático”. Segundo eles, o mecanismo se apoia na premissa de que seria possível obter ganhos “mágicos” de cerca de 7% a 8% ao ano em títulos de dívida de países emergentes, o suficiente para pagar 4% de retorno a investidores privados e ainda reservar uma margem de 3% para repasses às florestas tropicais.“O problema é que esse spread de juros não representa uma ineficiência de mercado, mas sim a compensação por risco real, de inadimplência, instabilidade política e volatilidade cambial”, argumentam os economistas em artigo publicado em agosto.Isso significa que, pelo modelo, os investidores estariam expostos a títulos com remuneração incondizente com os níveis de risco associados – na prática, seriam investimentos ruins.Max Alexander Matthey é analista de políticas públicas e cofundador da Climate Impact Auctions. Aidan Hollis é professor e chefe do Departamento de Economia da Universidade de Calgary. (Foto: Global Justice Program e University of Calgary)Governos assumem o maior riscoOs pesquisadores ainda alertam que, em períodos de turbulência, os rendimentos podem não ser suficientes nem para cobrir o pagamento aos países investidores, que ficam atrás dos credores privados na estrutura do fundo. Nesse cenário, o capital público pode ser perdido e as florestas ficariam sem remuneração.Isso porque o TFFF foi desenhado para funcionar como um grande fundo permanente, com capital inicial fornecido por governos que assumem a chamada “tranche de primeira perda” — ou seja, são os primeiros a absorver eventuais prejuízos. A camada superior, formada por investidores privados, teria prioridade no recebimento dos rendimentos.Para Matthey e Hollis, o modelo transfere o risco integral para o setor público, enquanto garante retornos para o capital privado, sem resolver o problema central do financiamento climático: a falta de recursos previsíveis e transparentes.“Se a estrutura fosse realmente lucrativa, por que restringi-la à conservação florestal?”, questionam os autores. “Governos poderiam usar o mesmo modelo para financiar educação ou infraestrutura — mas não o fazem, porque o risco é elevado.”Estimativas reduzidasO governo brasileiro mantém discurso otimista. Após os anúncios iniciais, US$ 1 bilhão do Brasil, US$ 1 bilhão da Indonésia e € 500 milhões da França, o total de recursos segue abaixo do necessário para o início das operações. O fundo soberano da Noruega, principal patrocinadora, confirmou US$ 3 bilhões em dez anos, sob a condição de que sua participação não ultrapasse 20% do total captado, o que significa que o dinheiro só entra quando o fundo superar US$ 12 bilhões.Com a saída cautelosa da Alemanha e o ritmo lento de compromissos, articuladores do TFFF recalibraram as metas: agora, o Brasil trabalha com um horizonte de um ano para levantar os primeiros US$ 10 bilhões, volume considerado suficiente para emitir os títulos iniciais e testar o funcionamento do mecanismo.The post Risco alto? As críticas ao fundo florestal do Brasil que teriam afugentado a Alemanha appeared first on InfoMoney.