Analistas veem direita pós-Bolsonaro fragmentada para 2026

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Especialistas ouvidos pela CNN Brasil veem a direita “fragmentada” e “dividida” em meio à decisão da Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal), que rejeitou o recurso de Jair Bolsonaro (PL) contra a condenação de 27 anos e três meses por tentativa de golpe de Estado.Pesquisa Genial/Quaest testou possíveis candidatos da direita para 2026, como Michelle Bolsonaro (PL), Eduardo Bolsonaro (PL), Tarcísio de Freitas (Republicanos), Ronaldo Caiado (União), Romeu Zema (Novo) e Ratinho Jr. (PSD).O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera todos os cenários de primeiro turno e empata tecnicamente com Bolsonaro, que está inelegível até 2030 após condenação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), no segundo.A antropóloga Isabela Kalil, professora da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), vê diferenças cruciais entre essas figuras políticas da direita e o ex-presidente, dificultando a escolha de um líder substituto do espectro político para o período pós-Bolsonaro. Leia mais Pesquisa: entre Michelle e Flávio, Tarcísio tem menor rejeição na direita Governador afastado do Tocantins é alvo da PF sobre embaraço a investigação Quaest: 81% discordam de fala de Lula sobre traficantes serem "vítimas" Kalil entende que o ex-chefe do Executivo criou seu palanque político por meio da união de diferentes grupos: de um lado, um com uma agenda mais voltada à moral, bons costumes e religião; do outro, setores mais preocupados com questões econômicas e de mercado.A construção dessa trajetória política de Bolsonaro não foi da noite para o dia e, ainda segundo a socióloga, o momento atual não é propício para existir um candidato que consiga o mesmo feito que Bolsonaro no campo da direita. Pelo menos, não para as eleições do ano que vem.O único que faz algo próximo disso, ainda que seja completamente diferente no espectro político, é o próprio presidente Lula: ele consegue unificar diferentes segmentos no campo da esquerda, segundo Kalil.Já para o cientista político Carlos Pereira, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), “a extrema direita vai continuar a insistir em Bolsonaro” e esse espectro político “não pode abandoná-lo agora”, mesmo com sua condição jurídica.“Vai perceber, especialmente após o início do cumprimento da sua pena, que essa estratégia tem custos reputacionais crescentes”, cita Pereira.O professor entende que a centro-direita precisará romper com Jair Bolsonaro o “quanto antes” para ser competitiva nas eleições de 2026 e “não cometer o mesmo erro” que a centro-esquerda cometeu ao não se afastar da imagem de Lula em 2018. Isso impediu que o setor mais à esquerda construísse uma candidatura alternativa a tempo das eleições daquele ano.Na época, o atual presidente estava preso e condenado no âmbito da Operação Lava Jato, quando o petista Fernando Haddad (atual ministro da Fazenda), disputou a eleição e perdeu para Bolsonaro no segundo turno. O STF anulou as condenações contra Lula em 2021.“Assim como Lula em 2018 preferiu perder para continuar sendo o núcleo da esquerda, Bolsonaro vai insistir em um nome da sua confiança para continuar ‘nucleando’ a direita. Esta [deve] saber se a direita vai continuar sendo refém dessa estratégia, ou vai buscar sua alforria”, complementa Carlos.Possíveis substitutosTarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo • Pablo Jacob/Governo do Estado de SPDiante do cenário, Isabela Kalil analisa que a reorganização da direita para eleger um novo líder deve acontecer de forma “fragmentada”.Para a professora da FESPSP, esses grupos devem se dividir em quem se preocupa mais com questões morais e religiosas, que pode ter Michelle Bolsonaro como representante; ou questões relacionadas à segurança pública, que podem ser mais representadas pelo governador Tarcísio de Freitas.“Ainda que a figura do Tarcísio tente dialogar com segmentos mais amplos [da direita], que inclui o campo religioso, ele não é originalmente desse campo. Então, ele não tem esse trânsito de diálogo com segmentos religiosos, diferente do Bolsonaro que tinha e conseguiu mobilizar”, pontua Kalil.Sergio Simoni Jr., professor de ciência política da USP (Universidade de São Paulo), analisa que Tarcísio precisa se “manter leal” ao ex-presidente e “acenar para outros setores moderados”.“A candidatura dele há alguns meses era vista com bastante potencial. Nos últimos tempos, devido às estratégias erradas, ou à escolha de estratégia dele e da família Bolsonaro com relação às tarifas [dos Estados Unidos] e a outros aspectos, acabaram fragilizando a candidatura dele”, pontua.Já Ronaldo Caiado reúne alguns pontos fortes, como o fato de ter conseguido manter certa distância do bolsonarismo em determinados períodos, na opinião de Simoni. Porém, o professor da USP analisa um ponto negativo na trajetória dele: o governador de Goiás não é conhecido nacionalmente.Herdeiros de BolsonaroDa esquerda para a direita: Michelle, Flávio e Eduardo Bolsonaro • Alan Santos/PR | Lula Marques/ Agência Brasil | Mário Agra/Câmara dos DeputadosO cientista político Carlos Pereira defende que nenhuma alternativa entre os familiares de Bolsonaro possui condições de emplacar uma candidatura neste momento.Isso porque, segundo ele, os parentes compartilham dos mesmos “delírios autoritários amplamente rejeitados pela maioria dos eleitores”.Simoni acrescenta que a dificuldade da direita em encontrar um substituto se relaciona com o fato da trajetória política de Bolsonaro ser marcada por instabilidade e isolamento. Para exemplificar, o professor da USP cita as mudanças de partido do ex-presidente, assim como a entrada dele no PL próximo à eleição de 2022.“Ele tem muita dificuldade, então, de acomodar e se relacionar com grupo político mais amplo. Isso implica nas dificuldades de articulação desse substituto — o que envolve a desconfiança sobre quem vai ser o nome escolhido, o que incide também no comportamento do Eduardo Bolsonaro”, diz.Esse tipo de perfil faz com que possíveis candidatos da família Bolsonaro fiquem restritos aos eleitores da extrema direita, segundo Carlos. Ou seja, isso impede o diálogo com outros setores e reafirma a política de isolamento do ex-presidente do Brasil.“Portanto, [a família] não terá condições de ampliar para setores de direita ou de centro comprometidos com a democracia”, conclui Carlos.Michelle Bolsonaro, por exemplo, não aparece como uma substituição política forte para os especialistas. Isso pode até envolver questões de gênero ou até por ela precisar de um aval do marido para se lançar politicamente.“Michelle Bolsonaro nunca foi candidata, mas tem um capital político, pelo menos aparente, considerável. Ela tem também uma aparente capacidade de coordenação política, mas sofre dificuldades que tem a ver com dificuldade de articulação no seu próprio partido e nas lideranças do partido, e dificuldades de articulação com os filhos do Bolsonaro”, diz Sergio Simoni Jr.Por outro lado, o professor da USP entende que Eduardo Bolsonaro é o filho do ex-presidente com uma “estratégia mais forte” para lançar uma candidatura própria.Essa possível candidatura aconteceria, na visão de Simoni, sem maiores articulações com outros setores da extrema direita. Em outubro, a CNN Brasil adiantou que Jair Bolsonaro ainda acreditava na eleição do deputado para as eleições do ano que vem.Os especialistas defendem que uma possível prisão de Bolsonaro em um presídio pode causar reações difusas, seja com seus apoiadores indo às ruas para protestar ou, o contrário, numa letargia ao verem a figura do ex-presidente mais fragilizada ainda.Mesmo assim, para os especialistas ouvidos pela reportagem, não deve haver tempo hábil para a direita construir uma figura política tão forte quanto Bolsonaro para as eleições de 2026.Quaest: Lula aparece à frente em cenários de 2º turno em 2026 | CNN NOVO DIA