O mercado de previdência complementar aberta registrou uma captação líquida negativa de R$ 3,1 bilhões em junho de 2025, segundo levantamento divulgado nesta terça-feira (19) pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), que representa as empresas que operam no setor. O resultado representa uma queda de 170,8% em relação a junho de 2024, ou seja, R$ 7,5 bilhões a menos.Os prêmios e contribuições somaram R$ 8,2 bilhões, retração de 44,9% frente ao mesmo mês do ano anterior, enquanto os resgates subiram 7,6%, totalizando R$ 11,4 bilhões. Ao todo, existem cerca de 13,6 milhões de planos de previdência aberta no país, sendo 62% do tipo VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), 23% PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) e os demais planos tradicionais.Segundo Edson Franco, presidente da Fenaprevi, a incidência do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sobre o VGBL interrompeu o fluxo de novas contribuições, gerando instabilidade regulatória e incertezas em decretos, Legislativo e Judiciário, que dificultam a operação das empresas do setor.“A Fenaprevi segue convicta de que o IOF no VGBL deveria ser revogado e o produto incentivado por ser o instrumento de proteção previdenciária mais inclusivo do mercado ao atender a todas as modalidades de emprego, principalmente considerando o contexto demográfico, de envelhecimento da população, as novas relações do mercado de trabalho e os desafios do sistema de previdência pública”— diz Edson Franco, presidente da FenapreviVale lembrar que um decreto de maio deste ano passou a cobrar 5% de IOF sobre aportes em planos de VGBL que ultrapassem os R$ 300 mil em uma mesma seguradora em 2025 e até R$ 600 mil em 2025 (somados todos os planos em diferentes entidades). O decreto foi derrubado pelo Congresso na sequência e restituído em 16 de julho por decisão do ministro Alexandre de Moraes do STF (Supremo Tribunal Federal).Quais são os impactos para o investidor?Para os especialistas consultados pelo InfoMoney, a mudança exigiu dos investidores uma reavaliação das estratégias e um olhar mais apurado para o planejamento estratégico, considerando o caráter de longo prazo da previdência.Na Monte Bravo, Camila Iensen, sócia e head de Sales, conta que o primeiro passo após a medida foi acalmar os clientes da assessoria de investimentos e planejar aportes dentro do limite anual de R$ 300 mil, adequando a alocação dos recursos.“Muitos investidores já possuem patrimônio consolidado e precisam dividir aportes entre seguradoras, ajustar portfólios e compor estratégias com outros produtos, como seguros individuais, garantindo proteção de patrimônio sem perder benefícios fiscais.”— explica Camila Iensen, da Monte BravoSegundo Camila, a situação também abriu espaço para o mercado oferecer curadoria e gestão mais ativa nos fundos de previdência. “Os clientes precisam entender seus objetivos de médio e longo prazo e organizar seus aportes de forma estratégica” diz.Para Amâncio Paladino, diretor da XP Vida e Previdência, com a tributação, o tempo necessário para que o rendimento do VGBL supere o imposto pode chegar a seis anos ou mais. Segundo Paladino, as simulações feitas pela XP consideram uma rentabilidade de 14% ao ano e esse prazo pode aumentar se a Selic, atualmente em 15%, cair.“A partir do momento em que o IOF voltou, a entrada de novos recursos caiu entre 70% e 80%”, comenta, ressaltando que a seguradora até parou de aceitar aportes acima de R$ 300 mil por dificuldade em operacionalizar, na prática, a cobrança do IOF. Ele ainda destaca que clientes que usavam a previdência como ferramenta de planejamento sucessório passaram a reavaliar suas estratégias.O movimento de mudança de planos já vem ocorrendo. Beto Saadia, diretor de investimentos da Nomos, conta de um cliente que pensou em fazer um plano de previdência para o pai mudou de ideia.“Tive um cliente que precisava fazer uma previdência para o pai, com valores muito altos, e não vai fazer mais. Vai aportar os R$ 600 mil e vai buscar outros fundos de investimentos.”— conta Beto Saadia, da Nomos Investimentos Leia também: IOF de 5% muda o jogo no VGBL e deve forçar a alta renda a buscar alternativasSaadia ressalta que a medida do IOF buscou coibir o uso do VGBL apenas como instrumento de sucessão patrimonial, em vez de poupança de longo prazo, o que beneficiava a sucessão, mas fugia do propósito previdenciário. Contudo, a limitação de aportes impacta não apenas os super ricos, mas também pessoas comuns que fariam aplicações de valores elevados de forma única. Gleisson Rubin, diretor de Previdência da MAG e do Instituto de Longevidade, exemplifica em números o impacto da medida em quem apenas vendeu um patrimônio ou recebeu uma herança.O exemplo considera uma situação hipotética de uma pessoa que vendeu uma casa ou recebeu uma herança de R$ 1 milhão, já projetando para a realidade de 2026. Pela regra vigente, até R$ 600 mil o aporte está isento; acima desse valor, haverá cobrança de 5% de IOF. No exemplo, isso significa 5% sobre os R$ 400 mil que ultrapassam o limite, resultando em R$ 20 mil. “É muito? É muito. Mas o problema não está só aí”, explica Rubin. Ele destaca que esses R$ 20 mil deixam de compor a reserva do VGBL, impedindo que o investidor usufrua dos benefícios de uma aplicação de longo prazo sobre esse montante.A simulação simples, assumindo um rendimento conservador de 4% ao ano por 20 anos, mostra que nesse cenário, os R$ 20 mil deixariam de se transformar em mais de R$ 100 mil — ou seja, não se trata apenas de uma perda de 5% sobre o valor excedente, mas de privar o investidor de um potencial ganho significativo ao longo do tempo.Leia mais: PGBL ou VGBL: entenda as diferenças e o que avaliar para escolherO que vem por aí?A Fenaprevi destaca que a manutenção do IOF no VGBL gera impactos especialmente para quem depende do produto como complemento à previdência pública, em um país com envelhecimento populacional crescente. A expectativa do setor é que medidas de incentivo e flexibilização possam ser discutidas para ampliar a atratividade do produto.Para Rubin, da MAG, outro desafio que desponta para 2026 é como será operacionalizada a contabilização de todos os aportes por indivíduo em diferentes instituições. Vale lembrar que o IOF de 5% será cobrado de quem ultrapassar a soma de R$ 600 mil em aportes considerando planos de um mesmo indivíduo em todas as seguradoras e entidades.“Não existe uma integração de base de dados entre as entidades. Como é que a entidade A vai saber quanto que o cliente tem na entidade B e como é que a entidade B vai saber quanto que ele tem na entidade C e assim por diante. O que temos hoje sobre isso é um grande ponto de interrogação”, pontua.The post Previdência perde R$ 3,1 bi em junho com IOF e cautela; veja impacto para investidor appeared first on InfoMoney.