Nenhum clichê corporativo é mais banal do que a ideia de que vivemos numa era de incerteza. Relatórios anuais e discursos executivos repetem que a vida nunca foi tão imprevisível, que as crises nunca atingiram com tanta força e frequência.Estes relatórios podem ser surpreendentes para humanos que passaram pela peste bubónica, eras glaciares, guerras mundiais ou colonialismo. De acordo com um artigo do The Economist, a verdade é que todos os gestores do mundo tiveram de lidar com eventos inesperados nos últimos anos e que a gestão de crises é um grande teste à coragem de um líder. Mas quais os passos a seguir para gerir uma crise da melhor forma? Ser melhor gestor implica mais preparaçãoUma forma de pensar sobre lidar bem com crises consiste na certeza de que os gestores devem resistir aos seus instintos naturais. Uma tentação óbvia, apesar de toda a retórica, é adiar a preparação para o desastre. Por exemplo, os registos de riscos de uma empresa não estariam completo sem mencionar os ciberataques. No entanto, um quarto das grandes empresas britânicas ainda não possui um plano formal de resposta a incidentes no caso de um ataque.Os cenários simulados e os workshops de planeamento não têm realmente como objetivo prever o futuro. São uma forma de aprimorar o pensamento, de pressionar as organizações a articular os seus princípios orientadores, de criar os alicerces a partir dos quais uma resposta real à crise se materializará.Paul Ingram, da Columbia Business School, conta no artigo do jornal britânico a história de um ex-aluno que elaborou vários cenários de crise na sua função de comandante de logística da Marinha dos EUA no Pacífico; taois planos incluíam um tsunami, um acidente nuclear e um terramoto. O facto de nenhum dos seus cenários prever que os três ocorressem ao mesmo tempo, como aconteceu no Japão em 2011, não tornou o exercício inútil. O planeamento não se trata de «desenvolver uma resposta completa», diz Ingram, mas sim «elementos que serão recombinados num padrão adequado ao inesperado». Menos estrangeirismos, mais estratégiaQuando uma crise ocorre, um segundo impulso é centralizar: os chefes criam centros de comando, formam task-forces e começam a usar termos como sitrep (abreviação do termo em inglês situation report). Mas, é da natureza das crises trazer para as organizações problemas novos e em rápida evolução. A experiência anterior conta menos; subir na hierarquia significa atrasos.Num artigo publicado em 2015, Eric Anicich, da Universidade do Sul da Califórnia, e os seus coautores, analisaram os resultados de mais de 5.000 expedições de alpinismo nos Himalaias. A conclusão foi que os alpinistas de culturas mais hierárquicas alcançaram mais cumes, mas também sofreram mais fatalidades. A explicação foi que a hierarquia permitia uma maior coordenação em circunstâncias normais, mas também significava que as pessoas eram menos propensas a expressar preocupações se achassem que as coisas estavam a correr mal. As soluções passam por soluções práticas, mas com os olhos no futuroSvein Tore Holsether, o chefe da Yara, uma empresa norueguesa de fertilizantes, é um defensor de uma abordagem descentralizada. A empresa passou muito mais controlo aos gestores locais para superar a fase inicial da pandemia da COVID-19 e descobriu que funcionava tão bem que se reorganizou de acordo com linhas regionais em maio de 2020.Holsether argumenta que essa estrutura voltou a servir a empresa no início de 2022, quando teve de responder a outra crise: a invasão em grande escala da Ucrânia pela Rússia. A Rússia era um grande fornecedor das matérias-primas utilizadas nos fertilizantes; a Ucrânia era um grande mercado de vendas. Os funcionários locais apressaram-se a alterar os contratos de aquisição, as operações das fábricas e os canais de distribuição para lidar com a situação; não foi necessário enviar tudo para Oslo para aprovação.Quando uma crise atinge, um terceiro instinto é concentrar-se em superar o problema imediato. Mas é aconselhável que os chefes olhem para o futuro pós-crise. Quando a pandemia impactou a marca Lime, cujas bicicletas elétricas verdes eram criticadas por bloquear calçadas, o seu chefe, Wayne Ting, enfrentou escolhas difíceis.Muitas pessoas aconselharam-no, por exemplo, a terceirizar a fabricação dos veículos da Lime para reduzir custos. Ele ignorou-os, porque fabricar bicicletas e scooters mais duradouras era fundamental para o sucesso a longo prazo da empresa e manter a produção interna era a melhor maneira de atingir esse objetivo. «O que quer que cortemos», diz, em relação a esse período, «não cortamos no essencial, porque então não teríamos nada para recuperar».Tornar as crises mais navegáveis resume-se essencialmente a três eixos: planear, descentralizar e priorizar. E, apesar de também poderem parecer um clichê, estas devem ser as bases de qualquer gestor.O conteúdo Liderar na crise: um guia para os gestores aparece primeiro em Revista Líder.