O novo comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) trouxe, pela primeira vez, uma projeção de inflação para o início de 2027, indicando uma trajetória de queda. Assim, a atual diretoria do Banco Central pode encontrar incentivos para iniciar o ciclo de cortes na Selic antes que a inflação chegue à meta oficial, de 3% ao ano. A leitura é do Felipe Miranda, CIO e estrategista-chefe da Empiricus Research, após a decisão desta quarta-feira (30), que manteve a taxa básica em 15% ao ano.“O BC quer claramente nos indicar [no comunicado] que só vai cortar o juro em 2026”, afirmou Miranda no Giro do Mercado especial da Super Quarta. Para ele, a autoridade monetária reforçou a postura de cautela.No mesmo comunicado, o Copom apresentou, pela primeira vez, a sua projeção para inflação no primeiro trimestre de 2027. O BC espera que o IPCA esteja em 3,4% em 12 meses ao fim do período. A projeção anterior feita para o quarto trimestre de 2026 era de 3,6%. Isso indica que a autoridade trabalha com um cenário de trajetória descendente para a inflação.SAIBA MAIS: Descubra o que os especialistas do BTG estão indicando agora: O Money Times reuniu os principais relatórios em uma curadoria gratuita para você“O BC está louquinho para cortar. Ele tem uma orientação historicamente mais dovish, sempre que possível ele corta. Mas, como dizem os economistas, é data dependent”, completou.Miranda afirma que não concorda com a antecipação de tendências feita pelo Banco Central para o juros, ao apontar a manutenção dos juros por “período bastante prolongado”. E não descarta corte de juros ainda esse ano. “Se tivermos algo parecido com a desaceleração de dezembro de 2024, com câmbio comportado, inflação sob controle e atividade doméstica mais fraca, é possível antecipar o que está previsto”, disse.Efeito tarifasLogo no começo do comunicado, o Banco Central dá uma ênfase maior aos riscos trazidos pela política tarifária colocada em prática por Donald Trump. Para Miranda, com o comunicado do governo dos Estados Unidos do adiamento da entrada em vigor das tarifas para o dia 6 de agosto, e uma lista grande de exceções, houve uma melhora no cenário.“Antes tínhamos um cenário de muitíssima incerteza, e agora temos só muitas incertezas. Para o mercado financeiro, a situação melhorou. Parecia que todos os produtos seriam taxados em 50%, o Brasil poderia retaliar, haveria crise diplomática. Agora, em produtos relevantes, teremos tarifas maiores só para café e carne”, afirma.Para Miranda, o BC poderia comunicar ao mercado um cenário mais benéfico para a inflação, já que as restrições para exportar alguns alimentos para os EUA levaria a um aumento na oferta doméstica.“Mas eles fizeram o contrário. Dizem que em um momento de incertezas no cenário internacional, é melhor adotar uma postura de maior cautela, mesmo em um cenário de juros já altos”.Lista de tarefasAinda no cenário externo, Miranda enxerga uma variável-chave que pode destravar cortes antecipados no Brasil: o Federal Reserve (Fed). Se o banco central dos Estados Unidos confirmar o início do ciclo de redução de juros ainda neste semestre, o ambiente para países emergentes tende a melhorar, com menor pressão sobre o câmbio.“Quando o Fed corta juros, o dólar global perde força, o fluxo para emergentes melhora e o BC brasileiro ganha conforto para reduzir a Selic sem medo de desancorar o câmbio”, explicou.No entanto, ele lembra que existe uma série de tarefas que o governo brasileiro precisa cumprir para que o BC consiga efetivamente baixar os juros.“O BC só vai ganhar espaço para cortar juros de forma consistente quando houver um mínimo de confiança de que o fiscal está sob controle”, afirmou. Segundo ele, cada nova frustração de arrecadação ou aumento de despesas pressiona as expectativas de inflação via câmbio, já que investidores exigem prêmio maior para financiar a dívida pública.Miranda lembrou que a dívida bruta do governo já está elevada, e que a falta de avanço em reformas ou medidas concretas de controle de gastos deixa o ambiente mais sensível. “O Brasil vive de confiança; se o fiscal sair do trilho, o dólar dispara e o BC fica refém”, completou.O calendário eleitoral também deve pesar na estratégia do Copom. Para o estrategista, o BC quer atravessar 2025 reforçando sua credibilidade, para chegar a 2026 — ano de eleições presidenciais — com a política monetária blindada contra pressões políticas.“Qualquer corte precipitado em um ambiente de incerteza pode ser interpretado como leniência com a inflação. Eles querem entrar no ano eleitoral com um histórico de prudência, para que ninguém acuse o BC de ter cedido a pressões”, avaliou.Ele reforça que esse comportamento é típico de autoridades monetárias em anos que antecedem disputas presidenciais: a prioridade é preservar reputação e evitar ruído político.Ainda no cenário eleitoral, Miranda diz que é cedo para traçar um cenário sobre a força que o presidente Lula ganhou após a confirmação das tarifas impostas por Trump.“As pesquisas mostram que o bolsonarismo perdeu mais, na comparação com o ganho de popularidade do Lula. Essa composição pode abrir espaço para um candidato de centro-direita, como Tarcísio (de Freitas, governador de São Paulo) ou Ratinho Jr. (governador do Paraná).LEIA TAMBÉM: Quer saber onde investir com mais segurança? Confira as recomendações exclusivas do BTG Pactual liberadas como cortesia do Money Times