Alvo da operação da Polícia Federal que investiga desvio de recursos públicos oriundos de emendas parlamentares destinadas à realização de jogos digitais, Adriano Marrocos, nome conhecido da política brasiliense, volta aos holofotes. Em decisão do ministro Flávio Dino, que autorizou a atuação da PF contra a Associação Moriá, Marrocos aparece como “lobista” ligado ao senador da República pelo Distrito Federal, Izalci Lucas, que teria atuado para subir valor de destinação de emenda parlamentar de R$ 732 mil para, pelo menos, R$ 9,4 milhões.Marrocos é sócio majoritário de uma das empresas, a Alpha Tech, cujo escritório de contabilidade – Marrocos Serviços Contábeis – atende a Moriá. Ao STF, a Polícia Federal o aponta como “importante promotor de lobby junto a parlamentares”. Diz, ainda, que “ele mantém uma relação próxima com o Senador Izalci Lucas, responsável pela emenda parlamentar que financiou o TF 942706, cujo valor aumentou de R$ 732.046,00 para R$ 9.409.011,00”.O lobista foi contemporâneo de partido do senador Izalci Lucas, quando foi filiado ao PSDB-DF, que era comandando pelo parlamentar. Marrocos e Izalci, segundo consta de investigação da PF e da CGU, “nutrem uma relação bastante próxima”. Em 2014, disputou as eleições para deputado federal. Em 2022, Marrocos candidatou-se a deputado distrital por outro partido: o PSD.Ao analisar os dados da emenda parlamentar destinada por Izalci Lucas, a CGU identificou que, originalmente, a destinação trazia dotação muito inferior, de apenas R$ 732.046,00. “Todavia, no relatório de execução orçamentária das emendas parlamentares de Izalci Lucas à Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2023, observou-se que a dotação subiu para R$ 9.409.011,00”, informou a PF. Leia também Grande Angular Decisão de Dino aponta organização criminosa em ONG que recebeu verba de parlamentares do DF Grande Angular A ligação entre dono de empresa e ONG investigada por desvio de emenda Grande Angular Saiba quais parlamentares enviaram emendas para associação alvo da PF Fabio Serapião CGU viu fraude de R$ 13,2 mi em associação que recebeu emendas no DF O Portal da Transparência do governo federal revela que quatro entidades foram beneficiadas com repasses dessa emenda parlamentar de Izalci, sobretudo a Moriá, destinatária de R$ 7,5 milhões, cujos empenhos foram efetuados entre maio e julho de 2023.“É forçoso inferir que houve uma interlocução direta com o congressista durante esse interstício, em favor da destinação de recursos à entidade investigada. Ainda, nessa linha de investigação, a conclusão mais lógica é de que Adriano provavelmente fez as vezes de lobista junto ao referido congressista, dados os indícios de intervenção no encaminhamento da emenda parlamentar”, diz trecho da representação da Polícia Federal, lastreada em relatório de auditoria da CGU e nota técnica.A CGU ressalta que Izalci foi o responsável pela emenda parlamentar que financiou convênio de maior orçamento executado até o momento. Há, segundo a CGU encontros públicos entre Izalci e Marrocos poucos meses antes da celebração do Termo de Fomento entre a Moriá e o Ministério do Esporte para realização dos JEDIS no DF.Ainda segundo o levantamento que embasou decisão de Flávio Dino, em “potencial contrapartida espúria, empresas vinculadas a Marrocos e à sua esposa foram contratadas pela Moriá, de maneira claramente fraudada e direcionada – o que pode ter representado uma contrapartida pelos serviços de lobby prestados”, diz o documento.10 audiênciasO relatório da PF mostra que, em ao menos dez audiências públicas ou sessões parlamentares solenes requeridas por Izalci Lucas nos últimos 14 anos, Adriano Marrocos participou ou fez pronunciamentos.Em nota divulgada nesta terça, antes da quebra do sigilo da decisão de Dino, Izalci havia declarado por meio de nota que “reforça seu compromisso com a aplicação eficaz e transparente do dinheiro público. Por isso, cancelou o repasse do valor da emenda parlamentar que seria destinado à Associação Moriá, um dos alvos da operação”.O senador disse que o Jogos Educacionais Digitais do Distrito Federal (Jedis-DF) é um projeto de iniciativa da Associação Moriá, realizado em parceria com o Instituto Federal de Brasília (IFB) e o Serviço Social do Comércio (Sesc). O Jedis-DF faz parte do programa “Profissões do Futuro”, executado pelo Ministério do Esporte.Sem sigiloDecisão do ministro Flávio Dino, do STF, que autorizou operação da Polícia Federal em desfavor da Associação Moriá leva em consideração as suspeitas dos crimes de peculato e organização criminosa. A PF apura desvio de recursos públicos oriundos de emendas parlamentares destinadas à realização de jogos digitais.Conforme revelou o Metrópoles na Coluna Grande Angular, a Associação Moriá recebeu R$ 53 milhões de parlamentares do Distrito Federal em dois anos. A entidade, chefiada por um ex-cabo do Exército, um motorista e uma esteticista, levou quase R$ 46 milhões para um programa que visava ensinar crianças e adolescentes a jogar os games Free Fire, Valorant, LoL, Teamfight Tactics e eFootball.Dino, na decisão que teve o sigilo derrubado nesta quarta-feira (30/7), ressalta que a PF, por meio de levantamento da Controladoria Geral da União (CGU) “consolidou resultados bastante densos no sentido da malversação e da aplicação antieconômica dos recursos destinado”.Veja a hipótese criminal sobre o caso: Peculato: desvio de R$ 12.807.160,79 em recursos de emendas parlamentares federais através da fraude na execução dos termos de fomento.Organização criminosa: atuação coordenada e estruturada para obter vantagens financeiras dos crimes de peculato.Manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR): a PGR se manifestou favorável ao deferimento das medidas cautelares, destacando a imprescindibilidade das providências para o avanço das investigações e a proteção dos recursos públicos.Medidas de Dino: a decisão deferiu todos os pedidos cautelares formulados pela Polícia Federal, por serem consideradas adequadas, necessárias e proporcionaisA investigação aponta irregularidades na execução de quatro Termos de Fomento (TF) de Jogos Estudantis Digitais (Jedis), firmados entre a Associação Moriá e o Ministério do Esporte entre 2022 e 2023A CGU apontou que, em um dos contratos, “foram executados em valores de 315% mais caros que os valores executados” em outro no que se trata de locação de computadores gamers, que não ficam para o Estado.Segundo apontamento da CGU, aproximadamente 90% dos recursos públicos federais recebidos pela Moriá foram redestinados a outras pessoas jurídicas ou físicas para a execução dos eventos.“A própria entidade assume que não dispõe de funcionários ou pessoas capacitadas para execução dos serviços vinculados à execução desses eventos”, diz a decisão.Além disso, segundo a decisão, “há fortes indícios de falsificação de alguns documentos, com a aposição fraudulenta de assinaturas”.ParlamantaresEm dois anos, de 2023 a 2024, a Associação Moriá foi indicada para receber R$ 53 milhões de parlamentares do Distrito Federal.Do valor total, R$ 8 milhões já foram efetivamente pagos: R$ 7,5 milhões enviados pelo senador Izalci Lucas (PL-DF) e R$ 500 mil da deputada distrital Paula Belmonte (Cidadania). Os parlamentares não foram alvo da operação.Deputados e senadores de Alagoas, Acre, Espírito Santo e Rio de Janeiro também destinaram emendas à associação. Além do custeio do programa que ensina jovens a jogarem games como LoL e Free Fire, a Associação Moriá foi escolhida para executar projetos de cursinho do Enem, de combate à dengue, de empoderamento feminino e para apresentações musicais.Veja quem são os autores das emendas individuais:ex-deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC): R$ 9,8 milhões;senador Izalci Lucas (PL-DF): R$ 7,5 milhões;ex-senadora Rose de Freitas (MDB-ES): R$ 5 milhões;deputado federal Fred Linhares (Republicanos-DF): R$ 4,9 milhões;ex-deputado federal Pedro Augusto (PP-RJ): R$ 4,7 milhões;deputado federal Gilvan Maximo (Republicanos-DF): R$ 1,9 milhão;deputada distrital Paula Belmonte (Cidadania-DF): R$ 500 mil;ex-senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL): R$ 400 mil; edeputado federal Prof. Reginaldo Veras (PV-DF): R$ 400 mil.Os repasses já realizados e que estão em fase de execução ou de prestação de contas são referentes a uma das emendas do ex-deputado Pedro Augusto (R$ 4 milhões), a uma emenda da ex-deputada Perpétua Almeida (3,1 milhões), e às emendas integrais do senador Izalci Lucas e da deputada Paula Belmonte. As demais não foram pagas ainda.