Se você precisava de mais um motivo para dar seus passos diários, a ciência acaba de te dar um. Um novo estudo mostra que caminhar todos os dias pode reduzir o risco de declínio cognitivo — especialmente entre pessoas com predisposição genética para a doença de Alzheimer.Quase 3.000 participantes, com idades entre 70 e 79 anos, relataram seus hábitos diários de caminhada ao longo de 10 anos, segundo uma pesquisa que será apresentada nesta terça-feira (29) na Conferência Internacional da Associação de Alzheimer. Dia dos Avós: laços entre gerações fortalecem saúde mental na velhice Alzheimer: a importância da avaliação precoce dos sinais iniciais do quadro Problemas de memória? Veja 5 dicas para se lembrar do que é importante Aqueles que mantiveram ou aumentaram seus níveis de caminhada ao longo dos anos apresentaram melhorias mais significativas na velocidade de processamento e na função executiva do cérebro.Os benefícios da caminhada foram especialmente visíveis entre os que têm predisposição genética para desenvolver Alzheimer, de acordo com o estudo preliminar, que ainda não foi revisado por pares nem publicado em revista científica.“Sabemos que o comportamento sedentário tende a aumentar com a idade, enquanto a atividade física diminui”, afirmou a autora sênior do estudo, Dra. Cindy Barha, professora assistente de cinesiologia na Universidade de Calgary, em Alberta.“Por isso, recomendamos reduzir o tempo sentado introduzindo pequenas caminhadas ao longo do dia, entre os períodos em que for necessário ficar sentado.”Como funciona a doença de Alzheimer?A doença de Alzheimer é uma forma grave de demência, que se acredita ser causada pelo acúmulo de placas nocivas no cérebro. Essas placas interferem na comunicação entre os neurônios, o que eventualmente leva à morte dessas células nervosas, explicou Barha.À medida que mais células nervosas morrem, pessoas com Alzheimer podem desenvolver perda progressiva de memória, confusão, mudanças de personalidade e declínio físico. Com o tempo, a doença pode ser fatal — e, até o momento, não há cura conhecida.Acredita-se que a genética tenha um papel importante no desenvolvimento da doença. Em particular, genótipos chamados APOE afetam o metabolismo das placas e de outras gorduras no sangue. Uma variação específica, o APOE4, dificulta a eliminação dessas placas pelo cérebro e está associada a um risco maior de declínio cognitivo.Cerca de 15% a 25% da população possui essa versão do gene APOE, e a única maneira de saber é por meio de um teste genético, segundo dados dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA.A conexão mente-corpoEmbora o novo estudo não tenha seguido um regime de caminhada padronizado, Barha recomenda caminhar várias vezes ao dia para interromper o comportamento sedentário e manter esse hábito de forma consistente ao longo dos anos, como forma de prevenir o declínio cognitivo.“Precisamos de mais pesquisas para determinar quantos passos seriam realmente necessários, mas, de forma geral, mais é sempre melhor”, afirmou. “Os próximos passos incluem descobrir a quantidade mínima de caminhada ideal para diferentes grupos, como mulheres versus homens, ou pessoas com o gene APOE4 versus aquelas sem essa variante.”Um estudo de 2022 descobriu que até mesmo pessoas que caminhavam cerca de 3.800 passos por dia — em qualquer ritmo — reduziram o risco de demência em 25%.O que pode estar acontecendo entre o cérebro e o restante do corpo? Especialistas têm várias teorias.Uma delas é que o exercício físico regular estimula o corpo a produzir uma proteína chamada fator neurotrófico derivado do cérebro, ou BDNF — comparada a um “fertilizante” para o cérebro, pois ajuda no crescimento de novas células e na formação de novas conexões neurais, explicou Barha.“Acreditamos que proteínas liberadas pelos músculos viajam até o cérebro e, ao atravessarem ou agirem na barreira hematoencefálica, iniciam uma reação que, eventualmente, leva ao aumento dos níveis de BDNF dentro do cérebro”, disse ela.Outra teoria é que o exercício físico ajuda a reduzir a neuroinflamação, um sintoma comum da doença de Alzheimer.O cérebro envia células imunológicas chamadas micróglias para atacar o acúmulo de placas, mas isso pode ter um efeito contrário, explicou a Dra. Christiane Wrann, professora associada de medicina no Centro de Pesquisa Cardiovascular do Massachusetts General Hospital e na Harvard Medical School.A inflamação crônica pode fazer com que as micróglias comecem a atacar também células cerebrais saudáveis, danificando as conexões do cérebro.“Quando você se exercita, na verdade fortalece o programa de expressão genética que as micróglias precisam para funcionar corretamente”, afirmou Wrann.Maior risco, maior benefício?Os pesquisadores ficaram surpresos ao descobrir que a caminhada trouxe maiores benefícios justamente para as pessoas com o gene APOE4, em comparação com aquelas que não o possuem. Para entender melhor esse fenômeno, mais estudos serão necessários — mas Barha já tem uma hipótese.“Antes do início do estudo, acreditamos que os portadores do gene APOE4 tinham mais espaço para evoluir cognitivamente, já que possivelmente já estavam apresentando algum grau de declínio cognitivo”, disse Barha. “Eles também tinham mais margem para demonstrar melhorias.”É possível que o próprio estudo tenha motivado os participantes portadores do gene APOE4 a caminharem mais do que faziam antes, desacelerando assim o ritmo do declínio cognitivo.“Esse é um exemplo claro de que nunca é tarde para começar a se exercitar”, afirmou Wrann. “Cada passo conta, e é muito melhor adotar uma rotina de exercícios que você realmente goste e consiga manter.”https://stories.cnnbrasil.com.br/saude/ia-pode-ajudar-a-prever-avanco-dos-sintomas-de-alzheimer-mostra-estudo/