Silent Hill F é grotesco, mas estranhamente convidativo | Primeiras Impressões

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Nesta semana, participei de um teste exclusivo de Silent Hill F, o novo jogo de terror da Konami. Durante o evento, pude jogar cerca de cinco horas da campanha, o suficiente para ter uma boa ideia do que esperar quando o título chegar ao mercado. Previsto para setembro de 2025, o novo capítulo foi anunciado há três anos, durante o evento que marcou a retomada da franquia — chamando atenção com um teaser enigmático que rapidamente conquistou os fãs.Antes de mais nada, caso não se lembre, vale recapitular a proposta de Silent Hill F. Tratando-se de um jogo próprio, ou seja, fora do cânone principal, o título explora as premissas clássicas da franquia sob uma nova ótica. Tradicionalmente, todos os jogos de Silent Hill se passam na cidade de mesmo nome, situada nos Estados Unidos – ou, em alguns casos, nos distritos vizinhos. Desta vez, porém, a misteriosa neblina chega à pequena cidade japonesa de Ebisugaoka, onde ocorrerá toda a trama.Ebisugaoka, a Silent Hill japonesa.Mais do que apenas uma mudança de ambientação, Silent Hill F também marcará a primeira vez em que seus elementos clássicos serão utilizados em um contexto inteiramente japonês. No passado, os títulos da franquia trouxeram a percepção do terror no Japão para a cultura norte-americana, incluindo a direção de arte e motivação dos personagens. Contudo, durante a evolução da franquia, os jogos tornaram-se cada vez mais “ocidentais”, e perderam parte da essência nipônica que garantia o charme dos primeiros quatro títulos.Dessa maneira, embora soe estranha para muitos fãs, a proposta de Silent Hill F permite testar a flexibilidade dos traços mais marcantes da franquia, justamente no país em que foram concebidos. Por outro lado, a cidade norte-americana entrou no imaginário comum do mundo dos jogos, e se tornou renomada pelo seu charme sombrio. Pensando nisso, para garantir que a nova ideia fosse bem executada, a Konami não poupou esforços e trouxe alguns nomes conhecidos para o projeto, incluindo Akira Yamaoka, responsável pela trilha sonora dos primeiros jogos.Ebisugaoka evoca sentimentos da Silent Hill original.No entanto, o destaque fica para Ryukishi07, autor do mangá de estrondoso sucesso chamado “Quando as Cigarras Cantam” (Higurashi no Naku Koro ni). Apesar de não ser tão popular pelas terras brasileiras, Ryūkishi é altamente conceituado no Japão, sendo conhecido por suas histórias macabras de terror. Justamente, ele também é o responsável pela trama de Silent Hill F, além de também ter sugerido a cidade que serviu de inspiração para a fictícia Ebisugaoka – Kanayama, localizada na prefeitura de Gifu.Para completar, a trama de Silent Hill F se passa durante a década de 1960, situada em meio ao período Showa. Naquele momento, o Japão passava por um período de austeridade, com um crescente conservadorismo após os eventos da Segunda Guerra Mundial. Além de trazer uma ambientação atípica para a representação do país na mídia, o contexto histórico também ampara a psicologia e costumes dos personagens.Japão no período Showa. (Fonte: Cultura Japonesa / Reprodução)Porém, mesmo diante das melhores intenções e de nomes renomados na franquia, será que Silent Hill F conquistará os fãs de longa data? A seguir, você confere o que esperar da trama, os detalhes da jogabilidade, e as mecânicas inéditas na franquia. Neste teste, a pedidos da Konami, tanto a dificuldade de combate quanto dos códigos foram configurados para o modo “Narrativa”. Tratando-se da versão de PlayStation 5, as imagens e vídeos a seguir são as únicas autorizadas, e foram disponibilizadas pela empresa.Silent Hill F e a memória de uma cidade que se esqueceSilent Hill F começa em um tom frio, com a protagonista Hinako Shinzumi relembrando memórias felizes em outro dia ruim. Após discutir com seus pais, ela decide encontrar os amigos no centro da pequena Ebisugaoka. No trajeto, logo de cara, a atmosfera não deixa o jogador esquecer qual franquia está vivenciando – há uma neblina pesada, um tempo fechado e um silêncio desconfortável no ar. Eficaz, o prólogo funciona como uma rápida imersão no novo universo, e não demorou para conquistar minha atenção.Adiante, é possível explorar um pouco dos arredores, conhecendo mais sobre o passado da região. Ebisugaoka é uma cidade que cresceu após o desenvolvimento de uma mina de carvão, e tem fortes raízes religiosas, mas sua economia está em aparente decadência. Neste momento, algo que me chamou a atenção foi justamente como a religião é abordada, em contraste à tradição da franquia. Nos jogos passados, a trama abordava aspectos sobrenaturais através de cultos e conspirações secretas; em Silent Hill F, os ritos religiosos – e potencialmente sobrenaturais – fazem parte do cotidiano local.Ebisugaoka aparenta estar em declínio econômico.Essa mudança, em particular, funciona muito bem com o contexto cultural do período Showa, ainda distante do Japão moderno. Naquele momento, o país passava por um grande desenvolvimento econômico, mas o interior acompanhava em ritmo lento. Isso favoreceu, por exemplo, a manutenção de costumes e rituais locais – como é o caso de Ebisugaoka, e seu respeito à divindade-raposa Inari Okami, ou Oinari.Direto da colina repleta de árvores para as ruas apertadas do centro, não demora para notar que há algo de errado na cidade. Aparentemente, as pessoas desapareceram, e a neblina parece cada vez mais opressiva. Ruas de Ebisugaoka.Ao finalmente encontrar seus amigos – Rinku, Shu e Sakuko –, Hinako tem um pressentimento ruim e, pouco depois, é atacada por uma presença na névoa. Em meio às vielas apertadas, o grupo foge do que parece ser um emaranhado de raízes vermelhas, que corrompem e mudam tudo que é orgânico no caminho.A partir desse momento, o objetivo do grupo é fugir de Ebisugaoka, onde passaram a maior parte de suas vidas.O combate e as novas mecânicas de Silent Hill FEvitando spoilers quanto à trama, falaremos agora sobre as mecânicas de Silent Hill F, que estão um tanto diferentes dos primeiros jogos. Possivelmente o que mais chamou atenção no material de divulgação, o sistema de combates também é a maior particularidade desse título.Diferente dos capítulos anteriores, Silent Hill F é o primeiro título na franquia a disponibilizar apenas armas corpo-a-corpo para se defender. Além da mudança também promover um maior senso de perigo, já que força o jogador a encarar ameaças com maior proximidade, também há maior imersão no contexto – já que a presença de munição seria bastante escassa na cidade.Combate de Silent Hill F pode ser intenso.Para apimentar as coisas, todas as armas possuem uma barra de durabilidade, e são destruídas quando ela se esgota. Assim, o jogador deve escolher com cuidado quais batalhas quer encarar, e quais objetos quer carregar – é possível andar com até três, incluindo canos, facas e foices.No combate, Hinako é rápida, e consegue realizar esquivas e contra-atacar inimigos atordoados. Contudo, cada movimento deve ser bem pensado, já que custa um pouco da barra de estamina, de maneira bastante similar aos souls-like. Há indicadores visuais para ajudar o jogador a se situar, mas são discretos, e chamam bem menos atenção do que no material de publicidade. Embora o combate esteja significativamente mais fluído, ele não diminui o fator de terror do título, e também não destoa do restante da franquia.Recursos são exibidos na hud à esquerda.Em detalhes, Silent Hill F justifica as capacidades físicas de Hinako sem muito rodeio. A jovem cresceu acostumada “a brincar como os meninos”, correndo livre desde nova, e por isso sempre se destacou nos esportes – diferente das demais colegas de turma. Enquanto isso não a torna uma guerreira hábil, é uma contextualização honesta e bastante plausível para seu desempenho diante das ameaças. A protagonista usa as armas de forma intuitiva, se esgota ao correr, e por vezes precisa até mesmo parar para tomar um fôlego.Junto do estado de saúde, o nível de estamina e a durabilidade das armas, os jogadores ainda terão que se preocupar com outro fator – a sanidade de Hinako. A cada golpe recebido, ou encontro com entidades poderosas, ela perderá sua estabilidade mental e sofrerá dano com o tempo. Esse “recurso” também funciona como um medidor de concentração, que quando carregado permite desferir ataques mais poderosos. Mas fique tranquilo, não há poderes especiais ou acima da realidade!Sistema de melhorias e progressãoEm Silent Hill F, os jogadores poderão evoluir as habilidades de Hinako de duas formas principais. Ambas envolvem a ofertar itens consumíveis ou colecionáveis, encontrados pelo cenário, em pequenos santuários espalhados pelo mapa. Exemplo de consumível que pode ser ofertado.Esses itens são convertidos em pontos de fé, que funcionam como uma moeda dentro do jogo. Com eles, é possível adquirir amuletos de efeitos variados ou melhorar atributos básicos – como vida, estamina e sanidade.Além disso, os santuários também funcionam como pontos de salvamento.O novo mapa e o diário de HinakoParte do motivo pelo qual entendemos o passado de Hinako tão bem é seu diário, que conta algumas de suas memórias e percepção dos personagens – além do progresso nos quebra-cabeças. As páginas e entradas são atualizadas a cada encontro relevante, trazendo um texto e uma bela ilustração para acompanhar. O sistema funciona como uma versão mais modesta do mapa de James, em Silent Hill 2 Remake, mas ainda possui seu próprio charme.Mapa de Silent Hill F.Por falar em mapas, Silent Hill F abandona a tradição de pegá-los logo no começo de cada região, e adota um sistema automático. Ao iniciar uma nova fase, basta abrir o menu, e será possível conferir um mapa do local que progride junto da personagem.As criaturas e o Outro MundoDesde seu material promocional, Silent Hill F promete explorar o limiar da beleza no horror. Embora a definição seja vaga, a prática funciona melhor do que a teoria. Começando pelos inimigos apresentados, até então, o título faz um misto elementos florais e de carne para os visuais, e entrega um resultado um tanto grotesco. A princípio, é difícil estabelecer uma aparente conexão do design das criaturas com os temas da campanha, no entanto, ele se manteve consistente durante as cinco horas jogadas.No mundo “normal”, afetado pela neblina e as raízes vermelhas, os inimigos são compostos de carne, flores e um corpo que lembra um boneco ou manequim. Sua movimentação é errática, e não segue um ritmo previsível, o que torna o combate um pouco mais interessante.Raízes vermelhas parecem orgãos ensanguentados.Falando um pouco do “Outro Mundo”, há uma grande diferença em Silent Hill F. Enquanto nos jogos anteriores essa dimensão paralela funcionava como uma versão “Infernal” de uma fase, neste capítulo ele assume a forma de um antigo palácio espiritual. Sua estética é inspirada nos templos japoneses antigos, explorando bastante a escuridão, a arquitetura e o jogo de sombras.Outro Mundo, de Silent Hill F.Embora seja suficiente para assustar os jogadores mais fracos do coração, o Outro Mundo de Silent Hill F não me conquistou. Até o momento jogado, sua progressão é relativamente linear, e traz consigo elementos muito mais fantasiosos para a jogabilidade. Nele, Hinako obtém armas únicas, indestrutíveis, e parece lidar com uma realidade parecida com um sonho – de modo, inclusive, a entrar e sair dela ao dormir e acordar.Hinako transita entre realidades ao dormir ou desmaiar.Talvez, esse Outro Mundo se revele mais infernal, mesmo à sua própria maneira, ao decorrer da campanha. Contudo, a forma com que progrediu, até então, lembra muito uma história paralela: de um lado, Hinako foge de Ebisugaoka, do outro, ela avança pelo Palácio Espiritual. Se antes a realidade alternativa provocava ansiedade, por ser ainda mais horripilante que a “normal”, desta vez não parece intrigar da mesma maneira.Certamente, é uma nova proposta para o Outro Mundo, e tem total liberdade para desenvolvê-la de forma original. Contudo, confesso que este fator, por vezes, me fez questionar se Silent Hill F não estaria se distanciando demais das premissas clássicas da franquia.Silent Hill F teve uma boa primeira impressão?Após anos sem lançamentos inéditos, Silent Hill F chega com uma proposta única. Para todos os efeitos, a sensação provocada é indiscutivelmente familiar para os fãs da franquia. Na verdade, indo um pouco além, tive a impressão de que o título resgatou um sentimento bastante particular em mim – de quando o PlayStation 2 reinava soberano com os jogos japoneses de terror.E sinto que isso não se deve a exatamente a um elemento, em específico, mas ao capricho dedicado no desenvolvimento. Silent Hill F não é um jogo de grandíssimo orçamento e, assim, exigiu talento para refinar sua apresentação e jogabilidade. Isso não apenas o torna mais autêntico, no sentido artístico da análise, mas também um produto mais honesto para o jogador final.Pontes quebradas estão de volta em Silent Hill F.Embora não seja a Silent Hill clássica, Ebisugaoka consegue evocar o sentimento estranho, mas convidativo, de solidão – sempre acompanhada de uma belíssima trilha sonora. Definitivamente, a ambientação é a parte mais interessante deste novo capítulo, trazendo uma estética misteriosa, bem contextualizada e criativa.A trama, embora apresentada de uma maneira bem diferente do habitual na franquia, é intrigante, e me manteve engajado durante toda a jogatina. Parte disso, é claro, se deve às atuações dos personagens principais, que contam com captura de movimento de alto nível.Por outro lado, nem tudo são flores. Quando visita o Outro Mundo, Silent Hill F parece mudar o ritmo de uma maneira um tanto abrupta. Até o momento em que joguei, a trama envolvendo a realidade alternativa parecia desconexa da principal, e exigiu curiosamente mais do que o esperado da minha suspensão da descrença. Tenho minhas teorias sobre isso, mas é cedo demais para abordá-las.Outro Mundo de Silent Hill F causa estranheza na primeira impressão.Assim, é seguro dizer que Silent Hill F é um excelente jogo, mesmo a partir das primeiras cinco horas. Contudo, também é possível prever que será divisivo, na medida em que não deve conquistar uma parte mais purista do público. De todo modo, como fã, fiquei muito interessado em terminar a campanha – que, a propósito, possui cinco finais diferentes.Até o lançamento de Silent Hill F, em 25 de setembro deste ano, resta aguardar mais novidades.O TecMundo agradece à Konami e ao JeffreyGroup pelo convite para a cobertura.