Quando alguém acessa o perfil de Val no Instagram, pode ver uma viagem recente de acampamento que ela fez com amigos, uma leva de nuggets de frango caseiros e alguns de seus memes favoritos. Mas o que não dá para ver: Val, de 22 anos, ficou noiva há nove meses do namorado com quem está há dois anos.Ela nunca fez um post sobre o pedido de casamento — e não pretende fazer. “Estamos felizes e contentes assim, vivendo nossa vida juntos de forma privada, sem ninguém espiando pela janela, por assim dizer”, afirma Val, que mora com o noivo em San Marcos, no Texas, e pediu à CNN para não divulgar seu sobrenome por questões de privacidade. Leia Mais Dia Internacional do Emoji: descubra quais são os mais usados no Tinder Solteiros estão menos satisfeitos com a vida sexual, diz pesquisa Dormir brigado faz mal? Nem sempre, segundo especialista Val faz parte de um número crescente de jovens adultos da Geração Z — grupo que vai dos adolescentes até os 28 anos — que estão optando por “relacionamentos discretos”, em que a vida amorosa — o lado bom e o ruim — permanece fora das redes sociais e longe dos olhos de amigos e familiares.É um retorno a um jeito antigo de se relacionar: encontros sem selfies, casamentos simples sem álbuns públicos de fotos e brigas sem indiretas nas redes. No TikTok, criadores que falam sobre preferir relacionamentos “discretos” ou “privados” acumulam milhares de visualizações. No Pinterest, buscas por “casamento no cartório” cresceram mais de 190% entre 2023 e 2024.Se o seu córtex pré-frontal se desenvolveu antes do surgimento do iPhone, você talvez revire os olhos. Mas, para uma geração criada nas redes sociais, rejeitar a pressão de postar é algo novo — e que, segundo especialistas, pode redefinir o futuro da intimidade.Como as redes sociais mataram o romanceA guinada da Geração Z em direção à privacidade vem, em parte, de um desconforto crescente com a forma como as redes sociais moldam — e distorcem — os relacionamentos amorosos, diz Rae Weiss, coach de relacionamentos da Geração Z que está cursando mestrado em Psicologia na Universidade Columbia, em Nova York.Um casal que parece ser o exemplo perfeito de relacionamento pode ostentar viagens luxuosas, encontros românticos impecáveis, roupas combinando e gestos grandiosos. Mas a Geração Z já está online há tempo suficiente para saber que isso tudo é uma encenação cuidadosamente montada.“Já não é segredo que, nas redes sociais, você só posta os melhores momentos da sua vida, os melhores ângulos, as melhores fotos, com filtros”, diz Weiss. “Os jovens estão percebendo que isso pode causar uma dissonância e insegurança quando o relacionamento deles não se parece com aquilo o tempo todo.”De fato, todos os relacionamentos têm momentos bagunçados, complicados e até entediantes — mas esses raramente viralizam (a não ser que o drama seja forte, claro). Isso pode levar algumas pessoas a medir o valor da própria relação com base em quão “instagramável” ela é, diz Weiss.Expor demais um relacionamento nas redes sociais, inclusive, já foi associado a menor satisfação geral e a um estilo de apego ansioso entre os parceiros, segundo um estudo de 2023.Adotar relacionamentos privados, então, é uma forma de a Geração Z rejeitar as pressões sufocantes de perfeição e valorizar demonstrações reais de afeto na vida cotidiana.“Há menos incentivo para tentar ‘acompanhar’ os posts dos outros”, diz Pamela Rutledge, diretora do Centro de Pesquisa em Psicologia da Mídia e professora emérita da Universidade Fielding, na Califórnia. “Isso pode proteger contra a inveja e as expectativas distorcidas ao comparar seu relacionamento com as versões públicas dos outros.”Val contou que já sentiu essa pressão de exibir a própria vida amorosa, mas acha que transformar seu noivo em um “santuário digital” seria forçado.“Parece que estou tentando provar algo, provar que nos amamos, quando a prova está toda ao nosso redor: nossos gatos, nossa casa e a vida que construímos juntos”, diz. “Ele não precisa me ver postando sobre ele para saber que eu o amo.”O que os outros não veem, eles não podem estragarJason, de 21 anos, que está com a atual namorada há quase um ano, mas não posta nenhuma foto com ela, admite que o principal motivo para não expor a relação é evitar o mesmo tipo de julgamento que seus amigos fazem com outros casais.“Não gosto da ideia de ser observado e comentado”, afirmaJason, estudante da Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá, que também pediu à CNN para omitir seu sobrenome. “Até parei de falar muito sobre relacionamento com alguns amigos, porque percebi que eles começam a ver sua parceira de forma diferente.”Para ele, não se trata de medo de ser envergonhado publicamente, mas da possibilidade de virar assunto em grupos de WhatsApp, mensagens privadas e investigações no Instagram.Ansiedade social não é novidade, mas para uma geração criada online, uma nova forma disso se tornou endêmica: o que Brooke Duffy, professora de Comunicação da Universidade Cornell, chama de “vigilância imaginada” — a sensação de estar sempre sendo observado e julgado por uma audiência invisível, normalizada pelo voyeurismo das redes sociais.“Postar sobre seu relacionamento significa abri-lo ao público e permitir que as pessoas examinem as imagens e analisem a comunicação entre o casal”, diz Duffy. “É claro que influenciadores estão sob uma lupa, mas descobrimos que isso também orienta como os jovens produzem conteúdo online.”O medo é que os outros não apenas vejam seu relacionamento — eles o examinem, investiguem e emitam julgamentos morais sobre você e seu parceiro. Esse barulho, real ou imaginado, pode afetar sua própria percepção sobre a relação, especialmente no início, diz Jillian St. Onge, de 26 anos.“Evitei compartilhar meu relacionamento nas redes e até com minha família, para ser sincera”, contou St. Onge, que mora em Nova York e está noiva. “Terminar um relacionamento já é difícil por si só, mas quando todo mundo sabe de tudo muito cedo, parece que você deve uma explicação até para desconhecidos. Ser intencionalmente reservada me ajudou a formar minha própria opinião e a focar em construir uma conexão profunda.”As épocas de postar indiretas durante brigas acabaram, segundo ela. Embora possa parecer bom desabafar publicamente, esse tipo de atitude é impulsiva e muitas vezes gera mais drama do que resolve.Apesar da consciência sobre o excesso de exposição, os membros da Geração Z ainda encontram formas criativas de compartilhar indiretamente. O chamado “soft launch” é uma delas — uma forma de mostrar que estão em um relacionamento sem revelar quem é o parceiro, explica Duffy.No Pinterest, há várias ideias para isso: dois pratos sobre a mesa, duas silhuetas contra uma parede vazia, dois pares de sapatos lado a lado.St. Onge, que posta vídeos do seu dia a dia com frequência, fez um soft launch cinco meses depois de começar a namorar seu atual noivo — o nível exato de privacidade que ela precisava.Jason também diferencia o que aparece no “feed” (onde os posts são permanentes) do que é postado nos “stories” (que somem em 24 horas).“Um story não tem o mesmo impacto comunicativo que algo postado no feed”, explicou Duffy. “É um momento passageiro, e por isso as pessoas se sentem mais à vontade para ultrapassar os limites do próprio perfil ou da sua ‘marca pessoal’.”“Privado, mas não secreto” — qual é a diferença?Do ponto de vista externo, privacidade e segredo podem parecer a mesma coisa, diz Lia Huynh, terapeuta familiar e de casais na Califórnia.“No entanto, a motivação é diferente”, afirma Huynh por e-mail. “Privacidade visa proteger, agir com cautela. Alguém que deseja privacidade não quer esconder o relacionamento, mas acha necessário protegê-lo.”O segredo, por outro lado, geralmente tem motivação egoísta, como vergonha ou constrangimento, e vem às custas do outro, segundo Huynh.Como, então, saber a diferença? Primeiro, ela recomenda que quem deseja manter a privacidade reflita sobre os próprios motivos.“É importante que a pessoa deixe claro que não tem vergonha do parceiro, nem está fazendo isso para manter outras opções em aberto”, diz. “É fundamental que ambos concordem sobre o que isso significa.”Weiss lembra que pode haver dificuldade na comunicação quando há expectativas diferentes — por exemplo, quando um parceiro valoriza mais a opinião do círculo social do que o outro.Também é importante ter uma ou duas pessoas de confiança fora do relacionamento para conversar em momentos difíceis, diz ela.“Sempre digo: ouça sua intuição… tudo se resume a identificar os seus valores. Qualquer desafio no relacionamento pode ser resolvido com base nesses valores”, afirma Weiss.De modo geral, para Rutledge, que estuda redes sociais desde que surgiram, os “relacionamentos discretos” são um movimento positivo na forma como os jovens conduzem a vida pessoal.“Temos visto mais jovens fazendo detox digital, vivendo o momento”, afirma Rutledge. “Não é obrigatório, mas pode ser revelador. Tudo que incentiva o uso mais intencional — e menos passivo — das redes sociais é um bom sinal.”Solteiros estão menos satisfeitos com a vida sexual, diz pesquisa