O enigma da Strategy com Bitcoin: Quando 2 + 2 = 5 e Wall Street aplaude

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Em um mundo onde a matemática financeira deveria ser tão confiável quanto a gravidade, a Strategy conseguiu algo que faria Newton revirar no túmulo: criou valor do nada. Ou pelo menos, é isso que parece à primeira vista. Um recente estudo acadêmico de pesquisadores da Universidade de Miami e Florida International University desvenda esse mistério moderno, revelando uma estratégia tão engenhosa quanto controversa.Para entender a magnitude do fenômeno, imagine que você possui uma casa avaliada em R$ 320 mil, mas consegue vendê-la por R$ 550 mil. A diferença de R$ 230 mil simplesmente… existe. Segundo as leis básicas da economia, isso deveria ser impossível – afinal, ninguém paga mais por algo do que ele vale, certo? Bem, aparentemente a Strategy não leu esse manual.A empresa, que começou como uma desenvolvedora de software e se transformou em uma espécie de “banco de Bitcoin“, apresenta exatamente esse paradoxo. Suas ações são negociadas por um valor significativamente superior ao de seus ativos tangíveis. É como se o mercado tivesse decidido que 2 + 2 = 5, e todos concordassem educadamente com essa nova matemática.A hipótese óbvia (que não funciona)A primeira explicação que vem à mente é a mais simples: deve ser impossível ou muito caro “apostar contra” as ações da Strategy. Afinal, se fosse fácil fazer short selling, os arbitradores já teriam corrigido essa distorção, não é mesmo? É como aquela piada do economista que vê uma nota de R$ 100 no chão e não a pega, porque “se fosse real, alguém já teria pegado”.Porém, os dados mostram algo surpreendente: o custo para fazer short nas ações da Strategy era, na verdade, extremamente baixo – cerca de 0,3% ao ano. Ou seja, era mais barato apostar contra a Strategy do que financiar um carro usado. Lá se vai a explicação mais óbvia.O verdadeiro truque: A arte da confusão financeiraAqui é onde a história fica interessante. Os pesquisadores descobriram que o segredo não está nas ações, mas na dívida. A Strategy desenvolveu uma estratégia que faria Maquiavel orgulhoso: se você não pode vencer o jogo, mude as regras.Em vez de emitir dívidas simples e transparentes, a empresa criou uma verdadeira sinfonia de complexidade financeira. Títulos conversíveis, ações preferenciais com diferentes níveis de senioridade, bonds com cláusulas que fariam um advogado chorar – tudo projetado para ser tão complicado que nem os analistas de Wall Street conseguem precificar adequadamente.É como vender um carro, mas em vez de dizer “é um Civic 2020”, você diz “é um veículo de transporte terrestre com propulsão por combustão interna, sistema de direção hidráulica opcional, com possibilidade de conversão em meio de transporte aquático mediante modificações estruturais não especificadas”. Tecnicamente correto, mas quem vai entender?A matemática da transferência de riquezaO resultado dessa estratégia é elegantemente simples: a Strategy consegue pegar dinheiro emprestado a taxas muito abaixo do mercado. Enquanto deveria pagar cerca de 5% ao ano, consegue financiamento próximo a 0%. Essa diferença não é um erro de cálculo – é dinheiro puro no bolso.E o que fazem com esse dinheiro “grátis”? Compram Bitcoin a preço de mercado. É como conseguir um empréstimo subsidiado para investir na bolsa, exceto que é perfeitamente legal e os credores não percebem que estão subsidiando a operação.O modelo matemático desenvolvido pelos pesquisadores mostra que essa “franquia de financiamento” – a capacidade de emitir dívida sobrevalorizada – é um ativo intangível valioso o suficiente para explicar a diferença entre o valor das ações e o valor dos ativos. É como ter uma licença para imprimir dinheiro, só que emitida pelo próprio mercado.As vítimas invisíveisMas toda mágica tem seu preço, e alguém sempre paga a conta. Neste caso, são os investidores conservadores que compram esses títulos complexos achando que estão fazendo investimentos seguros. Fundos de pensão, seguradoras, aposentados buscando renda fixa – todos se tornaram, involuntariamente, sócios da maior aposta em criptomoeda da história.É irônico: pessoas que jamais comprariam Bitcoin diretamente acabam financiando a maior acumulação de Bitcoin do mundo corporativo. É como se vegetarianos descobrissem que estão inadvertidamente financiando um churrasco gigante.A data de validade da mágicaO estudo revela algo crucial: essa estratégia tem prazo de validade. Os pesquisadores modelaram dois cenários: o estado “Hype”, onde investidores continuam comprando títulos complexos sem entender completamente os riscos, e o estado “Sober”, onde o mercado acorda para a realidade.A transição entre esses estados pode acontecer rapidamente – questão de dias, não meses. Quando isso ocorrer, a “franquia de financiamento” desaparece, e os R$ 230 bilhões de diferença podem evaporar mais rápido que água no deserto.É como uma festa onde todos estão se divertindo, mas ninguém quer ser o primeiro a admitir que a música parou.O dilema ético: Genialidade ou exploração?Aqui chegamos ao cerne da questão: a Strategy está sendo genial ou antiética? Por um lado, eles não estão mentindo sobre nada. Todos os números são transparentes, todos os riscos estão documentados (mesmo que em letras miúdas). É capitalismo puro: quem entende melhor o jogo, ganha.Por outro lado, eles estão claramente explorando a assimetria de informação e conhecimento. Criam produtos propositalmente complexos para confundir investidores menos sofisticados. É como vender um mapa do tesouro que você sabe que leva a lugar nenhum, mas tecnicamente você nunca mentiu sobre haver um tesouro.Conclusões abertas dos autoresOs pesquisadores apresentam suas descobertas de forma deliberadamente neutra, evitando julgamentos morais definitivos. Eles demonstram matematicamente que a aparente “sobrevalorização” das ações da Strategy pode ser explicada racionalmente através da capacidade da empresa de emitir dívida sobrevalorizada.Contudo, deixam implícita uma questão mais profunda: estamos testemunhando uma inovação financeira legítima ou uma sofisticada transferência de riqueza dos menos informados para os mais informados? A resposta, sugerem os autores, depende menos de julgamentos técnicos e mais de valores sociais sobre como queremos que nossos mercados funcionem.O estudo não oferece respostas definitivas, mas sim uma lente através da qual podemos examinar questões fundamentais sobre complexidade, transparência e equidade nos mercados financeiros modernos. Talvez essa seja, em si, a contribuição mais valiosa: transformar um caso aparentemente anômalo em um espelho que reflete as contradições e complexidades do capitalismo contemporâneo.Afinal, como disse certa vez um sábio economista: “Não é o que não sabemos que nos mete em problemas, é o que sabemos com certeza que simplesmente não é verdade.” No caso da Strategy, talvez nossa certeza sobre como os mercados deveriam funcionar seja exatamente o que precisa ser questionado.Sobre o autorAndré Franco é CEO da casa de análises cripto Boost Research e colunista do Portal do Bitcoin. Analista de criptoativos desde 2017, Franco possui vasta experiência no mercado e já atuou como diretor de Research do MB | Mercado Bitcoin.No MB, a sua indicação vale Bitcoin para você e seus amigos. Para cada amigo que abrir uma conta e investir, vocês ganham recompensas exclusivas. Saiba mais!O post O enigma da Strategy com Bitcoin: Quando 2 + 2 = 5 e Wall Street aplaude apareceu primeiro em Portal do Bitcoin.