A salvação do futebol brasileiro talvez não venha das federações, dos clubes ou dos árbitros, mas das marcas que o patrocinam. Num cenário em que a CBF se mostra incapaz de reformar sua estrutura de arbitragem e de garantir a credibilidade das competições, os patrocinadores se tornaram, na prática, a última força capaz de evitar a falência do negócio futebol.Essas empresas, que injetam milhões para associar sua imagem ao esporte, sustentam economicamente o espetáculo que hoje se vê mergulhado em crise de confiança. E é justamente por esse peso financeiro e simbólico que elas têm legitimidade para exigir mudanças profundas, não apenas na gestão da CBF, mas sobretudo na comissão de arbitragem e no modelo ultrapassado e ineficiente que insiste em comprometer resultados e reputações.O torcedor já entendeu que o problema não é o erro humano, mas o erro sistemático, institucionalizado e tolerado. Quando o árbitro falha, o VAR se omite e a comissão não reage, o prejuízo não é apenas esportivo: é econômico, reputacional e estratégico. E quem paga essa conta são os clubes, as marcas e o próprio torcedor, que começa a desistir de acreditar no jogo.A crise estrutural da arbitragem e o fracasso da CBFO futebol brasileiro convive com uma contradição intolerável: a CBF admite erros graves de arbitragem, mas nada muda. O reconhecimento público das falhas, feito em notas oficiais e entrevistas, em nada altera o resultado das partidas nem repara os danos causados aos clubes e torcedores.Um erro claro em campo pode decidir um jogo, e um jogo pode definir o destino de um campeonato inteiro. Quando a entidade reconhece o equívoco, mas mantém o resultado inalterado, a própria legitimidade da competição é comprometida. O time prejudicado não perde apenas pontos, perde credibilidade; e o campeonato, como produto, perde valor.Essa distorção é o retrato de um modelo de arbitragem que se arrasta em amadorismo. Sem critérios públicos de escala, sem meritocracia, sem auditoria independente e sem programa consistente de capacitação, a comissão de arbitragem tornou-se um símbolo da inércia institucional. O VAR, que deveria garantir justiça, transformou-se em fonte adicional de desconfiança.Enquanto isso, a CBF, detentora dos direitos e responsável por organizar o campeonato e captar patrocínios milionários, assiste de forma passiva ao colapso de confiança do seu próprio produto.O efeito colateral para as marcasO futebol é um dos maiores palcos de exposição de marca do mundo, mas também um dos mais sensíveis à percepção pública. Quando o torcedor percebe que o campeonato é marcado por injustiças, ele não reage apenas contra a CBF; reage contra tudo o que o representa. Isso inclui as marcas patrocinadoras, que passam a ser associadas a um produto em declínio ético e organizacional. O risco é de contaminação reputacional: a empresa que investe em emoção e engajamento pode, sem culpa direta, ser percebida como parte de um sistema que perdeu legitimidade.O torcedor, cada vez mais crítico e digitalmente ativo, já começa a manifestar sua insatisfação de forma concreta, cancelando o pay-per-view, boicotando produtos e cobrando das marcas uma postura coerente com seus valores de transparência, governança e responsabilidade social. Trata-se de um novo tipo de risco corporativo: o risco reputacional reflexo, em que o dano nasce da inércia de terceiros, mas recai sobre quem está visivelmente associado ao ambiente.O poder de influência dos patrocinadoresÉ justamente aqui que reside o ponto de virada. As marcas patrocinadoras não são parte do problema, mas podem ser a chave da solução. Seu poder econômico e simbólico é, neste momento, a única alavanca capaz de romper a inércia da CBF e exigir a profissionalização urgente da arbitragem. Cláusulas contratuais podem e devem evoluir para incluir requisitos de governança e transparência, como:auditorias externas sobre o desempenho e decisões da arbitragem e do VAR;critérios públicos de escala e avaliação de árbitros;comissões independentes de integridade esportiva;planos de capacitação e profissionalização obrigatória;divulgação de relatórios técnicos e indicadores de desempenho.Essas medidas não configuram ingerência, mas proteção do investimento e alinhamento com práticas modernas de compliance e ESG, que toda empresa responsável já adota em seus próprios negócios. As grandes marcas têm legitimidade para exigir que o ambiente em que aplicam recursos preserve integridade e previsibilidade, valores que sustentam qualquer negócio.O novo presidente e o teste de credibilidadeA posse de um novo presidente na CBF representa uma rara oportunidade de reconstrução institucional. Ele não herda apenas torneios, mas uma crise de confiança. Se quiser reverter esse quadro, precisará enfrentar o tema que seus antecessores evitaram: a reformulação completa da arbitragem brasileira. Siga o canal da Jovem Pan Esportes e receba as principais notícias no seu WhatsApp! WhatsApp A criação de uma comissão externa de arbitragem, com critérios meritocráticos e supervisão independente, não é apenas uma medida moral, é uma exigência de sobrevivência econômica do próprio produto. Sem isso, o futebol continuará sendo um espetáculo de resultados contestados, público em queda e marcas expostas a um ambiente tóxico de descrédito.O futebol brasileiro chegou ao seu limite de tolerância. O torcedor não aceita mais desculpas nem vídeos explicativos da CBF sobre erros “involuntários”. Quer justiça, profissionalismo e transparência. E, se a entidade máxima do futebol não reage, cabe às marcas que sustentam esse sistema exigir o mínimo: integridade no produto que ajudam a financiar. Não se trata de ativismo corporativo, mas de preservação de valor.As marcas podem, sim, mudar o rumo do futebol brasileiro. Se exigirem governança e transparência, obrigarão a CBF a se mover. Se permanecerem em silêncio, assistirão ao declínio do espetáculo e ao esvaziamento da confiança de milhões de consumidores.O futebol é paixão, mas também é negócio, e nenhum negócio sobrevive quando perde credibilidade. A hora de agir é agora porque se o patrocinador se calar o jogo termina antes do apito final. Não basta afastar árbitros pontualmente para reciclagem enquanto a comissão de arbitragem e seus membros permanecem intocados e escalam na rodada seguinte os mesmos protagonistas dos erros que mancharam a competição. O problema não é individual, é sistêmico, e enquanto a estrutura não mudar o descrédito continuará crescendo dentro e fora de campo. Leia também Tema 308 do TST: o que muda na gestão de cargos de confiança