Ufa! Finalmente os Estados Unidos abrem uma porta para negociar com o Brasil. A conversa por telefone entre Trump e Lula foi longa: trinta minutos. Um temporal, se comparados com os 39 segundos da química rolada em Nova York. A expectativa preocupante de que temas indigestos fossem abordados não se confirmou. O presidente americano se expressou com otimismo em suas redes sociais:“Nesta manhã, eu fiz uma chamada telefônica muito boa com o presidente Lula, do Brasil. Nós discutimos muitas coisas, mas a conversa focou principalmente na economia e no comércio entre os dois países. Teremos novas discussões e nos reuniremos em um futuro não muito distante, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Eu gostei da ligação telefônica. Nossos países irão muito bem juntos!”Alegria e apreensão ao mesmo tempoO governo brasileiro ficou exultante com a conversa. Para quem estava apreensivo com o tom que seria imposto por Trump, o resultado não poderia ser mais alvissareiro. Houve “festa” no Palácio do Planalto. O ministro Fernando Haddad disse que o contato foi positivo, e o vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou que estava otimista com a perspectiva de os Estados Unidos reverem a taxação de 50%.Tudo muito bom, tudo muito bem, mas será que esse telefonema é mesmo indicação de que as questões serão solucionadas? Embora Trump tenha dito que receberá Lula para uma reunião presencial, no momento escalou o secretário de Estado Marco Rubio para dar continuidade às tratativas. Uma notícia que deixou o governo brasileiro com a pulga atrás da orelha.É preciso ler nas entrelinhasNas entrelinhas, Trump deixou claro que as questões políticas quase não foram discutidas: “A conversa focou principalmente na economia e no comércio entre os dois países”. Ou seja, comigo o diálogo foi sobre economia, com Rubio, outras questões poderão ser abordadas. E quem duvida que serão? Aí é que tudo pode se complicar.Nas negociações com outros países, os representantes americanos foram diferentes. Com a União Europeia, por exemplo, foi o representante comercial Jamieson Greer; já com a China, o interlocutor foi o secretário do Tesouro Scott Bessent. Sem uma análise muito profunda, não é difícil deduzir que seriam esses dois os mais adequados para discutir questões econômicas.As exigências políticas ainda continuamMarco Rubio, todavia, provoca arrepios no governo brasileiro. Filho de cubanos, conhece bem os desmandos autoritários sofridos pela população de seu país de origem. Sempre foi crítico fervoroso de regimes que tiraram a liberdade de seus habitantes, como os casos da China e do Irã. Foi ele o responsável por impor sanções a autoridades brasileiras.Se na conversa com Trump o tema Bolsonaro não foi levantado, com Rubio a história poderá ser diferente. Provavelmente voltará à baila a falta de liberdade de expressão, as restrições das Big Techs e o julgamento e prisão de Bolsonaro, que ele considera injusta e resultado de perseguição política. Será que vai mudar a forma de pensar assim, num piscar de olhos?Momento difícil no relacionamentoO governo brasileiro supõe que, a partir de uma orientação do presidente Trump, as atitudes de Rubio poderão ser diferentes. A esperança é a de que, a exemplo do que ocorreu na conversa entre Lula e Trump, apenas as questões tarifárias sejam discutidas. Quem analisa, porém, as ações do secretário de Estado americano constata que ele sempre foi firme em suas decisões, jamais mudou de posição ou fez concessões.Talvez essa reunião dos três brasileiros escolhidos por Lula e Marco Rubio seja um dos momentos mais importantes e decisivos no relacionamento entre os dois países. Se o secretário de Estado mantiver sua posição de negociar as tarifas apenas se o Brasil atender às exigências políticas e judiciais estabelecidas na carta de Trump a Lula, enviada em 9 de julho deste ano, a reunião correrá o risco de ser um fracasso. Siga o canal da Jovem Pan News e receba as principais notícias no seu WhatsApp! WhatsApp Um dilema duro de solucionarO governo brasileiro não quer abrir mão das decisões do Judiciário. Além de não querer, não pode, pois não tem poder nesse território. Também não tem como recuar para aprovar uma anistia ampla, geral e irrestrita. Nessa questão, consegue até influenciar, mas não decidir sobre temas que são prerrogativas do Parlamento. E sem essas condições atendidas, as negociações ficarão emperradas. Não há muitas opções para o Brasil, já que, em apenas 60 dias após o aumento das tarifas, as exportações brasileiras caíram assustadores 20,3%.É um dilema difícil de resolver: manter a “soberania” e deixar o maior adversário político fora das eleições de 2026, ainda que isso prejudique a economia com perdas de arrecadação, empregos e quebra de empresas; ou deixar essas questões políticas de lado e pensar no país. Teria de quebrar a regra: farinha pouca, meu pirão primeiro.Equacionar tudo isso dependerá de muita diplomacia, resignação e desprendimento político. Somente um estadista com visão de longo prazo e comprometido com o desenvolvimento do país e o bem-estar da população poderá tomar uma decisão que não seja conveniente apenas às suas cores ideológicas. Será que é pedir demais? Essa reunião dará indícios da resposta que o Brasil aguarda. Siga pelo Instagram: @polito. Leia também Pacificação que anula a vontade de uma das partes é rendição