A Jaguar Land Rover, maior montadora do Reino Unido, está há mais de um mês com as fábricas paradas por causa de um ataque cibernético. O incidente, identificado em 1º de setembro, levou a empresa a suspender a produção não só em suas plantas britânicas, mas também em unidades no Brasil, China, Índia e Eslováquia. A interrupção já causou prejuízos de milhões de libras por dia, além de ameaçar a sobrevivência de fornecedores que dependem da montadora. E pior: este não é um caso isolado.Ciberataques paralisam de fábricas a supermercadosDe janeiro para cá, outras gigantes britânicas foram alvo de ciberataques. As redes de varejo Marks & Spencer e de supermercados Co-op, por exemplo, interromperam suas operações. Juntas, as perdas ultrapassaram meio bilhão de libras. Os episódios expuseram como falhas digitais podem afetar não apenas empresas, mas a rotina de milhões de pessoas – da compra de carros a prateleiras de supermercados.O caso da Jaguar Land RoverA Jaguar Land Rover, que pertence ao grupo indiano Tata, emprega cerca de 34 mil pessoas no Reino Unido e sustenta outros 120 mil empregos indiretos por meio de sua cadeia de fornecedores. Por conta de ciberataque, Jaguar deixou de pagar peças e serviços, o que forçou muitas empresas menores a reduzir jornadas ou até demitir pessoas (Imagem: nitpicker/Shutterstock)Com a paralisação, a montadora deixou de pagar peças e serviços, o que forçou muitas empresas menores a reduzir jornadas ou até cortar postos de trabalho. A dependência do modelo de produção “just in time”, no qual os insumos chegam exatamente na hora em que são usados, agravou ainda mais os efeitos do ataque.A dimensão do problema levou o governo britânico a intervir. Para evitar um colapso no setor automotivo, o Tesouro ofereceu um empréstimo de US$ 1,5 bilhão, voltado a sustentar os fornecedores da montadora. Mesmo assim, a incerteza persiste. A própria Jaguar Land Rover declarou apenas que espera retomar a fabricação “nos próximos dias”, sem dar detalhes sobre o ataque nem sobre os custos totais da paralisação.Quando falta carro – e comidaOs efeitos dos ataques não ficaram restritos às fábricas de automóveis. A rede de varejo Marks & Spencer viu suas vendas online ficarem suspensas por quase dois meses, o que causou perdas estimadas em £300 milhões (cerca de R$ 2 bilhões). Os efeitos dos ciberataques não ficaram restritos às fábricas de automóveis: também atingiram supermercados (Imagem: eldar nurkovic/Shutterstock)Já a rede de supermercados Co-op sofreu um impacto direto no abastecimento: além do vazamento de dados de 6,5 milhões de clientes, o ataque resultou em prejuízo de mais de £200 milhões (cerca de R$ 1,3 bilhão). Em algumas ilhas da Escócia, onde a rede é a principal fornecedora de alimentos, moradores chegaram a encontrar prateleiras vazias.Afinal, quem está por trás?As autoridades britânicas ainda não confirmaram oficialmente quem realizou os ataques, mas suspeitas recaem sobre o grupo conhecido como Scattered Spider. A quadrilha, formada por jovens no Reino Unido e nos Estados Unidos, já assumiu a autoria de ataques anteriores contra empresas britânicas. Suspeitas recaem sobre o grupo hacker conhecido como Scattered Spider, formado por jovens do Reino Unido e dos Estados Unidos (Imagem: Song_about_summer/Shutterstock)Em julho, quatro pessoas de 17 a 20 anos foram presas em conexão com as invasões à Marks & Spencer e à Co-op, mas até agora nenhuma acusação formal foi apresentada.Esse tipo de ofensiva costuma seguir o padrão de ransomware: criminosos sequestram dados ou bloqueiam sistemas inteiros em troca de resgate. Como ataques vindos da Rússia e de países vizinhos são mais frequentes, especialistas apontam que o Scattered Spider chama atenção por ser “caseiro”. Além disso, a escolha do Reino Unido não é por acaso: o país é rico, altamente digitalizado e compartilha o inglês como idioma, o que facilita tanto os golpes de engenharia social contra funcionários quanto a negociação de pagamentos com as vítimas.Problema vai além do Reino UnidoOs ciberataques recentes mostram que a ameaça é global. Na mesma época em que Jaguar Land Rover e grandes redes britânicas enfrentavam paralisações, a cervejaria japonesa Asahi suspendeu parte da produção após uma invasão digital. Ciberataques recentes mostram que a ameaça não se restringe ao Reino Unido, ela é global (Imagem: Pixels Hunter/Shutterstock)Além disso, aeroportos na Bélgica e na Alemanha sofreram atrasos em check-in e embarques por causa de um ransomware que afetou os sistemas de bordo em setembro. Para especialistas, esses episódios reforçam que a insegurança digital não reconhece fronteiras. Empresas e serviços essenciais em qualquer lugar do mundo podem ser alvo. E a frequência crescente das ofensivas sugere que nenhuma economia está imune.Leia mais:Water Saci: golpe mira bancos e corretoras de criptomoedas no BrasilPara que realmente serve a aba anônima dos navegadores?Senhas com biometria são realmente seguras?O alerta dos especialistasApesar de anos de investimentos em cibersegurança, os ataques recentes mostram que empresas ainda estão vulneráveis a paralisações graves. Especialistas afirmam que não basta proteger dados de clientes: é preciso garantir a continuidade das operações em caso de crise. Testar planos de resposta e treinar funcionários são medidas vistas como essenciais. O risco, dizem analistas, é que os ataques deixem de ser apenas crimes de extorsão e passem a ser usados como arma de guerra cibernética, com potencial para gerar caos social e econômico. Nesse cenário, nem sempre haverá a opção de pagar um resgate para retomar as atividades. E a sociedade precisará estar preparada para resistir.(Esta matéria usou informações do jornal The New York Times.)O post Do carro ao supermercado: como hackers têm bagunçado a rotina no mundo apareceu primeiro em Olhar Digital.