A Inteligência Artificial (IA) deixou de ser um conceito distante para se tornar um tema incontornável em reuniões empresariais, debates públicos e até nas conversas mais informais. Hoje, todas as empresas que ambicionam prosperar são obrigadas a repensar estratégias, modelos de negócio e competências.«Há alguém que tenha estado recentemente numa reunião de liderança sem discutir IA?» — a provocação de Robert Engels, Head of Capgemini AI Lab & Vice President, abriu a talk Next Species Pact na Leadership Summit Portugal, desafiando os líderes a refletirem sobre o papel humano num mundo cada vez mais dominado por sistemas inteligentes.Segundo o especialista, estamos perante «tempos estranhos», em que as fronteiras entre a cognição humana e a capacidade das máquinas se tornam mais difusas. Defende que há que fazer «um pacto com a próxima espécie» — uma convivência consciente com as novas formas de inteligência. «Não devemos ser ingénuos. Precisamos de desenvolver a mesma intuição para lidar com a tecnologia inteligente que temos para os ambientes naturais», apelou.Mas, para Engels, o controlo humano deve permanecer inegociável: «As tecnologias atuais são mais eficazes em cenários que nem sempre servem o bem comum». Por isso, advoga uma governação colaborativa e ética da IA, inspirada em modelos como o da União Europeia. «Pode ser lento, mas decidimos juntos — e isso é o que precisamos para esta nova era». Da técnica à ubiquidade: a ascensão da IA generativaDurante décadas, a IA foi um domínio técnico, restrito a engenheiros e académicos. «Ninguém se preocupava com a IA há 20 anos — era ficção científica», recordou Engels. Mas tudo mudou com o surgimento dos modelos de linguagem de larga escala (LLMs), como o ChatGPT, que introduziram uma nova relação emocional entre humanos e máquinas.Engels partilhou o momento em que percebeu o impacto psicológico da IA generativa: «Pela primeira vez senti algo estranho. Parecia que alguém estava realmente a falar comigo». Essa ilusão de interação humana transformou a perceção pública e trouxe novas camadas de complexidade ética, política e social.Com a disseminação destas ferramentas, surgem questões cruciais sobre acesso, controlo geopolítico e ética: «Quem tem acesso aos modelos? Quem detém o hardware? Quem define os dados que alimentam as decisões algorítmicas?». Para Engels, estas perguntas estão no centro da nova economia da informação e da soberania tecnológica global. Mitos da inteligência artificialUm dos alertas mais contundentes do especialista diz respeito à natureza dos LLMs. Segundo Engels, estas ferramentas «não são modelos de conhecimento», apenas geram sinais comunicacionais com base em padrões estatísticos. Não possuem compreensão real nem capacidade de abstração.«Nós usamos o conhecimento para gerar mensagens com contexto. Os modelos limitam-se a reproduzir sinais linguísticos contextualizados, mas não compreendem o significado como nós». Esta limitação explica porque os sistemas podem responder com coerência aparente num domínio e falhar completamente noutro semelhante — o fenómeno popularmente conhecido como “alucinação” dos modelos.Apesar disso, o avanço das capacidades multimodais — combinando texto, imagem, som e dados numéricos — abre um novo capítulo para a IA. Engels considera esta convergência «uma das funcionalidades mais poderosas que ainda não compreendemos totalmente».O desafio da contextualização e o mundo real como obstáculoPara o especialista, o maior desafio técnico e filosófico da IA é o contexto. «A realidade física e social é complexa demais para ser plenamente modelada», explicou. A dificuldade em transferir modelos treinados em ambientes controlados para o mundo real é evidente em áreas como os veículos autónomos, onde as variáveis contextuais são infinitas.A talk encerrou com um apelo à consciência e responsabilidade dos líderes. A IA já não é apenas uma ferramenta técnica, mas um agente transformador de sistemas económicos, sociais e culturais. Cabe às lideranças compreender os seus limites, orientar o seu uso ético e garantir que o progresso tecnológico seja guiado por valores humanos.«Precisamos de alinhar-nos com esta nova espécie, mas mantendo o comando», concluiu Engels. «A inteligência artificial deve servir a humanidade e não o contrário». Assista ao momento completo na Líder TV:Robert Engels – Next Species Pact Aceda à galeria de imagens completa aqui.Todos os conteúdos estão disponíveis na Líder TV e nos canais 165 do MEO e 560 da NOS.O conteúdo «A IA deve servir a humanidade e não o contrário», defende Robert Engels aparece primeiro em Revista Líder.