«Já não podemos confiar da mesma forma nos Estados Unidos», afirma Carlos Leitão

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A relação entre Portugal e o Canadá não é recente e vai além de conexões diplomáticas e históricas. Do ponto de vista económico, existe o Acordo Económico e Comercial Global entre a União Europeia e o Canadá (CETA), que tem como objetivo reduzir barreiras alfandegárias, facilitar o investimento e agilizar a mobilidade económica, estando em aplicação provisória há cerca de oito anos.Simultaneamente, existem pressões que assombram muitos mercados de ambos os países, derivadas das medidas taxativas da Administração Trump relativas às exportações. Ampliar as cadeias de exportação revela-se mais do que uma mera escolha estratégica.Para Carlos Leitão, Secretário Parlamentar do Ministro da Indústria e Membro do Parlamento do Canadá, a questão é inequívoca: «A nossa soberania depende da capacidade de diversificar o comércio».O deputado participou digitalmente no EuroAmericas Forum, em Carcavelos, num painel que juntou vozes de Portugal e do Canadá para discutir o papel do CETA.Em palco estiveram também António Leão Rocha, Embaixador de Portugal no Canadá, Élise Racicot, Embaixadora do Canadá em Portugal, Gilda Pereira, CEO da Ei! Migratory Advisory e Nuno Schaller Gonçalves, Sócio da Deloitte Portugal. A moderação ficou a cargo de Victor Severino, VP de Capacitação Empresarial da Câmara de Comércio da Região de Toronto.A nova geoeconomia baseia-se em diversificar para sobreviverCarlos Leitão não poupou nas palavras: a política comercial norte-americana é «caótica» e já não pode continuar a ser a âncora quase exclusiva da economia canadiana. Atualmente, 80% das exportações do Canadá têm como destino os Estados Unidos, mas o objetivo político é claro: duplicar as exportações para fora da América do Norte na próxima década. «A Europa está no centro dos nossos objetivos de exportação», destacou o deputado.A estratégia de diversificação avança em paralelo para a Ásia e a América do Sul. Para a tornar viável, o Canadá lançou o Trade Diversification Corridor Fund, com cerca de cinco mil milhões de dólares canadianos em sete anos, destinado a modernizar portos, reforçar corredores ferroviários e criar novas vias de ligação tanto para o Atlântico como para o Pacífico.Portugal–Canadá: comércio cresce, potencial por explorarDo lado português, António Leão Rocha destacou que o CETA, mesmo ainda em aplicação provisória, já produziu resultados concretos: o comércio bilateral cresceu cerca de 53% desde 2017.O Canadá é hoje um mercado importante para setores tradicionais portugueses — como vinhos, agroalimentar, calçado e artigos para casa — mas o embaixador sublinha que o verdadeiro potencial está noutros domínios: engenharia avançada, automóvel, base tecnológica, defesa e farmacêutica.Contudo, permanecem obstáculos estruturais: distância, logística complexa e um mercado altamente fragmentado em nível provincial. Para as PME portuguesas, isto significa que o Canadá não pode ser abordado como um mercado único; é essencial investir em soft landing, gestão local e compreensão das especificidades de cada província.António Leão Rocha, Embaixador de Portugal no CanadáJá Élise Racicot sublinhou que setores como minerais críticos, alta tecnologia e defesa são prioritários e dependem fortemente de relações com países like-minded, que partilham valores democráticos e sistemas regulatórios compatíveis. A cooperação através do Horizon Europe, parcerias energéticas, tecnológicas e farmacêuticas, bem como o quadro estratégico da NATO, reforçam um ambiente de confiança regulatória — condição indispensável para investimentos de longo prazo.«A prova está nos resultados: se mostrarmos claramente os benefícios económicos do CETA, muitos dos que hoje resistem acabam por se convencer», sublinhou.Élise Racicot, Embaixadora do Canadá em PortugalAs empresas já estão envolvidas, mas há falta de conhecimentosDo lado das empresas, Gilda Pereira e Nuno Schaller Gonçalves mostraram que, apesar de terem já apoiado centenas de profissionais em mobilidade entre Portugal e o Canadá, a literacia sobre o CETA continua limitada no tecido empresarial.Gilda destacou que «ainda existe muito desconhecimento sobre o que o CETA realmente permite», explicando que muitas empresas só descobrem as oportunidades quando já estão envolvidas em processos transatlânticos. Quando conhecem o acordo, procuram sobretudo maior mobilidade para talento qualificado, reconhecimento mútuo de qualificações e menos burocracia.Gilda Pereira, CEO da Ei! Migratory AdvisoryNuno Schaller Gonçalves reforçou que o CETA pode ser um acelerador de inovação e competitividade, mas que «muito do financiamento disponível continua por explorar por falta de divulgação».Ambos sublinham também o interesse crescente das empresas em incentivos ligados à sustentabilidade e projetos carbono zero, áreas onde o acordo pode desempenhar um papel decisivo. Em síntese, o potencial existe, mas falta transformá-lo em prática através de mais informação, articulação e uso efetivo dos instrumentos já disponíveis.Nuno Schaller Gonçalves, Sócio da Deloitte PortugalO conteúdo «Já não podemos confiar da mesma forma nos Estados Unidos», afirma Carlos Leitão aparece primeiro em Revista Líder.