Uma pesquisa inédita feita pelo Infojobs em parceria com o Movimento Black Money aponta que sete em cada dez profissionais negros (71%) afirmam que já sofreram racismo ou preconceito no ambiente de trabalho. A violência está tão impregnada na rotina que quase metade dos entrevistados (49%) afirmou que o preconceito aconteceu em diversos momentos e contextos profissionais.Além disso, a pesquisa aponta que a desigualdade de oportunidades persiste. Mesmo que 53% dos respondentes estejam empregados e 28% tenham pós-graduação, eles afirmam que as chances de crescimento são desiguais.Os números mostram que o racismo no mercado de trabalho brasileiro está longe de ser exceção porque ele se repete, silenciosamente, em entrevistas, promoções e relações hierárquicas. A pesquisa ouviu 800 profissionais em outubro deste ano. Leia também: Emprego recorde esconde desengajamento: o prejuízo oculto de R$ 77 bilhõesDiscriminação ‘sutil’Essas experiências discriminatórias muitas vezes não são explícitas, afirma Ana Paula Prado, CEO da Redarbor Brasil, detentor do Infojobs. “Elas podem se manifestar de forma sutil e repetida em diversos momentos da vida profissional, e têm impacto direto na confiança, no bem-estar e na trajetória profissional das pessoas”, diz.Entre os relatos mais frequentes, estão situações como ser constantemente subestimado, ter suas competências questionadas de maneira desproporcional, enfrentar barreiras invisíveis no processo seletivo ou até na evolução profissional dentro de uma empresa. “Há também episódios de microagressões, comentários inadequados e supostas brincadeiras sobre aparência ou as vivências e, em casos mais extremos, até exclusões sociais de grupos e de projetos”, diz. Essas situações, ainda que pontuais, são capazes de minar a autoconfiança e criar no profissional um sentimento de incapacidade, de não representatividade, e de insegurança, pontua Prado. Foto: UnsplashBarreira da contrataçãoAs barreiras se erguem antes mesmo da contratação. Segundo a pesquisa, 38% dos profissionais negros afirmam ter receio de incluir foto no currículo por medo de serem eliminados na primeira fase de seleção.“Esse dado traz uma camada muito profunda da discussão sobre racismo no mercado de trabalho. Quando profissionais negros evitam colocar foto no currículo, o que vemos é um movimento de autoproteção — uma tentativa de reduzir a chance de sofrer um julgamento prévio antes mesmo de serem avaliados pelas competências que possuem”, avalia.Essa antecipação pode acontecer porque, em algum momento, essas pessoas já vivenciaram ou conheceram alguém que vivenciou uma situação discriminatória parecida. “Quando um profissional precisa se ‘preparar’ para evitar um possível viés que nem deveria existir, significa que ainda temos desafios estruturais grandes para superar”, diz. O desafio da entrevista presencialPassada a barreira do currículo, há outro desafio: a entrevista presencial. A pesquisa captou que 46% dos profissionais negros disseram já ter sentido que suas chances de contratação foram menores em entrevistas presenciais em relação a outros candidatos de maioria não negra. Ela explica que essas situações vão além de perguntas mais incisivas que colocam a capacidade do candidato sob questionamento. Muitas vezes, explica, são micro comportamentos como menor tempo de entrevista, menor profundidade nas perguntas técnicas, interrupções mais frequentes ou um olhar que transmite dúvida.“No contato presencial, alguns vieses inconscientes podem ficar mais evidentes, desde expressões faciais e postura, até o tipo de pergunta feita ou a forma como a entrevista é conduzida”, pontua. “É claro que precisamos ter um cuidado ao interpretar as situações, mas vários desses sinais, somados, podem fazer com que o profissional sinta uma desvantagem”, conta.Para 75% dos entrevistados, essa desigualdade se repete na trajetória interna de carreira. Eles afirmam que já perderam oportunidades de promoção para pessoas não negras menos qualificadas tecnicamente, e 31% dizem que isso aconteceu em diferentes momentos.RepresentatividadeA pesquisa mostrou que 44,6% dos respondentes disseram que no trabalho atual ou anterior não havia pessoas negras em cargos de liderança, embora a população negra seja a maioria no Brasil. “Esse é de fato um reflexo do que se vê no mercado, essas pessoas ainda ocupam uma parcela muito pequena das cadeiras estratégicas ou de liderança, e isso é resultado de um conjunto de barreiras que se acumulam ao longo da trajetória profissional e da nossa história como sociedade”, afirma. Essas barreiras podem se impor desde o acesso às mesmas oportunidades acadêmicas, desenvolvimento no início da carreira, a ausência de mentores e patrocinadores internos, e também à falta de visibilidade em projetos estratégicos — que são justamente aqueles que abrem portas para posições de decisão.Leia também: Empresas estão mais preocupadas com saúde mental, mas agir ainda é desafioProcessos transparentes e ambientes preparadosO racismo está estruturado na sociedade brasileira e se perpetua no ambiente de trabalho, com profissionais reproduzindo suas visões de mundo. Para Prado, superar essas barreiras exige intenção e consistência.Por isso, as empresas devem ficar atentas à importância de desenvolver processos mais transparentes, ambientes mais preparados para acolher a diversidade e lideranças capazes de identificar e impedir esses comportamentos discriminatórios. Segundo ela, é preciso reforçar para as empresas que a diversidade não é só representatividade no quadro de funcionários, mas a construção de ambientes em que as pessoas se sintam seguras, respeitadas e representadas desde o primeiro contato.Tecnologias em processos seletivos podem ajudar a selecionar pessoas exclusivamente por suas competências, com o intuito de promover mais equidade. Empresas que têm conseguido avançar, adotam práticas como programas formais de aceleração de carreira, processos transparentes de promoção, metas claras de diversidade, além de treinamentos contínuos para lideranças. Mas, acima de tudo, é preciso garantir que esses profissionais tenham espaço igualitário para assumir desafios reais de crescimento e desenvolvimento. “Só assim conseguimos avançar de forma consistente não só no mercado de trabalho, mas como sociedade”, diz. “Quando criamos estruturas que promovem equidade, o resultado aparece não só em mais lideranças diversas, mas também em empresas mais inovadoras, competitivas e preparadas para os desafios do futuro.”The post Sete em cada dez negros afirmam que já sofreram racismo ou preconceito no trabalho appeared first on InfoMoney.