A disputa pela COP31 expõe divergências geopolíticas e o peso simbólico das próximas sedes do clima

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A definição da sede da COP31, prevista para 2026, transformou-se em um dos impasses mais significativos da diplomacia climática recente. Austrália e Turquia disputam a indicação dentro do grupo regional WEOG — que precisa de consenso unânime — e, até agora, nenhuma solução se consolidou. O tema transcende logística e toca em questões profundas de legitimidade, prioridades globais e equilíbrio entre Norte e Sul no debate climático.A decisão ganhou novo fôlego após o primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese, afirmar que seu país não vetará a candidatura turca. O gesto foi interpretado como uma tentativa de evitar que o impasse prejudique países insulares do Pacífico, aliados estratégicos de Camberra. Ainda assim, a Austrália rejeitou co-presidência ou co-sediamento, reforçando que esse modelo não existe no regulamento oficial da UNFCCC. A disputa revela visões distintas de protagonismo climático. A Austrália apresenta uma candidatura sustentada por infraestrutura robusta e pelo apoio dos pequenos Estados insulares, que enxergam na potência regional um canal de pressão por financiamento e adaptação — temas centrais para quem já enfrenta a elevação do nível do mar. Ao mesmo tempo, o país carrega o peso de um histórico recente de dependência de carvão e atrasos na transição energética, fatores que limitam sua autoridade moral nas negociações. Siga o canal da Jovem Pan News e receba as principais notícias no seu WhatsApp! WhatsApp A Turquia, por sua vez, aposta na posição estratégica entre Europa e Ásia e no discurso de ponte entre hemisférios. Seu argumento central é o de ampliar a participação dos países em desenvolvimento nos centros de decisão global. A narrativa de inclusão, porém, enfrenta críticas similares às australianas: Ancara mantém uma expansão relevante de termelétricas a carvão e políticas internas consideradas insuficientes para alinhar o país às metas do Acordo de Paris.Em ambos os casos, o benefício simbólico é claro. Uma COP sediada na Austrália colocaria os holofotes sobre o Pacífico — região mais vulnerável do planeta — e reforçaria o discurso de justiça climática. Uma COP sediada na Turquia, por outro lado, ampliaria a presença do Sul Global num espaço majoritariamente dominado por países ricos ou emergentes de grande porte.Mas o risco de impasse é real. Se não houver consenso, a COP31 retorna automaticamente para Bonn, sede permanente da UNFCCC. Para a governança climática, isso significaria perder a oportunidade de ancorar a cúpula em regiões estratégicas, reduzindo também o impacto simbólico e político que sedes alternadas costumam trazer.O quadro se torna ainda mais relevante quando observado em sequência: a COP30 em Belém, que reforça o papel da Amazônia na geopolítica do clima, e a já confirmada COP32 na Etiópia, primeira vez que o continente africano recebe o evento em mais de uma década. A escolha da Etiópia simboliza um realinhamento internacional em torno do continente que mais sofre com a crise climática e menos contribuiu para ela.Diante disso, a decisão sobre a COP31 é mais do que uma disputa entre dois países. É um termômetro da capacidade do sistema multilateral de reduzir tensões regionais, fortalecer agendas de adaptação e reconhecer vulnerabilidades históricas. E, sobretudo, é um indicativo de como o mundo pretende conduzir a política climática num momento em que os impactos do aquecimento global se aceleram mais rápido do que as respostas internacionais.Seja Austrália ou Turquia, a COP31 precisa ser definida com urgência — não apenas para garantir previsibilidade ao processo, mas para evitar que o próprio sistema climático internacional fique refém de impasses diplomáticos em um momento em que a ação deveria falar mais alto que a indecisão.