A temporada de balanços do terceiro trimestre de 2025 trouxe um quadro mais complexo da lucratividade das companhias listadas na B3. Embora o resultado consolidado ainda indique pressão sobre margens e um recuo relevante dos lucros, a dinâmica por setor revela movimentos assimétricos, e alguns deles bastante surpreendentes.De forma geral, o lucro das empresas não financeiras caiu 9,2%, somando R$ 79,0 bilhões, enquanto o setor financeiro recuou 3,5%, para R$ 36,9 bilhões. O agregado total da bolsa, R$ 116,0 bilhões, sofreu retração de 7,46%. Porém, quando se inclui o efeito de Americanas (AMER3) e Axia Energia (AXIA3), que atravessam situações muito específicas, o quadro muda completamente: o número total despenca para R$ 110,9 bilhões, queda de 22,3%.Esse conjunto de distorções revela muito sobre a verdadeira fotografia corporativa brasileira.Construção civil, varejo e transporte lideram crescimento dos lucros, enquanto utilidade pública afundaEntre os destaques positivos, o setor de construção civil impressiona: o lucro mais que dobrou no período, avançando 106%, para R$ 2,05 bilhões. O movimento foi puxado por forte demanda por habitação popular, revisão de preços, melhoria operacional e redução do custo de capital.CONFIRA: As análises completas do BTG Pactual sobre os resultados de Petrobras, Vale, Itaú e outras gigantes da bolsaO comércio e distribuição também apresentou alta vigorosa, de 99%, reflexo de reposicionamento estratégico, ganho de eficiência e normalização dos custos logísticos pós-2022.No segmento de transporte, o lucro saltou 172%, impulsionado por maior demanda por mobilidade aérea e rodoviária e pela reorganização de capacidade.Outros setores mostraram força consistente:Tecidos, vestuário e calçados: +62%Computadores e equipamentos: +62%Siderurgia e metalurgia: +50%Telecomunicações: +27%Alimentos processados: +11,7%O denominador comum é a melhora de volumes e a recomposição gradual de preços, em um ambiente de inflação mais comportada.Por outro lado, setores tradicionalmente robustos enfrentaram pressões severas:Energia elétrica: -34,8%Petróleo, gás e biocombustíveis: -15,3%Serviços médico-hospitalares: -89,8%Madeira e papel: -38,3%Diversos: -33,5%Material de transporte: -33,7%No caso das elétricas, o recuo reflete decisões regulatórias, efeitos climáticos e um ciclo de despesas não recorrentes. Já em petróleo, o trimestre reflete piora de preços internacionais e ajustes operacionais de grandes players.Financeiras recuam menos que as não financeiras, e seguem como contra-peso de estabilidadeO setor financeiro mostra novamente resiliência. Embora bancos tenham registrado queda de 4,7% nos lucros (para R$ 31,2 bilhões), seguradoras e resseguradoras cresceram 3,4%, sustentadas por melhor desempenho técnico e financeira.No consolidado, as empresas financeiras recuaram 3,5%, menos da metade da queda das empresas não financeiras. Ou seja: em um trimestre de pressões operacionais e margens comprimidas, o setor financeiro novamente funcionou como amortecedor estatístico da bolsa.Essa dinâmica reforça uma tendência estrutural: o lucro corporativo brasileiro depende, de forma significativa, da estabilidade relativa dos bancos.LEIA TAMBÉM: O Money Times liberou, como cortesia, as principais recomendações de investimento feitas por corretoras e bancos — veja como acessarO fator Americanas e Axia: duas distorções gigantesIsoladamente, Americanas e Axia Energia alteram radicalmente a leitura dos resultados agregados da B3.Americanas, em processo de reestruturação profunda, reduziu um lucro atípico de 2024 (R$ 10,3 bi) para R$ 367 milhões, queda de 96,4%.Axia Energia saiu de um lucro de R$ 7,2 bilhões para prejuízo de R$ 5,4 bilhões, uma virada de R$ 12,6 bilhões.Com isso, o total das empresas listadas, antes positivo em R$ 116 bilhões, recua para R$ 110,9 bilhões, uma perda adicional de R$ 31,9 bilhões quando se comparam as bases 2024 vs. 2025 com ambas incluídas.Essas duas empresas, por suas particularidades contábeis e corporativas, devem ser tratadas como casos especiais. E, sem elas, o quadro geral do mercado é menos dramático, embora ainda negativo.O que este trimestre nos diz sobre o estado real das empresas brasileirasAo combinar todos os dados, algumas conclusões emergem:1. O lucro setorial está cada vez mais assimétricoSetores cíclicos vêm se recuperando bem, enquanto setores tradicionais de grande peso, como energia elétrica e petróleo, sofrem pressões conjunturais relevantes.2. As empresas não financeiras enfrentam desafios operacionais maioresO recuo de 9,2% nas não financeiras reflete custos ainda pressionados, despesas operacionais crescentes e dificuldade de repassar preços acima da inflação.3. O setor financeiro permanece como âncora de estabilidadeMesmo com queda, bancos e seguradoras mantêm previsibilidade de resultados e baixa volatilidade, algo vital para a leitura do mercado.4. Americanas e Axia mostram que a fotografia consolidada precisa de filtrosSem ajustes, o agregado da B3 dá a impressão de deterioração muito mais grave do que a realidade operacional da maioria das empresas.5. A bolsa brasileira segue num ciclo de transiçãoMargens ainda pressionadas, receitas crescendo menos que o IPCA e um ambiente global mais desafiador, inclusive com tarifas impostas pelos EUA, compõem o cenário de adaptação das empresas.