Em resorts de bem-estar dos EUA, Ozempic vira parte do cardápio de tratamentos

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Lá em 2021, quando o mundo estava assando pães de fermentação natural e estocando papel higiênico, o Movara surfava no auge da pandemia. O resort de fitness e perda de peso, situado nas rochas vermelhas de Ivins, Utah, estava lotado, com reservas esgotadas por 18 semanas seguidas. E não estava sozinho. O Hilton Head Health, outro resort do tipo na Carolina do Sul, também tinha lista de espera de seis a oito semanas. O mesmo acontecia no Skyterra Wellness Retreat, em Pisgah Forest, na Carolina do Norte. Os dias de confinamento, ao que parece, foram tempos de bonança para muitos spas de destino.Pouco depois de a vida voltar ao normal (mais ou menos) para a maioria das pessoas, as coisas começaram a ficar estranhas para os retiros de desintoxicação. As pessoas se vacinaram, tiraram as máscaras e começaram a viajar em massa para a Itália em busca de prazeres como spritz à beira-mar. Já os hóspedes internacionais, que já estavam receosos em relação às viagens aos EUA, ficaram ainda mais hesitantes.Então, antes que os negócios pudessem se recuperar, surgiu um novo fator de disrupção. Medicamentos como Ozempic, Wegovy, Saxenda e Mounjaro são usados no tratamento de diabetes tipo 2 e também para controle de peso.Assim, esses medicamentos, que passaram a ser amplamente usados para emagrecimento, agora pareciam oferecer o que os spas nunca conseguiram garantir: resultados duradouros e sem esforço, por cerca de US$ 500 ao mês (dependendo do seguro). Sem necessidade de trilhas cansativas ou contagem de calorias.Como resultado, apenas cinco anos depois do auge, alguns resorts de bem-estar lutam para evitar um dos seus piores momentos. E não são só os retiros detox: esses medicamentos provocaram ondas de choque no mercado global de bem-estar, avaliado em US$ 6,3 trilhões. O segredo para evitar o colapso da indústria de spas de destino, ao que parece, pode ser justamente abraçar essa ameaça farmacológica como parte essencial dos programas.A cofundadora do Movara, Michelle Kelsch, inicialmente descartou esses medicamentos como uma moda passageira e os rejeitou, assim como havia feito com tendências como Atkins, HCG, Whole30 e jejum intermitente.— Se é algo que você não consegue fazer para o resto da vida, não vai funcionar — ela dizia aos clientes, reforçando seu mantra de 30 anos de exercício, disciplina e a pouco glamourosa matemática das calorias.Mas, à medida que a adoção disparava com resultados impressionantes, Kelsch começou a aprender mais.–Ao longo dos anos vimos muitas coisas aparecerem e desaparecerem prometendo resultados, mas nada como isso. A maioria causava frustração e contribuía para experiências negativas. Essa é a primeira coisa em 25 anos que vejo alinhada com o que sempre ensinei.No Hilton Head Health, o número de novos hóspedes caiu em 2023. Um ano depois, graças a esforços de marketing e novos programas, representantes dizem que o resort já tinha recuperado o público, embora sem divulgar números.Embora o resort não pergunte especificamente sobre o uso desses medicamentos nos formulários de entrada – e as pessoas nem sempre dizem a verdade – o diretor de programas, David Chesworth, atribui parte da queda aos medicamentos injetáveis. Hóspedes em potencial que estão dispostos a gastar dinheiro para cuidar da saúde, segundo ele, “vão tentar primeiro esse remédio, em vez de ir para um programa de emagrecimento”.Isso ajudou a moldar o novo programa H3 Experience, que pode durar apenas quatro dias e ajuda os hóspedes a pesar prós e contras do uso desses medicamentos como parte de uma abordagem mais holística e personalizada de saúde física e mental. Chesworth enfatiza que o resort sempre incentiva os hóspedes a consultarem seus médicos antes de tomar qualquer decisão sobre medicamentos.No The Ranch, em Malibu, Califórnia, que funciona desde 2010, a filosofia continua a mesma, com forte foco na disciplina: alimentação vegana, sem cafeína, ioga ao amanhecer e trilhas de quatro horas diárias. Mas o perfil de hóspedes mudou: mais mulheres na menopausa, mais usuários desses medicamentos e maior interesse em questões pós-emagrecimento, como manutenção, longevidade e envelhecimento saudável. Apoiar esses hóspedes se tornou lucrativo: programas com suporte a usuários desses medicamentos custam a partir de US$ 12.400 por seis noites; já o programa padrão do The Ranch sai por US$ 9.200 no mesmo período.— Estamos vendo uma mudança perceptível em direção à manutenção da saúde — diz Nicky Swierszcz, guia sênior e nutricionista clínica da filial do The Ranch em Hudson Valley, em Sloatsburg, Nova York.Há também novas considerações, como as necessidades alimentares ligadas ao uso de GLP-1.— Não queremos que os hóspedes voltem para casa mais magros apenas por conta de desidratação ou atrofia muscular — afirma Alex Timmons, dono do Mountain Trek Health Reset Retreat, em Ainsworth Hot Springs, Colúmbia Britânica. Conhecido por seus intensos programas de fitness de uma a duas semanas, o resort agora “equilibra meticulosamente calorias, macronutrientes, horários das refeições, atividades físicas e o momento delas para alinhar com os ritmos naturais dos hormônios”, diz Timmons.Enquanto isso, o Skyterra, famoso por seus retiros individualizados nas Montanhas Blue Ridge da Carolina do Norte, fez parceria com um médico local para hóspedes que querem começar ou estão saindo do tratamento. Os retiros, que incluem consultas sobre como manter massa muscular custam US$ 18.480 por quatro semanas, com grupos de apoio online semanais para ajudar na continuidade no “mundo real”.Não é a primeira vez que resorts de bem-estar precisam reformular suas ofertas. Craig Oliver, fundador da Spas of America, lembra que a indústria já sofreu mudanças semelhantes a cada nova moda fitness, como a adoção repentina da aeróbica nos anos 80 e o ressurgimento da ioga nos anos 2000.— Da noite para o dia, os spas tinham que criar aulas de aeróbica. O pilates foi outra febre. Todo mundo teve que adaptar as salas para os reformers.Uma pesquisa da KFF em 2024 mostrou que cerca de 1 em cada 8 adultos nos EUA já usou algum medicamento como Ozempic, enquanto 1 em cada 6 americanos pratica ioga, segundo levantamento do CDC em 2024. Mas o uso está explodindo: deve crescer mais de 73% em 2025, chegando a 1 em cada 5 adultos americanos. Esse aumento se deve em parte ao acesso facilitado: em agosto, a Novo Nordisk cortou o preço do Ozempic pela metade, de US$ 1.000 para US$ 499, enquanto sua concorrente Eli Lilly busca aprovação da FDA para uma pílula diária, o orforglipron, até o fim deste ano.Ou seja, os resorts não têm escolha a não ser se adaptar a esses medicamentos. Susie Ellis, presidente e CEO do Global Wellness Institute, chama isso de futuro da indústria e prevê que os spas terão de adotar um “novo casamento” entre medicina, bem-estar e biohacking de alta tecnologia.— Todos os spas e resorts precisarão repensar suas estratégias para atender às necessidades únicas dos usuários — afirma.The post Em resorts de bem-estar dos EUA, Ozempic vira parte do cardápio de tratamentos appeared first on InfoMoney.