Entre 1932 e 1968, a indústria química Chisso, despejou metil mercúrio junto com as águas residuais de sua fábrica localizada na cidade de Minamata, no Japão. A contaminação da população deu origem ao que ficou conhecido como a Doença de Minamata, causada pela intoxicação severa por mercúrio com danos irreversíveis para a população. A enfermidade foi oficialmente reconhecida em 1956, quando médicos identificaram a causa dos sintomas que afetaram gravemente a população da cidade. Em 2025, a Doença de Minamata ameaça a população indígena e ribeirinha da Amazônia brasileira, com o mercúrio despejado nos rios pelo garimpo.“As pessoas têm que saber o que está acontecendo e é por isso que a gente não para de lutar. Vocês estão matando os nossos filhos”. Essa fala de Alessandra Munduruku está registrada no documentário de Jorge Bodanzky, que chegou ao público no início de setembro deste ano.Alessandra Korap, em cena do documentário “Amazônia, a NOva MInamata?”. Foto: Reprodução | YouTubeAmazônia, A Nova Minamata? acompanha a saga do povo Munduruku para conter o impacto destrutivo do garimpo de ouro em seu território, e ao mesmo tempo revela como a Doença de Minamata ameaça os habitantes de toda a Amazônia hoje.“Fiz muitos filmes sobre a região, mas este é seguramente um dos mais importantes e difíceis da minha vida, pois alerta para os riscos que a contaminação de mercúrio significa para as novas gerações da região amazônica”, comenta Jorge Bodanzky.O documentário relata a dramática realidade que está hoje em curso na Amazônia. Invadida criminosamente pela mineração ilegal, que destrói a floresta enquanto deposita toneladas de mercúrio nos seus rios, a Amazônia percorre o mesmo processo de contaminação silenciosa que aconteceu em Minamata no século passado. Leia também: 1.Garimpo ameaça árvores gigantes na Amazônia 2.Garimpo ilegal ameaça saúde humana e meio ambiente A presença do garimpo tem um efeito devastador para a floresta e para a população amazônida. Foto: Reprodução | “Amazônia, a nova Minamata?”Bodanzky, gravando entre os Mundurukus em 2016, ouve o relato de um médico de que haviam quase 200 pedidos de cadeiras de roda para crianças com problemas neurológicos e resolve começar a filmar as pesquisas que se seguem.Após levantar a questão do que está ocorrendo no território Munduruku, no Pará, Bodanzky vai ao Japão para resgatar a história de Minamata, cidade cujos habitantes sofreram graves sequelas de contaminação do mercúrio despejados por uma indústria no mar da região ao longo de vários anos.Infelizmente, as cenas que chocaram o mundo e revelaram o efeito deste metal pesado no sistema nervoso central de seres humanos estão se repetindo no Brasil.Cena do filme “Amazônia, a nova Minamata?”. Foto: ReproduçãoEntre os sinais e sintomas da doença de Minamata estão a ataxia, hipoestesia nas mãos e pés, fraqueza muscular geral, perda de visão periférica, danos à audição e fala. Em casos extremos, insanidade, paralisia, coma, e morte, ocorrem em semanas a partir do início dos sintomas. Uma forma congênita da doença afeta fetos no útero, causando microcefalia, dano cerebral extensivo, e sintomas similares à paralisia cerebral (fonte: Wikipedia). Leia também: 1.Estudo revela benefícios das terras indígenas para a saúde pública 2.Proteger terras indígenas é chave para alcançar metas climáticas Em 2021, ao descobrirem a situação na Amazônia nos dias atuais, sobreviventes de Minamata enviaram uma mensagem contando a história de sua luta para acabar com a contaminação e recuperar a baía de Minamata. Esta mensagem virou um curta, que foi dublado em Munduruku e apresentado às comunidades indígenas para informar a população sobre as consequências do garimpo em suas terras.Mulheres Munduruku da Aldeia Sawre Apompu pescam em rio contaminado por mercúrio. Foto: Julia HLideranças Munduruku, como Alessandra Korap, que haviam convidado médicos e pesquisadores para investigar os problemas de saúde da sua comunidade, começam a se mobilizar para conter a atividade garimpeira em seu território, enfrentando ameaças de todas as formas, incluindo a tomada da cidade de Jacareacanga por garimpeiros.O documentário equilibra um conteúdo científico muito complexo com o drama humano dos indígenas que se veem ameaçados por uma doença que compromete a saúde dos adultos de forma silenciosa, mas tem consequências desastrosas nas novas gerações.Cena do documentário Amazônia, A Nova Minamata?, dirigido por Jorge Bodanzky. Foto: Divulgação | O2 PlayAmazônia, A Nova Minamata? conduz sua narrativa de forma delicada ao acompanhar as investigações do neurologista paraense Erick Jennings e cientistas da FIOCRUZ, em busca da razão de haver tantas crianças com problemas neurológicos na região, para então ouvir o brado de Alessandra Korap e do povo Munduruku em defesa do futuro de seus filhos.Para Bodanzky, sem ser apelativo, o filme é uma denúncia de como a atividade garimpeira, principal responsável pelo desmatamento e degradação dos territórios indígenas e de áreas protegidas nesta década, está deixando um rastro de contaminação por mercúrio, o que vai afetar drasticamente a saúde das populações amazônicas por dezenas de anos.Alessandra Korap, Lideranças Munduruku, em cena do documentário Amazônia, A Nova Minamata?, dirigido por Jorge Bodanzky. Foto: Divulgação | O2 Play“As pessoas sabem que o peixe está envenenado, mas é difícil enxergar o que está por trás disso e quais são as consequências. Resultados só serão visíveis nos próximos 20, 30 anos, pois os sintomas demoram muito para aparecer e esse filme é uma forma de alerta”, destaca Bodanzky.Alessandra KorapAlessandra Korap é reconhecida internacionalmente por seu trabalho em defesa de seu território. Em 2020 recebeu o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos, nos Estados Unidos. Em 2023 ganhou o Goldman Prize (considerado o Nobel do Meio Ambiente) por sua luta contra mineradoras. Atualmente é presidente da Associação Pariri, que representa as 13 aldeias do Médio Tapajós na região de Itaituba (PA). Leia também: 1.Alessandra Korap, líder Munduruku, ganha “Nobel Verde” 2.Beka Munduruku guia podcast de jornalismo investigativo sobre Amazônia The post Documentário mostra efeitos do mercúrio para povos indígenas appeared first on CicloVivo.