No período pós-guerra, a supremacia dos Estados Unidos se baseou especialmente no desenvolvimento industrial. Quando o setor se consolidou, a economia do país começou a migrar para serviços e tecnologia — até a criação das chamadas “sete magníficas”.O termo foi criado em 2023 pelo analista Michael Hartnett, do Bank of America, para evidenciar o peso no S&P 500 e a influência como termômetro do mercado financeiro global das sete maiores big techs norte-americanas, formadas por Google, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla.Mas como foi possível que as sete magníficas, em tão pouco tempo, superassem em valor de mercado e o PIB (Produto Interno Bruto) de muitos países?O gerente de vendas da divisão Enterprise da Nvidia no Brasil, Marcel Saraiva, explica à CNN que, historicamente, algumas regiões dos EUA unem fatores favoráveis ao desenvolvimento dessas empresas.“Existe o fator técnico, porque forma muita gente boa do mundo inteiro, e o fator do capital, porque tem uma grande quantidade de investidores e venture capital que tem essa cultura de empreender e inovar. E isso começou já no final dos anos 1960.”Investimento em educaçãoToda tecnologia e revolução digital as quais o mundo está imerso tem uma raíz conhecida: a educação. Para inovar, é preciso ser a vanguarda do conhecimento. Neste ponto, os Estados Unidos dominam.“Uma vez que nos Estados Unidos as pessoas têm carreiras em ciências e engenharias muito maiores que no Brasil, a gente tem menos talentos que vão querer empreender em empresas de tecnologia”, explica Lucas Abreu, fundador do podcast de empreendedorismo Sunday Drops e investidor de venture capital.Abreu argumentou que o diferencial entre os dois países reflete um “terreno menos fértil” de oportunidades no Brasil. Leia Mais Lula e CEO do TikTok discutem regulamentação e investimentos no Brasil Entidade das big techs: PL sobre concorrência gera distorções e insegurança Brasil opta por via intermediária sobre big techs, diz especialista José Ronaldo de Castro Souza Júnior, economista-chefe da Leme Consultores, também aponta que uma mão de obra qualificada e o desenvolvimento de tecnologias disruptivas nas universidades norte-americanas são indispensáveis.Apesar do conhecimento ser essencial, ele não é suficiente para sustentar exclusivamente um crescimento extraordinário de empresas de tecnologia.Para inovar, os especialistas explicam que é preciso arriscar tempo, oportunidades e dinheiro.A força do venture capitalO capital é um dos pilares fundamentais para o surgimento das big techs, destacam os especialistas ouvidos pela CNN. Com um mercado desenvolvido, juros menores e apetite por risco, os investidores ficam mais interessados em se aventurar para tentar ganhar mais.E é pelo venture capital (capital de risco, em português) que são unidas ideias inovadoras e o dinheiro do mercado financeiro.O objetivo é atrair investidores dispostos a comprar uma ideia que pode ou não dar certo. É correr um alto risco de perda, mas também a chance de um lucro milionário ou até mesmo bilionário.Essa estratégia não é tão recente: desde 1946 os Estados Unidos vêm constituindo uma forte cultura de venture capital.Diego Bonaldo, professor da FIA Business School, destaca que este tipo de investimento entre os norte-americanos ainda está muito à frente daqueles que avançaram na União Europeia.“A Europa vem avançando no mercado de venture capital, mas está muito distante dos Estados Unidos numa perspectiva de montante”, argumenta.A grande questão que fica é: por que toda essa evolução só acontece nos Estados Unidos?A União Europeia se destaca como um dos blocos com grande potencial, mas o resultado não reflete isso. Especialistas ouvidos pela CNN destacam, porém, que a UE tem ficado para trás em diversos sentidos.O investimento em pesquisa e desenvolvimento do bloco europeu, tanto público quanto privado, é menor que nos EUA.Além disso, os especialistas apontam que os ambientes acadêmico e corporativo norte-americanos valorizam fortemente a competição e o empreendedorismo, o que não acontece necessariamente do outro lado do Atlântico.Para Thiago Viana, diretor de inovação do iFood, a Europa foi para um caminho com uma regulação muito dura e forte.“Essa conduta faz sentido no final do dia, no que diz respeito à segurança do usuário, mas limita o quanto as pessoas conseguem consumir de tecnologia quando olham para esses dados.”China e o triunfo da inteligência artificialFora Estados Unidos e Europa, há outro nome nessa lista: a China. O país tem mostrado uma grande capacidade de inovação, com investimentos eficientes em avanços tecnológicos.Os celulares chineses estão ganhando cada vez mais o mundo, com marcas como a Xiaomi; enquanto a Tesla foi destronada da liderança de carros elétricos pelas fabricantes da segunda maior economia do mundo.Em 2024, a gigante chinesa de veículos elétricos BYD registrou receitas de 777 bilhões de yuans (US$ 107 bilhões), ultrapassando a marca de Elon Musk em vendas anuais.Isso sem contar o avanço da inteligência artificial chinesa. A startup chinesa DeepSeek têm se destacado ao redor do mundo com processadores únicos e aumentando a concorrência com rivais norte-americanas como a OpenAI.“A questão de inovações disruptivas têm se concentrado em determinados países como a China, que tem disputado muito mais com os Estados Unidos do que com a própria Europa”, aponta José Ronaldo, da Leme Consultores.Impasse da regulamentaçãoEnquanto o avanço da inteligência artificial segue impressionando o consumidor, em paralelo se desenvolve o debate sobre a regulamentação das big techs e a gratuidade dos serviços digitais oferecidos por essas empresas.“Quando os produtos são de graça, o produto sou eu, porque hoje em dia cada minuto do nosso dia está sendo vendido no mercado”, provoca Lucas Abreu, do Sunday Drops.Essa lógica comercial e de monetização traz resultados impressionantes. Nos últimos 10 anos, o índice industrial dos EUA Dow Jones subiu 178%, ganho percentual próximo do Ibovespa, mas consideravelmente menor que o de Alphabet, Meta e Apple, que cresceram entre 600% e 800% no período.A Amazon se destaca ainda mais à frente, com salto de 835% na década. Ainda assim, nada chega perto do desempenho da Nvidia, que disparou 30.730%.O que surpreende também é como o valor dessas empresas bate – por muito – a economia de países como um todo. Um levantamento da Elos Ayta mostra que o valor de mercado atual das Sete Magníficas — US$ 18,25 trilhões em 10 de julho de 2025 — equivale a mais de oito vezes o PIB (Produto Interno Bruto) nominal do Brasil, estimado em cerca de US$ 2,2 trilhões em 2025.“Isso evidencia a magnitude financeira dessas gigantes de tecnologia, que, juntas, valem múltiplos de uma das maiores economias emergentes do mundo. Em outras palavras, o mercado atribui a esse seleto grupo um valor que ultrapassa, com ampla margem, a produção de bens e serviços de todo o território brasileiro em um ano”, comenta Einar Rivero, CEO da consultoria reponsável pelo levantamento.A Elos Ayta ainda destaca que, de 31 de dezembro de 2024 até 10 de julho de 2025, o valor de mercado agregado dessas sete gigantes saltou de US$ 16,19 trilhões para US$ 18,25 trilhões, um crescimento de US$ 2,06 trilhões.Para efeito de comparação, o aumento de valor das big techs é mais que o dobro do valor total de todas as empresas listadas na B3, que no mesmo período foi de US$ 623 bilhões para US$ 779 bilhões — uma alta de US$ 156 bilhões.Desse modo, as big techs se consolidam cada vez mais ao redor do mundo, apoiadas no ambiente norte-americano.“Essas empresas hoje são mais importantes do que outros países. As pessoas de lá têm maior poder de influência do que presidentes de diversos países”, completou Lucas Abreu.Colaboração de Fernando Nakagawa, Gustavo Zanfer, João Nakamura, Matheus Oliveira e Rodrigo Monteiro, da CNNIA, clima e demografia devem gerar 78 mi de novos empregos até 2030