Uma nova alternativa para lidar com as noites em claro vai chegar em breve ao Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou recentemente o medicamento lemborexante, vendido sob o nome comercial de Dayvigo pela farmacêutica japonesa Eisai. O remédio conta com um mecanismo de ação inédito para combater a insônia, que se acredita gerar menos quadros de dependência.Novo mecanismo de açãoO lemborexante atua no cérebro de forma diferente dos remédios que já estão no mercado. O principal diferencial é ação no sistema da vigília. Enquanto isso, os benzodiazepínicos e as drogas Z fazem o contrário. Eles promovem uma redução completa da atividade do sistema nervoso, “desligando o cérebro”.—A grosso modo, o lemborexante bloqueia o que nos mantém acordado, ao contrário de outras classes, que agem induzindo o sono. Em outras palavras, essa classe impede a ação do combustível que mantém o interruptor do cérebro na posição “acordado” — resume Lucio Huebra, neurologista e médico do sono do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. O novo remédio foi aprovado nos EUA em 2019A dose recomendada é de 5 mg, no máximo uma vez por noite, alguns minutos antes de ir para cama. A pessoa deve ter um intervalo de pelo menos 7 horas antes do horário em que planeja despertar. A dose pode ser aumentada para 10 mg “com base na resposta clínica e tolerabilidade do paciente”, segundo o aval da Anvisa. A aprovação é apenas para adultos.Uma nova opção é importante porque, desde que foram descobertos, na década de 60, os benzodiazepínicos se tornaram uma das categorias de fármacos mais vendidos, sendo utilizados também para tratamento de transtornos mentais como ansiedade e depressão, caso do clonazepam (rivotril) e do alprazolam.Porém, com o tempo de uso, descobriu-se que esses remédios causam dependência e, a longo prazo, elevam o risco de déficit cognitivo. Além disso, quando misturados com álcool ou ingeridos em excesso, os remédios podem provocar desfechos graves, como paradas respiratórias.A partir dos anos 80, quando esses efeitos negativos começaram a ser relatados, começou um movimento de “desprescrição” dos remédios. Foi nesse contexto que criaram as drogas Z, como o zolpidem, também conhecidas como não-benzodiazepínicos.— A dependência é um grande problema hoje para os pacientes com insônia com os medicamentos atuais. E eles não devem ser usados a longo prazo, pois podem levar a consequências principalmente relacionadas à memória e funções cerebrais. Também há risco de comportamentos anormais tipo sonambulismo — explica Luciana Palombini, pneumologista e pesquisadora do Instituto do Sono/AFIP.Os especialistas celebram que, no caso do lemborexante, os estudos clínicos até agora indicaram um perfil mais favorável, com menor risco de dependência e efeitos colaterais, diz Alexandre Pinto de Azevedo, psiquiatra do Programa de Transtornos do Sono do Hospital das Clínicas da USP e membro da Associação Brasileira do Sono (ABS):— O lemborexante pode preencher uma lacuna terapêutica no mercado brasileiro. Ele oferece uma alternativa sem necessidade de desmame ou risco evidente de insônia rebote na retirada da medicação.Mas o médico pondera que, entre as alternativas já disponíveis, existe uma droga Z que também não apresenta o mesmo risco de dependência que o zolpidem e deve ser priorizada: a ezopiclona. O remédio foi de fato considerado o segundo com o melhor perfil pela revisão de pesquisadores de Oxford.— Tanto que diferentes diretrizes internacionais apontam a eszopiclona e o lemborexante como as principais medicações de escolha para o tratamento da insônia, pelo perfil similar de segurança e indicação similar de tratamento da insônia crônica de início de noite e/ou manutenção — afirma.Tratamento da insôniaA ABS estima que duas a cada três pessoas no país têm alguma dificuldade relacionada à hora de dormir. Dados do Episono, pesquisa realizada na capital paulista pelo Instituto de Sono, revelam uma prevalência de 15% de diagnóstico formal de insônia crônica, quando as queixas ocorrem ao menos três vezes na semana e perduram por pelo menos três meses.Especialistas ouvidos pelo Globo reforçam que o tratamento inicial não envolve remédios, mas sim mudanças de hábitos, como prática de atividades físicas, redução de estímulos, como telas e cafeína, ao fim do dia, evitar álcool e tabagismo e ajustes no ambiente do quarto, rotinas conhecidas como higiene do sono.— Temos também a Terapia Cognitivo-Comportamental para Insônia (TCC-I), considerada padrão-ouro pelas diretrizes internacionais. Ela combina técnicas que atuam nos três pilares da insônia: pensamentos disfuncionais, comportamentos inadequados e desregulação fisiológica — explica Azevedo.Ainda assim, é alto o número de brasileiros que recorrem aos remédios. De acordo com um estudo publicado na Revista de Saúde Pública, com base em dados da última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do IBGE, 8,5% da população, o equivalente a cerca de 18 milhões de pessoas, usam medicamentos.Dados da Anvisa, compilados a pedido do Globo, mostram que quase 16 milhões de caixas de zolpidem foram comercializadas no ano passado, uma alta significativa em relação a 10 anos atrás, quando eram cerca de 5 milhões de caixas ao ano.— O maior desafio no manejo da doença hoje é as pessoas entenderem a importância do sono e que muitas vezes não dá para fazer tudo que se deseja. Um cenário frequente é a pessoa chegar tarde em casa, ficar envolvida em telas, celular, questões do dia até tarde e querer dormir imediatamente, quando o cérebro não está pronto — diz Luciana.Azevedo explica que o tratamento medicamentoso geralmente é indicado para pacientes cujo tempo de sono total é inferior a 6 horas, que apresentam prejuízos na funcionalidade cotidiana e que não respondem à terapia convencional:— Quanto à forma de utilização, o princípio é claro: a menor dose eficaz, pelo menor tempo necessário, sempre com monitoramento médico. O ideal é que sejam usados de modo pontual ou em períodos curtos, evitando o uso crônico. The post Lemborexante: como funciona o novo remédio para insônia aprovado pela Anvisa appeared first on InfoMoney.