Os seres humanos já chegaram até a Lua, mas um lugar terrestre em específico ainda foi pouco explorado pela nossa espécie: o fundo do mar. Considerado um dos locais mais misteriosos do nosso planeta, o que se esconde nas profundezas é objeto de dúvida de vários cientistas, que buscam entender como é a vida marinha profunda e quais espécies estão por lá.Estima-se que muitos animais desconhecidos por pesquisadores da área marítima estejam escondidos no fundo do oceano, como lulas e peixes gigantes.Atualmente, os principais representantes da fauna abissal são os peixes abissais (Melanocetus johnsonii), peixes-bolha (Psychrolutes marcidus), tubarões-cobra (Chlamydoselachus anguineus) e os isópodes gigantes (Bathynomus giganteus). Mais recentemente, espécimes de peixes-caracol foram encontrados no fundo do mar.Segundo o oceanógrafo Angel Perez, da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina, a biodiversidade desse ambiente precisa ser conhecida e compreendida.“Acredita-se que ainda haja um número inestimável de espécies por serem descobertas, em sua grande maioria de pequeno porte. Porém, não se pode afastar a hipótese de algum gigante desconhecido ainda nesses ambientes”, revela o membro da Associação Brasileira de Oceanografia (AOceano).Como os animais vivem por láAlgumas estratégias únicas são essenciais para sobreviver ao breu, frio e extrema pressão. A bioluminescência – produção de luz própria – é uma das principais características, ajudando os animais a se defender, caçar ou se comunicar. “Essa adaptação é majoritária no mar profundo”, diz Perez.Corpos gelatinosos, com ausência de ossos rígidos e metabolismo lento são atributos frequentes vistos em espécies da fauna abissal. Isso ajuda a resistir à pressão extrema e a pouca disponibilidade de alimento.“Abaixo dos 200 metros, a gente não tem nenhuma luminosidade, é um breu absoluto. Não existe nenhum tipo de organismo produtor, que faça fotossíntese — a matéria orgânica que serve como alimentação depende exclusivamente do que cai da superfície. No fundo do mar, há muitos animais e microrganismos que são heterótrofos, fazendo decomposição e fermentação ”, ensina a professora de biologia Ana Carolina Arcanjo Silva, do Colégio Marista de Brasília.Desafios da exploraçãoExplorar o fundo do mar não é nada fácil. A cada 10 metros de profundidade, a pressão aumenta em aproximadamente uma atmosfera (ATM). Ou seja, a cada 10 metros de profundidade, a pressão é o dobro da superfície. Isso significa que o peso da água sobre os organismos nas profundezas é gigantesco, podendo comprimir os órgãos e levar mergulhadores à morte.O clima é outro fator que atrapalha a investigação. As temperaturas locais variam de 0 ºC a 5 ºC, podendo aumentar de acordo com a elevação da profundidade. Em algumas áreas há escassez de oxigênio, as chamadas zonas mortas.Tecnologias usadas para achar esse animaisCom tantas dificuldades, o uso de tecnologia de ponta é essencial em missões exploratórias da fauna abissal. Navios de pesquisa utilizam ecossondas multifeixe, um sistema de ondas sonoras que utiliza múltiplos feixes de luz para mapear em 3D a topografia submarina.A partir dos navios, cientistas operam veículos operados remotamente (ROVs, na tradução em inglês), equipados com câmeras, braços robóticos e sensores para registrar imagens e coletar amostras. Também há veículos autônomos menores, que carregam câmeras para realizar fotos e vídeos do local explorado.A exploração no fundo do mar é feita através de veículos operados remotamente (ROVs)Técnicas de DNA ambiental podem ser usadas. Elas permitem identificar espécies através do material genético presente na água, revelando o tipo de biodiversidade existente em um ambiente profundo.Por que é importante encontrar os seres abissaisDe acordo com Perez, os animais são como componentes de uma fábrica. Ou seja, para funcionar, cada um tem que fazer sua parte, gerando um “produto” final. “Os ecossistemas profundos produzem serviços para a sociedade. Por exemplo, sequestram carbono e reciclam os nutrientes, ‘fertilizando’ a superfície oceânica e sustentando a cadeia alimentar”, exemplifica.O descobrimento de novas espécies ajuda a elucidar o processo evolutivo de animais das profundezas e das regiões mais superficiais do mar. Além disso, a identificação também pode ter impactos benéficos aos seres humanos.“Podemos descobrir substâncias que sejam de interesse para a medicina ou para solucionar problemas do meio ambiente. Se a gente encontra decompositores no fundo do mar, eles podem ter alguma enzima que auxilia a metabolizar plástico, óleo ou outros produtos, por exemplo”, explica Ana Carolina.Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!