INSS pagou R$ 15 milhões a entidade sem provar autorização de aposentados

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Documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) enviados à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) mostram que o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) pagou cerca de R$ 15 milhões a uma das entidades investigadas pela “farra do INSS” mesmo sem comprovação de autorização por parte dos aposentados.A entidade que recebeu o valor milionário é a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), uma das entidades que mais arrecadaram em descontos associativos no período analisados nas investigações da Polícia Federal (PF) no âmbito da operação Sem Desconto.Segundo dados da investigação da PF, foram arrecadados cerca de R$ 484 milhões, a título de mensalidades associativas, entre janeiro de 2019 e março de 2024.A entidade também tem ligação com Cícero Marcelino, um dos supostos operadores do esquema. Ele é assessor de Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer.Cícero Marcelino, apontado pela PF como um dos operadores da “farra do INSS”A informação consta em nota técnica da CGU acerca do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) firmado entre a entidade e o INSS para possibilitar os descontos, o qual, diz o órgão de controle, passou por “uma série de controvérsias e entraves administrativos que comprometeram sua execução”.A controladoria aponta que, de início, o número de associados com descontos ativos vinculados à Conafer cresceu de forma “exponencial”, mesmo sem uma justificativa aparente, levando à instauração de procedimento administrativo para apuração da situação, inclusive com suspensão de repasses por indícios de descontos não autorizados.A entidade, então, alegou passar por dificuldades operacionais para apresentar a documentação exigida, especialmente em função da pandemia de covid-19. A CGU ressalta, no entanto, que embora houvesse a alegada dificuldade técnica, a entidade ainda assim conseguiu cadastrar uma média de 600 autorizações diárias de desconto de mensalidade associativa no referido período.Segundo a análise, a Conafer pediu três prorrogações de prazo para envio das fichas autorizativas dos associados – todas elas atendidas -,“o que demonstra uma condução pautada pela tentativa de manter o ACT vigente mesmo diante de reiterados descumprimentos por parte da entidade”.Com relação a valores, a entidade pediu, em fevereiro de 2021, que o INSS refizesse uma análise dos valores bloqueados da competência de março de 2020, afirmando que houve retenção indevida dos repasses referentes a adesões realizadas naquele período, as quais não deveriam estar abrangidas pela suspensão.Com base em auditoria contábil, a entidade apontou um valor total de R$ 9,4 milhões retidos de forma equivocada entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021. A solicitação foi formalizada em processo específico, resultando no repasse de recursos à entidade.Meses depois, em abril de 2021, com os repasses anteriormente reclamados já devidamente repassados, a entidade fez outra solicitação, dessa vez fazendo menção a um despacho que liberou o repasse mensal em sua integralidade a partir de março de 2021.A análise do pedido resultou no repasse do restante dos cerca de R$ 15 milhões para a Conafer, referentes aos valores retidos entre agosto de 2020 e março de 2021.A CGU ressalta, no entanto, que apesar dos repasses, a Conafer não chegou a comprovar a existência de autorizações dos associados para a efetivação de descontos, o que foi estabelecido como uma das condições impostas para uma eventual retomada dos descontos quando houve a sua suspensão.Finalmente, em fevereiro de 2022, foi iniciado o processo de renovação do ACT entre a Conafer e o INSS. Nesse âmbito, a Procuradoria Federal Especializada Junto ao INSS (PFE), embora não tenha se oposto à celebração do acordo, apontou fragilidades quanto à dificuldade da Conafer em gerir a documentação necessária, e a falta de clareza com relação à qualidade de entidade sindical e relação com associados.Parte das recomendações foram aprovadas pelo Procurador-Geral do INSS à época, mas concluiu que a administração do órgão prosseguisse com a assinatura do ACT, desde que justificasse as orientações indicadas.Segundo a CGU, o ACT foi assinado em junho de 2022 e, posteriormente, em maio de 2023, foi publicado o Primeiro Termo Aditivo ao ACT, eliminando a exigência de revalidação trienal da autorização de desconto de mensalidade associativa .“A análise evidencia falhas procedimentais por parte do INSS, assim como divergência interna sobre a condução do caso […] A condução do processo foi marcada por decisões contraditórias e dificuldades técnicas na comprovação da legalidade dos descontos realizados. Ainda assim, o ACT foi renovado em junho de 2022 com vigência até 2027, o que demonstra a superação formal do impasse, embora permaneçam dúvidas quanto à eficácia dos controles e à adequação da conduta da Conafer durante todo o período”, afirma a CGU.DefesaEm resposta à coluna, o INSS afirmou que os apontamentos feitos pela CGU resultaram na deflagração da Operação Sem Desconto, que conta com a participação ativa do instituto.Segundo o INSS, como medida imediata, todos os Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) que envolviam descontos de mensalidades associativas diretamente em benefícios previdenciários e assistenciais foram suspensos e, além disso, o instituto tem atuado de forma “integrada” com a CGU, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e demais órgãos de controle para assegurar a responsabilização dos envolvidos.“O INSS também está trabalhando para ressarcir os segurados lesados e garantir a recuperação dos valores desviados aos cofres públicos. Até o momento, já foram restituídos R$ 1,53 bilhão a 2,46 milhões de aposentados e pensionistas em todo o país”, disse.“O Instituto reitera seu compromisso com a proteção dos direitos dos segurados, a integridade da gestão pública e a adoção de medidas firmes para impedir novas ocorrências. O INSS seguirá colaborando ativamente com as investigações, assegurando que os beneficiários da Previdência Social sejam plenamente protegidos”, concluiu o INSS.